33. GEOVANA

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Passei três meses no hospital e, a todo o momento, tudo que tinha na cabeça era minha volta para casa. Hospitais me lembravam de Bernardo. O reencontro com a minha mãe não poderia ter sido mais emocionante, como uma daquelas cenas de filmes dramáticos em que os personagens apenas choram incapazes de articular qualquer palavra, dominados pela emoção de se reencontrar e, acredito, há coisas que palavras não podem traduzir. Notei os sinais de abatimento expressos no rosto da minha mãe. Dona Regina Parks, de quem puxei boa parte da minha excelente genética juvenil, parecia pelo menos dez anos mais velha, olheiras profundas marcavam seus olhos, a pele estava sem viço e parecia ter perdido muito peso.

Para minha surpresa ela não fez perguntas. Durante toda minha recuperação, seu foco, e o de Albert, fora me manter à vontade e me fazer focar no meu reestabelecimento, algo pelo qual agradeci uma vez que contar a eles naquele momento sobre Bernardo e tudo que vivera em Albuquerque teria sido muito difícil. Todos os dias, enquanto enfermeiras saíam e entravam no quarto, esperava o momento que veria Alice ou que, de repente, Bernardo entrasse de jaleco pela porta com o mesmo sorriso encantador que fez meu coração sair do controle a primeira vez que o vi. Era inútil. Lembrei a mim mesma que não havia sentido me sentir daquela forma por alguém que nunca foi meu.

Desejei, ardentemente, que aquelas memórias tivessem desaparecido no momento que as antigas voltaram.

Rever os lugares que faziam minha história foi uma experiência muito estranha. Eu os reconhecia e lembrava-me dos momentos que passara em todos eles, mas, de alguma maneira, não me sentia mais ligada a nenhum. Mesmo minha casa, meu quarto, os objetos que refletiam quem eu era não pareciam mais encaixar com a pessoa que me tornara. De repente, nada na minha antiga vida parecia fazer qualquer sentido para mim. Estava alegre por estar outra vez perto da minha família, mas parecia faltar alguma coisa, não me sentia completa e, por mais que tentasse aparentar o contrário, tampouco me sentia feliz. Portland era o lar de uma Geovana que deixara de existir quando perdeu a memória, a pessoa que me transformei em Portland não era mais sonhadora ou ingênua, as descobertas sobre Jamie e Victória, além de toda complicação com os sentimentos de Bernardo, destruíram toda a vivacidade da menina que saiu apressada numa tarde de verão para ajudar aquela que pensava ser sua melhor amiga.

Tal como fora para Albert e eu, custou a mamãe acreditar na crueldade de Victória. Contei a ela e ao meu irmão detalhes sobre os meses que passara sob a proteção de Bernardo, além dos motivos que o levaram a nunca me apresentar à polícia, algo pelo qual ficara grata após recuperar a memória e ponderar quão maléfica teria sido a pressão caso ele tivesse me entregado às autoridades desde o início. Mesmo decorridos meses após nossa separação, ainda era difícil falar sobre ele, sua lembrança ainda despertava em mim o vazio impreenchível de sua ausência, me perguntava se um dia seria capaz de vencer aquele sentimento.

Olhava a praça vazia e sentia o frescor da brisa suave esvoaçar meus cabelos, não havia nenhum som além do vento balançando os galhos das árvores e os passarinhos que, vez ou outra, decidiam lembrar-me que estavam ali com seu gorjear suave. Sempre adorei a natureza. Quando éramos crianças, lembrava que papai sempre nos levava àquela praça e passávamos horas deitados na grama observando o céu e formando desenhos nas nuvens enquanto eu tentava identificar o som de cada tipo de pássaro. Um sorriso triste surgiu no meu rosto e suspirei afastando as lágrimas. Toda aquela existência parecia tão distante de mim naquele momento, como se fosse uma vida que não me pertencia mais. A verdade é que, desde que voltara para casa, não sentia mais fazer parte de nada do que antes era meu. Como se a vida que construíra na casa de Bernardo tivesse subjugado a que eu havia esquecido, agora não conseguia mais me conectar a ela outra vez.

Um Novo Começo (2ª Edição)Onde histórias criam vida. Descubra agora