Capítulo 32

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− Mãe... Pai... o que é que estão aqui a fazer? – pergunto ofegante, ainda a sentir as minhas faces a escaldar.

O Salvador tira o braço da minha cintura e pousa-o simplesmente atrás de mim, num movimento rápido, mas discreto. Na posição em que o Salvador se encontra, comigo sentada bem perto dele, suponho que ele não consiga ver os meus pais. De certo, só quando me ouviu é que percebeu que tinham sido eles a entrar no quarto.

− Viemos ver a nossa filha, − explica o meu pai. – Será que podemos? – acrescenta, sarcasticamente.

− Claro! – respondo. Viro-me, apressadamente, e sento-me na borda da cama. O Salvador antecipando este meu movimento, coloca o seu braço de novo junto a si, dando-me o espaço que preciso para me afastar dele.

Agora também ele consegue ver os meus pais.

O que estarão os meus pais a pensar de nós?

O dia só parece piorar cada vez mais!

− Acabaram de nos contar o que se passou no refeitório − diz a minha mãe, aparentemente menos perturbada que o meu pai pela imagem que acabaram de presenciar. Então o que seria se nos tivessem visto uns segundos antes? Ou será que viram? Eu acho que os meus reflexos foram rápidos o suficiente. Afastei-me assim que ouvi o barulho da porta a abrir, mas não posso jurar que tenha sido rápida ao ponto de não nos verem a meros milímetros de distância um do outro. E será que repararam no braço dele envolta da minha cintura? – Estávamos com os teus avós, a conversa estava tão animada, que só agora íamos jantar.

O refeitório serve comida durante duas horas seguidas a cada refeição. Isso permite que este nunca fique sobrelotado, nem que o serviço se torne demasiado lento.

− É verdade, rapaz, o que nos contaram? – pergunta o meu pai com um tom tão ameaçador, que me faz sobressaltar.

− Depende, senhor, do que lhe contaram − responde o Salvador com a voz fria que lhe é tão habitual. Apesar de não o ver, quase aposto que a postura do seu corpo é rígida. Gostava de lhe dizer que com os meus pais pode descontrair, relaxar, mas depois de ouvir o meu pai, já não tenho tanta certeza disso.

− Agrediste o Leandro e o Matias? – interroga o meu pai, claramente, chateado por ser obrigado a ter de se esclarecer.

− Sim. Mas eles também me agrediram − retruca o Salvador.

− A minha filha pôs-se à tua frente para te proteger?

− Sim. Mas isso foi antes da minha luta com o Leandro, não durante. A sua filha nunca esteve em perigo, senhor.

− Porque começou a luta?

− Porque... − Hesita.

Estava a correr bem. Ele portou-se lindamente com todas as outras perguntas.

− Foi para me proteger, pai. O Leandro ameaçou-me.

Talvez ele não ache o motivo suficientemente bom e por isso temeu responder. Ou talvez não queira mais chatices com o Leandro, nunca se sabe o que o meu pai vai fazer com essa informação. Ou, ainda, porque não quer responder a uma possível pergunta que advenha da sua resposta: "O porquê de me querer proteger?".

No entanto, eu quero que os meus pais saibam que o Salvador não é o mau da fita. Se ele não quer limpar a imagem dele, eu quero. Os meus pais ainda me proibiam de me dar com ele! Não, não acredito que o fizessem. Por muito má influência que o Salvador pudesse ser, eles seriam incapazes de me proibir de tal coisa. Eles próprios passaram por isso quando os pais da minha mãe a proibiram de se relacionar com o meu pai.

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