59| Guerra e Fogo

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A lua tingira de um tom acinzentado quando eles saíram do edifício. Liz arfou depois de descer os dezesseis andares, a testa molhada de suor, as costas grudando na camiseta. A jovem olhou para as mãos, o brilho da lua foi o suficiente para vê-las sujas de sangue seco e terra.

Rafael sustentava o garoto adormecido nos braços. Ocean respirava calmamente, os olhos se moviam por baixo das pálpebras, reparou ela, percebendo também que a única semelhança entre ele é Rafael era o tom de pele bronzeado e a beleza. Quando pensara no irmão de Rafael imaginara um clone dele mais novo, pelo visto se enganara.

Ela deslizou os dentes sobre o lábio inferior. Não havia dito nada, absolutamente nada desde o momento em que desceram.

— Espera. — disse ela, sua voz soando diferente do normal, um diferente estranho.

Rafael encarou-a, uma das sobrancelhas levantando.

Liz entreabriu os lábios, como se pensando no que dizer.

— Acabou. — Ele a cortou antes que pudesse falar algo. — Lúcifer está enfraquecido e não vai voltar tão cedo agora que sabe do que você é capaz.

Ela não disse nada, abaixou o olhar para o chão de terra e folhas.

— Como fez aquilo, Liz? Todo aquele fogo.

— Eu não sei. Só segui o plano. Você me disse para aguardar seu sinal e eu aguardei, deixei a parte divina em mim agir. Lutei contra aqueles seres infernais e parti para cima de Vitor mesmo sabendo que não daria certo, mas o objetivo que você tinha em mente não era dar certo, não é? Era criar uma distração, ganhar tempo. Fazer Satan achar que já havia vencido, que não havia o que temer e não ter pressa para me derrotar, para, dessa maneira, dar a cartada final na primeira oportunidade. E foi o que eu fiz, eu me rendi, não para ele, mas pra quem podia me dar poder para derrotá-lo. Mas o fogo, não sei dizer como tanto dele surgiu.

Liz respirou fundo depois do que dissera. Voltou o olhar para Rafael, os traços de seu rosto levemente contornados pela luz do luar. Sentiu um calor no estômago. Nunca ninguém olhara com tanto fascínio como Rafael a fitava agora.

— Preciso ver minha mãe, Vince e Liam. Preciso saber se estão bem, se...

— Eles estão bem. Consigo sentir que eles estão bem e se você se concentrar também pode.

— Mas... — iniciou ela, a voz falhando. Passou o olhar de Rafael para Ocean. — O que te trouxe até aqui? Porquê seu irmão também está aqui?

Ele passou a língua sobre os lábios secos.

— Agora não, Liz. Foi demais para uma noite. Conversamos ao nascer do sol.

Eu vi seus olhos ficarem negros como os de um demônio, ela quis dizer, mas engoliu as palavras e balançou a cabeça, o vento jogando seus cabelos emaranhados para trás.

— Tudo bem. Vamos.

✹❂✹

Os acontecimentos repercutiram na mente de Liz por todo o caminho. Sua mãe, Vince e Liam dominavam a maior parte dos pensamentos. Vez ou outra as palavras de Vitor surgiam na cabeça.

Não se lembra de como ele morreu? Você estava lá. Veja como é triste não reconhecer a própria família. Não se trata de mim. Você carrega a chave da ascensão e da destruição do mundo nas veias, Lizandra.

Seus olhos seguiam a estrada escura pela janela fechada do carro em que estava agora.

Rafael estava no banco do passageiro conversando algo que ela não prestava atenção com o motorista que aceitara lhes dar carona. E ela encontrava-se nos bancos traseiros, o menino loiro deitado com a cabeça apoiada em suas coxas. Seus dedos deslizaram sobre as mexas loiras do cabelo do garoto. Eram sedosas como as de Rafael.

As Doze Luas - Filhos do AlvorecerOnde histórias criam vida. Descubra agora