A Viagem.

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-Aonde você tá? - Ela perguntou ríspida, já logo percebi que tinha algo errado.

-To no William. Aconteceu alguma coisa?

-Teu pai Heitor... Ele tá aqui pra te ver, disse que é sério.

Pronto... Agora a merda tá feita. O que ele quer comigo afinal?

-E o que ele quer comigo?

O telefone ficou mudo por um tempo, eu só conseguia ouvir a fina respiração dela. Não que ela parecesse nervosa, não... É que assim como eu, a minha mãe acha que meu pai não é a melhor pessoa para se ver. Pelo menos não depois de tudo o que ele fez no passado.

Dona Eliza assim suspirou e, por fim, respondeu a pergunta:

-Ele disse que é melhor você vir porque ele quer te falar pessoalmente.

-Tudo bem então... Já que eu to ai.

Assim que me despedi da minha mãe coloquei o celular de volta no bolso eu comecei a pensar comigo o que poderia ser, porque sem dúvida alguma tinha um caroço nesse angu já que nem minha mãe quis me falar sobre...

- O que aconteceu?

- Vem em casa comigo? Meu pai quer me falar uma coisa pessoalmente comigo então...- Revirei os olhos

- Okay, só vou vestir a camiseta.

O sol tinha acabado de se por, e eu podia enxergar o rosado das nuvens ainda. Estava meio frio naquele fim de tarde, não um frio incomodo, pelo contrário era até gostosinho. Eu e Will fomos brincando de fusca azul pra aquecer o corpo, só que qualquer carro azul era fusca pra gente. Não tinha muita distância da minha casa pra casa dele então não verificamos os pontos da brincadeira e apesar de ir a pé chegamos bem rapidamente.

Logo na entrada de casa pude ver a camionete suja de barro parada ao pé da calçada. Meu sorriso sumiu e o silêncio tinha se tornado mais interessante de uma hora pra outra. O asiático deve ter percebido isso e repousou a mão no meu ombro brevemente, logo depois voltou-as para o bolso da bermuda. Entrei em casa já impaciente. Como eu disse, não é como se eu quisesse algum dia ver meu pai, só que era inevitável algumas vezes.

O negócio parecia de outro planeta, quando eu entrei em casa estavam minha mãe, meu pai, minha tia Margarete, todos sentados na sala com caras sorridentes. Até William se divertia com alguma coisa que eu suspeitava ser uma joaninha lá fora. O único que não estava feliz era eu, o único também que não estava entendendo nada.

Quando eu entrei na sala todo mundo parou de falar e me olhou como se eu estivesse atrapalhando o assunto. Ficamos sem falar nada por alguns segundos então o meu pai nos chamou a atenção limpando a sua garganta.

- Heitor...- Minha mãe começou a falar, parecia que já previa que eu não queria ouvir nada que saísse dali então ela fez questão de se adiantar - É aniversário da sua vó Bete nesse final de semana...

Eu não cheguei a mencionar ela aqui, mas minha avó por parte de pai se chama Bete, é a pessoa mas doce e calma do mundo e eu não consigo imaginar em como ela pode parir um negócio feito o meu pai. A explicação é obvia, meu pai tinha puxado 80% meu avô e só 1% minha vó mesmo, porque os outros 19% é do diabo. Meu avô morreu sem que eu tivesse sequer pensado em nascer mas me disseram que ele era muito temperamental e explosivo.

Coisa que provavelmente eu puxei, mas só provavelmente.

Nem preciso dizer que a minha presença era fundamental para o aniversário da vovó porque eu era o neto mais velho. Meu pai, minha tia e minha mãe fizeram uma encenação digna de novela das nove da EPTV. Faltou chorar e se jogar no chão, mas a chantagem emocional vinha de forma tão pontiaguda que num só movimento me perfurara e atravessara o meu corpinho gostoso.

O Garoto Do Boné VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora