14: VOCÊ É UMA EXCEÇÃO, NÃO É?

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REN


Assisti o rosto de minha mãe uma última vez.

No caixão.

Seus cabelos ruivos compridos foram colocados sob o pescoço, como uma cascata, onde tinha um forte hematoma roxo. Sua morte foi um baque para o pessoal do Exército, que compareceu em massa no cemitério Woodlawn.

Junto com Uriel, Gabriel, Dhália e eu.

Convidei meu tio Kevin, mas ele recusou-se a ir. Deu a desculpa de que estava em turnê. Mas eu sabia a verdade.

Kevin estava com vergonha de aparecer e ressentimento por ter brigado com minha mãe em vida e não ter pedido desculpas antes de morrer. Como eu. Ela morreu indo atrás de Beckham, porque apanhei e fui para casa sem me importar.

E a culpa era totalmente minha.

Os "se" me atormentavam e deixavam minha cabeça leve.

Se eu não tivesse roubado a garota de Beckham, minha vida estaria normal.

Se eu não tivesse me envolvido com Beck, seria um advogado exemplar e não com um pé no crime e hipócrita.

Se a tivesse tratado melhor, ontem, ela ainda estaria aqui e eu não teria uma viagem marcada para o Inferno.

— Sinto muito. — Uriel colocou as mãos em meus ombros.

Por mais que eu quisesse receber um carinho, uma amostra de amor, não estava no clima naquele momento. Enquanto o caixão era enterrado ao lado de meus avós mortos e de Christopher, me desvencilhei de seu toque como se queimasse.

Trocadilho idiota.

A culpa é toda sua. — Sibilei.

Ele sabia que não era, mas mesmo assim, não retrucou. Talvez Uriel tivesse ciência de como agir com os humanos quando estavam passando por dificuldades.

Não sei e nem me interessava saber.

Dei as costas para minha mãe e saí dali.

­­­­­***

Sentei na rua e comecei a brincar com Bolinha e Bil. Já que dentro de casa o cheiro de seu perfume faria minha garganta apertar.

Ah, lembrar de Analu já era um martírio. Puxei o capuz, do moletom preto, tapando minhas feições e deixei as lágrimas correrem livremente enquanto acariciava os pelos dos dois pastores alemães. Meus filhos.

Senti a presença de alguém ao meu lado e funguei, limpando as lágrimas.

— Não quero conversar, Uriel.

— Desculpe, sou o irmão errado.

Levantei a cabeça e vi as belas feições de Gabriel. Dei de ombros, visivelmente sem paciência.

— Serve para toda a família de todo jeito.

Gabriel riu, mas não se levantou. Começou a coçar as orelhas de Bolinha, enquanto ela tentava mordê-lo de brincadeira e latia toda vez que ele tirava a mão e a escondia.

Soltei um sorriso fraco.

A calma outra vez.

— É você que está fazendo isso? — Indaguei.

— O quê?

— Você sabe do que estou falando. — Estreitei os olhos.

— Para distrair um pouco sua mente, Ren. Sim, eu consigo acalmar os ânimos dos que estão ao meu redor e antes que reclame. Não. Não estou fazendo para que se sinta melhor, é algo que não controlo. Agora, quer saber um pouco sobre os nossos dons dos elementos?

Mordi os lábios vendo a verdadeira intenção de Gabriel. Desanuviar minha mente para centralizá-la em minha mãe.

Mas quem disse que era o que eu queria? Parar de sofrer não estava em meus planos.

— Não.

— Tudo bem. — Espalmou as mãos na calça jeans que eu tinha emprestado para ir ao enterro. — Começando comigo. Tenho o poder de invocar o ar...

— Qual a parte do não você não entendeu? — Interrompi.

Qual parte de cuide de suas palavras você ainda não percebeu, Ren? Ele é um Arcanjo. Seu tio.

Minha nossa, admitir isso em pensamento estava mais difícil do que imaginei.

— A parte em que você precisa saber. Cale a boca e me escute, Ren. Então, continuando, Uriel tem o dom do fogo. Geralmente nossos filhos não herdam tais regalias, mas é óbvio que você é uma exceção, não é? — Murmurou.

Suspirei.

— Beleza, gosto quando me respondem. Continue assim. — Gabriel passou a mão no focinho molhado de Bil, sorrindo. — Miguel tem o dom da Terra e Rafael da água. É basicamente isso. — Terminou, se levantando.

Enruguei a testa enquanto Gabriel começou a se distanciar.

Gritei por seu nome e ele virou, me encarando com curiosidade.

— Está faltando alguém aí. E Lúcifer?

— Agora está interessado? — Ele arqueou uma sobrancelha e fiz o mesmo, lançando-lhe um olhar duro. — Okay, como queira. Lúcifer tem o dom do medo, da injúria, das desgraças, do... caos. E Ren, você acha que vai conseguir combater escuridão com fogo? Pense nisso.

Assisti-o passar pelo portão.

Quem sabe?

Quem sabe?

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