19: MANSÃO PRETA E GÓTICA

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REN

Lembro-me da última vez que Kevin, o irmão de Christopher e meu tio, foi me visitar.

Eu tinha cinco anos na época.

Ele me deu de presente um carrinho de plástico vermelho com uma pazinha amarela.

Eu gostei daquilo e brinquei até meus doze anos.

***

— Você não vai voltar? — Foi o que perguntei.

Os olhos azuis me olharam com o que classifico agora ser de pena. Mas como criança, não entendi nada. Kevin sabia que não voltaria, mas como mentir para uma criança sem traumatizá-la? Ah, mas com isso ele não precisava se preocupar.

Sempre tive um pé na traumatização.

Minha mãe fazia isso por mim.

Kevin olhou, parecendo raiva, além de meu corpo minúsculo e desenvolvido, quando se ajoelhou. Para minha mãe, provavelmente.

Os dois não se suportavam desde a morte de Christopher.

A recém conquistada cicatriz acima do olha denotava isso.

Mas novamente... eu sabia que eles não se davam. Mas em minha mente, isso não afetava em nada Kevin vir me visitar de vez em quando.

— Eu... não sei quando, mas vou tentar. Você é meu sobrinho, pequeno Ren.

Mas eu queria dizer que não era filho de Christopher, que era filho de um Arcanjo e que acreditava que ele desceria a Terra para me chamar de filho. Mas não disse.

Engoli as palavras, como mamãe ensinara-me.

Pois tantas noites sonhei que meu pai estava ao lado da minha cama.

Kevin se foi.

Passou pelo portão e nunca mais o vi.

***

Era com o mesmo olhar de Kevin que eu encarava a casa agora, prestes a fazer o mesmo percurso que ele. Mas diferente do passado, minha mãe não estava na porta, observando tudo com seu olhar crítico.

Ela não me chamaria de volta.

Fechei os olhos e respirei fundo.

— Onde Amitiel está? — Dhália perguntou, olhando as unhas.

Virei-me de costas para a casa enquanto assistia meus dois cachorros brincando. Eu, infelizmente, não podia arrastá-los para todos os lados, muito menos, abandoná-los.

E tinha mais isso. Enfrentar tudo e todos sem nem meus cachorros como companhia.

Quando a empregada chegasse, ela notaria um bilhete dizendo que fui embora, mas que era para ela continuar cuidando de Bil e Bolinha e da mansão preta e gótica que sempre assustou minhas raras namoradas.

Uriel levantou as sobrancelhas.

— Com certeza no Céu, Dhália.

Segurei-me para não rir e cheguei perto de Gabriel, que estava olhando as flores de Analu.

Quando fiquei a centímetros dele, já pude notar a áurea de calma que se instalou em meu corpo cansado.

Ele estava afastado dos dois, então eles não ouviriam nossa conversa.

— Quem é Amitiel? — Sussurrei.

Gabriel cruzou os braços e soltou a respiração visivelmente alegre por eu estar falando com ele. Meu tio tinha colocado minha calça preta e blusa da mesma cor, assim como Uriel.

Meu guarda-roupa era basicamente preto, branco e cinza.

Dhália tinha pegado algumas peças de minha mãe. Aquela visão dilacerou meu peito já estraçalhado, mas contive o ímpeto de gritar para ela que tirasse as roupas de minha mãe e respeitasse sua memória.

Mas não o fiz porque ela... estava no Céu. Suas roupas aqui não serviriam para mais nada.

— Amitiel é o comandante das tropas de Uriel. Assim como Daniel, das minhas. Ah, e antes que pergunte, precisamos dele. Daniel cuidará das nossas duas tropas. O idiota do Amitiel vai nos acompanhar para os Ceifadores.

Estreitei levemente os olhos.

Estava claro que ninguém ali tinha se dado ao trabalho de contar qual era nossa destino. Não o Inferno, como concordamos — eu e Uriel — mas aos Ceifadores primeiro.

— Por que vamos encontrar os filhos de outros Arcanjos?

Estava claro que Gabriel não sabia lidar com meu conhecimento celestial. Mas agora podia agradecer a Analu pelo esforço.

Ele titubeou e mordeu os lábios, compenetrado.

— Porque também precisamos dos nossos filhos. Entrar no Inferno vai ser duro.

Naquele instante dei-me conta da enrascada em que estava me metendo.

Precisaríamos de tropas de anjos e Ceifadores para resgatar o Príncipe dos Anjos do Inferno?

Ah, estávamos completamente ferrados.  

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