Capitulo 1 - Oito Minutos

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Você não tem noção de quanto oito minutos podem mudar a vida de uma pessoa. Por causa de oito minutos eu sou a filha mais nova. Por oito minutos, eu não me chamo Hely. E é por causa de oito minutos que eu sou demitida do meu estágio no terceiro dia.


– Mas que merda! – minha irmã diz quando eu ligo pra ela. Essa é a Hely que sempre sabe o que dizer, sem saber o que dizer.

– Ahr – eu resmungo – eu estou indo pra casa, ver algo na Netflix e chorar – Dramatizo – te vejo no jantar?

– Claro. Me liga se precisar de algo? – ela pergunta.

– Ligo – respondo. Mas eu obviamente não vou ligar. Hely está no estágio dela. Porque no mundo perfeito de Hely atrasar 28 minutos não significa nada, no mundo dela é aceitável atrasar. Perder o ônibus e essas coisas do dia a dia.

Meu estágio de verão era tudo o que eu sonhei. Eu só não imaginei que ia trabalhar com a própria Miranda de "O Diabo veste Prada". Margarete me mandou sumir da vista dela no primeiro dia, porque segundo ela o café que eu tinha trazido estava frio. No segundo dia, eu tentei fazer todas as coisas que ela pediu. Mas eu era muito "desorganizada" tudo estava errado. E hoje eu atrasei.

Oito minutos.

Daí ela me mandou embora.

Espero o metrô na estação tentando não sentir raiva de mim mesma. Talvez ela não quisesse uma estagiária. Não foi ela que me escolheu de todo jeito. Ou talvez ela quisesse alguém mais Hely e menos Enna.

Não foi assim a vida toda?




"Soube que você perdeu o estagio, Enna. Sinto muito".

Para que você, cara pessoa que lê esse desfortúnio chamado "A patética vida de Enna Wilson" possa perceber como eu realmente sou; queria explicar que o dia todo recebi duas mensagens apenas. Uma do meu pai pedindo pra comprar legumes para fazermos no jantar. Outra de Henry. Ele costumava ser meu amigo até namorar Hely. Mas daí ele ficou sem tempo pra amizades. Porque é assim que é com todo mundo que namora.

Dessa forma o único ser vivo amigável que realmente parece gostar de mim, é Bowie, nosso cachorro. Desconfio ainda que ele só gosta de mim porque sou a única que lembra de trocar sua água e o levar pra passear pelo bairro. Fora isso, tenho minhas dúvidas. Será que um cachorro sempre estraga os tênis das pessoas que ele ama?

Eu não respondo as mensagens de ninguém. Também não compro legumes. Eu prendo a corrente em Bowie, e saio pra passear com ele, em vez disso. Dá pra pensar um mundo de coisas enquanto seu cachorro fica parando na rua pra fazer xixi nos postes e árvores. Bowie parece uma fonte de xixi interminável, porque ele para a cada lixeira, cada canteiro e cada esquina pra deixar um pouco do seu precioso liquido amarelo, marcador de territórios.

– Que cachorro fofo! – alguém diz. Eu não sei de onde vem a voz, mas eu sorrio. Bowie é um labrador filhote. Ele está adorável agora, mas sei que quando crescer vai ser terrível. Ele já destrói todos os sapatos e coisas que estão na altura do chão agora. E ele tem só 4 meses. Eu tenho medo que quando ele estiver maior destrua o resto do nosso apartamento todo.

– Qual o nome dele? – uma garota pergunta se pondo a minha frente, e abaixando pra mexer com o cachorro. Ele não parece muito feliz com ela.

– Bowie – respondo.

– Como o cantor? David Bowie? – ela parece muito animada com sua conclusão incrível. Todo mundo acha isso. Mas não é.

– Não, como em "Rosto de Boe" – respondo. Ela parece confusa, e eu fico impaciente. Acho que não deveria estar falando com alguém que não vê Doctor Who – É de uma seria britânica.

Hely & EnnaOnde histórias criam vida. Descubra agora