Capítulo 3

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(Sabrina na mídia)

Naquela manhã fria, acordei mais cedo que o normal.
Fui até a cafeteria mais longe e de melhor qualidade que eu já ouvirá falar. Tudo para não arriscar que as lembranças me ataquem logo cedo.

- Mais alguma coisa? - a voz monótona da atendente me tira de meus devaneios.

Balancei a cabeça em negação e lhe paguei.

No caminho para a editora, treinava o que iria dizer, como iria agir. Já dentro do elevador, a única coisa que eu conseguia fazer era balançar a perna e apertar a alça da bolsa.

Caminhei alguns passos até parar diante de sua mesa, quase minúscula.

- Espero que me desculpe, por ontem. - lhe estendi o cappuccino.

Sabrina me olhou sem entender, seus olhos amendoados tentavam decifrar cada ponto do meu rosto. Desviei o olhar.

- Se não se importa, é um pouco desconfortável ficar nessa posição. - falei abrindo um sorriso.

Ela juntou as sombrancelhas e olhou para minha mão.

- Desculpe. - ela falou pegando o café.

- Peço perdão pela forma que lhe tratei ontem. Geralmente eu não sou assim, mas com tanto trabalho, acabo perdendo o controle. - falei sem mentir, porque realmente estava me afundando em trabalho, para fugir de tudo.

- Não se preocupe, eu entendo. - ela sorriu.

Sem mais indagações, fui direto para minha sala.

Eu sabia que não poderia tratar as pessoas com tamanha estupidez, só que estava perdendo o controle de minhas ações.
Numa tentativa de distração, alcancei o celular, a tela estava desbloqueada.

"Talvez devesse me mandar um sinal de que está bem..."

Escrevi no campo de mensagem, mas logo apaguei. Não iria cair na tentação. Não iria ser fraco.

Digitei alguns números e logo ouvi uma respiração do outro lado da linha.

- Quem é?

- Sou eu Sabrina.

- Vou checar na minha bola de cristal quem é. - fala aparentemente irritada.

Gargalhei ao escutar aquilo.
A menina qual eu havia ofendido no dia anterior, estava neste momento usando ironia comigo.

- Sou eu, o Dylan.

Um silêncio tomou conta da ligação.

- Sabrina? - chamei.

- Senhor Dylan, não foi por querer. Desculpe! Não queria, quer dizer, eu não sabia que era você, digo senhor.

- Pode vir aqui? - cortei.

- Sim.

Duas batidas na porta, antes que a garota a abrisse. Ela entrou calada, cabisbaixa.

- Pode se sentar. - apontei para a cadeira.

A garota obedeceu, sem pronunciar uma única sílaba.

Fechei o laptop.

- O que houve? - indaguei. Ela estava nervosa.

- Desculpe senhor Dylan, eu não sabia quem era, imaginei ser engano, ou alguma telemarketing... - a impedi de prosseguir.

- Está tudo bem. Eu não vou brigar - não agora. Completei na minha mente.

- Então, do que precisa ? - sua feição mudou.

- Que você permita que eu lhe leve para almoçar. - dei um sorriso de canto.

O pedido parece ter atingido a moça no estômago. Ela me olhou sem entender. Talvez ela tivesse levado isso para outro lado. Mas meu pedido era apenas para tornar as coisas amigáveis.

- É uma forma de pedir desculpas por tudo. - dei de ombros. - Se não quiser, não haverá problema algum.

- Eu quero. - ela soltou.

Sorri para a moça, que parecia empolgada.

Caminhamos algumas quadras até a lanchonete que eu frequentava. Com uma vida corrida, eu sequer tenho tempo de preparar um ovo frito. Talvez, um dos motivos seja que sequer sei cozinhar. Mas, esse pequeno detalhe não é algo relevante.

- Eu gosto de vir aqui. Fazem um bife maravilhoso. - falei puxando a cadeira para a garota sentar.

- Nunca vim aqui. - ela olhou ao redor.

Peguei o cardápio e passei a ela. Procurei com o olhar algumas coisas, em poucos segundos já tinha visualizado o que iria pedir.

- Hum, os preços são um pouco altos, não ? - ela falou baixo.

- Eu lhe chamei, pode deixar que eu pago. - pisquei.

- Não sou esse tipo de garota, senhor Dylan. - falou séria.

- Do que está falando? - indaguei.

- Disso, quer dizer, não sou o tipo de garota que gosta de ser bancada. - ela gesticula.

- Não estou lhe bancando. Estou apenas cumprindo meu papel de cavalheiro. Eles ainda existem, sabia ? - falei e ela sorriu.

- Senhor Dylan . - Ergui minha mão para que ela parasse.

- Senhor Dylan? Céus! Me sinto mais velho cada vez que ouço você dizer isso. - coloquei a mão no peito de forma dramática.

Ela se encolheu, mas logo percebeu que estava brincando.

- Acho que existe algumas regras, que eu uma mera estagiária preciso obedecer.

- E uma dessas regras é não me chamar de senhor.

- Vou tentar. - prometeu.

- Continua dar a entender que sou um velho. - brinquei.

- Não pense isso, só não estou acostumada a isso. - deu de ombros , sorrindo.

Depois do almoço, caminhamos até a praça que estava cheia de pessoas. Me sentei em um banco, apenas fiquei em silêncio observando o mar de pessoas que iam e vinham, todas com pressa.

- Dylan? - escutei a voz de Sabrina me chamar.

Ao virar, percebi que ela me encarava curiosa , tentava decifrar meu olhar, o desviei no mesmo instante.

- Perdão. O que disse? - minha voz saiu calma.

- Queria poder ler seus rascunhos, Karen me disse que estavam incríveis. - engoli seco.

Naquele momento, naquele mesmo segundo, eu fiquei pálido, estático. Meu estômago deu um nó.

- Acho que ainda não está, hum, bom. - fiz uma careta.

- Tem certeza? Eu estava doida para ler!

- Está uma porcaria. - resmunguei.

Realmente estava.

- Por que diz isso?

- Um escritor precisa acreditar no que escreve. Como posso escrever algo, que sequer eu acredito? - ela tentou procurar palavras para protestar, mas não conseguiu.

Naquela noite, passei perto do meu caderno, ele parecia gritar para que escrevesse algo, jogasse tudo o que eu estava sentindo. Não me atrevi aquilo. Preferi guardá-lo na minha bolsa, longe de meus olhos.
Havia decidido que não me prestaria aquela situação. Não iria me humilhar mais por ninguém. Não iria.
Dormi no sofá, ainda sem coragem de ir para a cama, a mesma cama que cabia nós dois e nossos sonhos.

Meu Querido Amor - CompletoOnde histórias criam vida. Descubra agora