– Alô? – falo – Quem está falando?
– Sou eu – diz. Eu não reconheço a voz, mas é um menino – Só queria saber se você recebeu o que eu mandei.
– Quem é? – insisto.
– Enna, você recebeu as cartas? – ele pergunta impaciente.
– Sim – respondo – Por favor, quem é?
– Bom, você ainda não terminou de ler – ele diz – se não você saberia. Quando você terminar de ler, me manda uma mensagem.
– Foi você quem escreveu isso tudo pra mim? – Pergunto desesperada. A sensação de ouvir a pessoa que me escreveu, tão perto, tão acessível, ainda sem saber dizer quem ela é, me faz sentir como se tentasse segurar a água entre os dedos e a visse escorrer. E isso me deixa aflita.
– Eu preciso desligar, Enna – ele diz. E encerra a ligação. Apenas isto e nada mais.
O número fica salvo no celular e eu adiciono aos contatos como "Pessoa das Cartas".
Eu guardo as cartas todas num pote e levo elas até o quarto de Hely. Agora ela está mudando os moveis de lugar, mas eu não ligo. Sento no tapete peludo, e fico esperando ela falar comigo. Bowie chega logo depois, se deitando com a cabeça em minha perna, e balançando o rabo freneticamente.
– O que foi? – ela pergunta rindo.
– Acho que tem uma garota dando em cima de mim – digo. Isso faz Hely se sentar e me olhar com calma – e Aqui nesse pote – continuo – tem oito cartas de um admirador secreto, que acabou de me ligar e eu NÃO FAÇO IDEIA DE QUEM É!
– Enna! – ela grita – Calma!
– Você beijou um garoto no ano novo de 2016 para 2017? – pergunto.
– O Henry – ela concorda.
– Outro, Hely.
– Ah. É. Um que era da escola, mas não lembro o nome dele e era só pra fazer ciúme no Henry. O que não funcionou, porque ele nem viu. Mas o que isso tem a ver?
– Hely, eu comprei bolo de chocolate pra você e pro papai – digo. Eu estou me sentindo nervosa. Agitada de um jeito estranho – você fica com o pedaço que tem cerejas, pra ele não ter alergia tá?
– Enna, tudo bem? – Hely pergunta.
Sim, eu sei que não estou falando coisa com coisa. Mas cara, não é minha culpa. Estou em nervos.
– Não – confesso.
Bowie se levanta, e se esfrega em mim. Eu estou confusa, nervosa e queria um abraço. Queria que o tio Peter estivesse em casa. Não sei porque vim falar com Hely, considerando que ela brigou comigo hoje de manhã. Talvez porque ela sempre parece saber o que fazer e porque ela é mais adulta do que eu pra lidar com as coisas.
– Bom, vamos por partes? – ela propõe. Ela abaixa o volume da música que toca na caixinha de som, volta ao carpete e se senta diante de mim – Quem é a garota que está dando em cima de você?
– Alice – digo – Ela sempre pega o metro com a gente de manhã, mas eu nunca reparei nisso. Ela falou comigo depois que me viu outro dia na rua com Bowie, e ela me chamou pra sair amanhã.
– Sair, sair; ou sair, sair? – Hely pergunta mudando a entonação de voz na última palavra. Sei que ela quer perguntar se vamos sair para um encontro.
– Não sei – confesso – eu fiquei de mandar uma mensagem, mas estou com medo.
– Ah meu Deus, Enna Wilson! – Hely diz impaciente. Era a mesma cara que ela fazia quando eu procurava ela desesperada de madrugada e pedia pra ela matar uma barata que misteriosamente tinha aparecido em meu quarto – Anda, me dá seu telefone.
Eu olho Hely e dou meu celular pra ela, com certa preocupação. Ela puxa meu dedo, e coloca ele no leitor, desbloqueia a tela e depois de alguns minutos manda uma mensagem de "Oie" pra Alice. Eu nunca mando "Oie". Existe diferença em como cumprimentar uma pessoa? O que quer dizer "Oie"? Que vamos sair?
Hely larga meu celular no chão ao nosso lado. Eu fico olhando, esperando uma resposta de Alice, mas ela puxa meu rosto pra frente e eu olho pra ela.
– O que são essas cartas? – me pergunta.
– Bom, hoje eu sai pra comprar doces. E ai eu comprei bolo pra você e pro papai, mas o seu é com cereja e o dele sem – digo. Eu não estou sendo muito coerente no que falo, e Hely me olha franzindo o cenho. Deve ser difícil me entender.
– Enna, o que isso tem a ver?
– Bom, eu estava fazendo alguns planos. E ai tocaram a campainha.
– Tocaram a campainha? – Ela pergunta incrédula.
– É! – falo – eu também fiquei assim! Daí eu criei coragem e abri, porque olhei pelo olho mágico e não tinha ninguém. Quando abri a porta tinha isso.
– Cara, que tipo de maluco te escreveria cartas? – ela perguntou.
Eu fico em silêncio e a encaro. Ela acabou de fazer de novo.
Eu me sinto idiota por achar que podíamos ficar bem, Hely e eu. É incrível o quanto sou ingênua.
– Eu quis dizer – ela tenta corrigir – porque ninguém mais escreve cartas hoje.
– Eu entendi perfeitamente o que você quis dizer, Hely – falo, pegando as minhas coisas pra sair do quarto dela. Me levanto e Bowie dá um choramingo e então levanta também – Obrigada pela ajuda.
– Enna! – ela chama.
Mas ai então eu já estou no meu quarto.
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Hely & Enna
Teen FictionQuanta diferença oito minutos podem fazer na sua vida? Para Enna Wilson, 8 minutos é a diferença no tempo e espaço entre uma vida perfeita e uma vida cheia de azar. Depois de perder seu tão desejado estágio de verão, Enna decide arquitetar um plano...