Capítulo 26 - Eric

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"O que você está fazendo Enna?" me pergunto. Eu coloco o colar de pássaro que recebi junto a uma das cartas de Eric. Tem alguma coisa nessa história toda que parece estranhamente muito errada. Talvez seja porque eu estou fugindo de Alice. E me sinto uma pessoa idiota que nem mesmo sabe o que quer, ou se de fato quer algo.

"Você vai tomar um café com um amigo" digo a mim mesma. Eu não estou indo pra um encontro romântico. Nós não vamos transar, nem nos beijar, nem nada assim. Eu não sei porque embora eu queira fazer isso, minha consciência esteja tão pesada.

Não troco de roupa, nem de sapato, só prendo de novo o cabelo que ficou bagunçado depois de eu ter me largado um pouco na cama. Olho pra Bowie antes de sair. Ele parece pensativo. Os olhos abertos, a escova de cabelo do meu pai diante dele, e a cabeça dele descansando sobre as patinhas. Eu queria me preocupar assim com uma escova de cabelo invés de estar preocupada com pessoas e sentimentos confusos.

Eu ligo pra Alice pra dizer que estive fora a tarde, e por isso não respondi as mensagens antes. Digo que agora vou sair pra um café com um amigo, e que podemos conversar com calma mais tarde.

- Está tudo bem? – ela pergunta - Você está esquisita desde ontem.

- Acho que estou meio aérea – respondo – mas está tudo bem.

- Você não gostou da gente né? – ela pergunta. Essa pergunta é dolorida, porque eu gostei muito de quando saímos. De quando nos beijamos. Dela. Eu só me sinto confusa. É como se estivesse de ressaca. Não estou arrependida do que fiz. Mas arrependida por não saber lidar com os sentimentos que ficaram.

Eu fico em silêncio. E acho que é a resposta errada.

- Okay, a gente se fala Enna – ela diz num tom ressentido e impaciente. Consigo ouvir em sua voz, que Alice está decepcionada comigo.

- Me desc... – começo, mas ela desliga antes de eu terminar.

Eu estou sentada no café perto de casa, há duas quadras do metrô. Está escuro, ficando frio, e Eric está atrasado. Eu mando mensagens pra ele, mas elas não chegam, e aí eu começo a ficar angustiada, sem saber se ele me deu um bolo, se ele só teve algum problema e se atrasou, se eu devo ir embora, se eu ligo ou se eu fico aqui, se peço alguma coisa pra começar e espero ele por mais alguns minutos.

- Enna? – Escuto atrás de mim. Quando me viro Eric está sorrindo, ele puxa a cadeira do lado da minha e senta – Oi.

- Oi – sorrio – você está atrasado.

- Eu fiquei sem internet pra te dizer. Eu perdi um trem, precisei pegar o outro.

- Ah – faço. Nessas horas eu penso o quanto seria idiota se eu tivesse ido embora por coisas comuns do dia a dia. Eu quis morrer quando me demitiram por um atraso de oito minutos, mas eu estou aqui reclamando do atraso dele, de menos de vinte.

- Você já pediu alguma coisa? – ele pergunta.

- Não. Estava esperando – digo.

- Ah – ele faz como se sentisse uma pontada de culpa – Eu estou com fome, podemos comer alguma coisa?

Eu faço um gesto positivo com a cabeça. Acabo pedindo exatamente o que eu pedia sempre que vinha aqui com tio Peter. Capuccino e Panini. Enquanto Eric escolhe eu repasso o que tem acontecido na minha vida em flashs.

Então tudo isso começou comigo, perdendo o estágio e querendo por a vida nos eixos. Eu sai com meu melhor amigo, e descobri que ele ia terminar com minha irmã. Ai eu fiz planos num caderno, mas ele caíram por chão quando eu recebi um pacote de cartas, que me levaram de volta pro Eric que eu beijei no laboratório da faculdade há um ano atrás. No fim das contas eu sai com a Alice, que se infiltrou nessa história maluca sem eu entender bem como, nós ficamos, eu fugi de novo e estou agora sentada num café com o mesmo cara de quem eu fugi um ano atrás.

Hely & EnnaOnde histórias criam vida. Descubra agora