Capítulo 18

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Quando cheguei à sala secreta, no final da tarde, não perdi tempo e comecei logo a fazer as análises aos dois rapazes.

Comecei pelo rapaz que tinha apenas analisado de longe ontem. Estava muito apático e mal reagiu aos exames que lhe fui fazendo, o que me facilitou a vida. O mesmo não aconteceu com o outro rapaz, o dos olhos verdes. Esse mostrou-se muito inseguro e um pouco receoso de todos os instrumentos que aproximava dele. É perfeitamente compreensível, afinal de contas nunca os viu na vida. Aquilo que desconhecemos, às vezes, pode tornar-se verdadeiramente assustador. No entanto, isso fez com que se mexesse mais, e, por muito que lhe fizesse preguntas para desviar a atenção dele para outra coisa qualquer, ainda não lhe tinha conseguido ouvir a voz.

– Foste um menino muito forte – elogio o pequeno rapaz doente dos olhos verdes ao retirar a seringa do seu pequeno braço. – Agora já me podes dizer o teu nome?

– Gabriel, – informa-me, olhando curioso para o dispositivo que tenho na mão.

‒ Que lindo nome, – digo acariciando a sua cabeça calva.

Foi uma boa opção terem rapado a cabeça destes pequenos rapazes, é bastante mais higiénico. Mas agora que penso nisso, todos aqui parecem ter os cabelos bastante curtos ou mesmo ausentes.

Confirma-se, exatamente a mesma bactéria, concluo ao olhar para o pequeno ecrã do dispositivo que tenho entre as mãos. Sorrio ligeiramente, satisfeita por ter conseguido fazer o diagnóstico destes dois pacientes tão fragilizados.

– Então doutora, o que é que eles têm? – Pergunta-me preocupada e, claramente, impaciente a mãe do Gabriel.

– Tratem-me por Aurora. Aqui não sou doutora, nem médica, nem enfermeira, sou apenas uma rapariga que vos quer ajudar. – Não quero que nenhuma destas pessoas me trate por títulos, quero que me tratem pelo meu nome. Os títulos só nos afastam, e aquilo que eu menos quero é perder a oportunidade de, verdadeiramente, conhecer estas pessoas que tiveram experiências de vida tão diferentes das minhas. – E quanto aos rapazes, não se preocupem. O que os está a pôr doente é uma bactéria que se desenvolveu no planeta Terra uns anos antes de esta nave descolar.

"Este microrganismo tem duas grandes peculiaridades. Primeiro, só escolhe as pessoas com o sistema imunitário mais frágil para se poder desenvolver. E, em segundo, não causa sintomas no corpo de todos os indivíduos que invade, nunca ninguém soube muito bem porquê. Por isso, muito provavelmente, esta bactéria foi trazida para a nave por um dos primeiros habitantes desta sala secreta, sem nunca ter sabido disso. Aliás, é possível que alguns de vocês também a tenham no vosso organismo. – Vejo-os a olharem-se uns para os outros de forma alarmada com esta minha notícia. É melhor ser mais direta e concisa, estas pessoas não querem saber detalhes sobre a bactéria, querem apenas saber uma coisa: é ou não tratável. – Não se preocupem, existe medicação e até está em quantidade mais que suficiente no vosso armário. Afinal o Salvador até sabe roubar medicamentos que dão jeito, – digo em tom de brincadeira.

Olho para o Salvador e vejo-o sentado com uma pequena rapariga ao colo. Quase que não reconheço o jovem de dezanove anos que tenho à frente. Sorri animado e tem uma postura descontraída, como se este fosse o sítio a que verdadeiramente pertence. Por momentos, sinto vontade de abraçar esta nova versão dele, para que nunca mais escape.

– O medicamento vai atuar muito rapidamente e dentro de 24 a 48 horas todos os sintomas já devem ter desaparecido – informo, ao dirigir-me para o único armário da sala. – Também vai ser necessário realizar exames a todos os presentes nesta sala, temos de nos assegurar que eliminamos para sempre esta bactéria, para evitar futuros contágios. – Oiço sussurros alarmados a invadir a sala. – Não vai doer, o Gabriel e o Afonso podem confirmá-lo.

AuroraOnde histórias criam vida. Descubra agora