641 dias depois do início

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— Se os nossos filhos forem perturbados que nem o Coisa 1 e o Coisa 2, a gente vai ter que abandoná-los dentro de um cestinho na frente da igreja.

Eduardo gostava dos almoços em família na casa da namorada. Exceto quando os primos dela estavam presentes.

— Olha só! — Edu mostrou a mancha em sua calça. — Coisa 1 derrubou refrigerante em mim de propósito. Eu tenho certeza que foi de propósito.

Sofia riu e se ajeitou no sofá.

— Quem seria o Coisa 1? O Enzo ou o Heitor?

— E você acha que eu sei a diferença? É tudo a mesma coisa, uma dose dupla de desgraça.

Sofia, só pra não perder o costume, deu um soco no ombro de Edu.

— Você seria um pai horrível. É péssimo com crianças, meu Deus.

— Meu amor, eu vou ser um ótimo pai, juro. O problema é que os seus primos nem são crianças, são entidades do mal disfarçadas de crianças. Nossos filhos e filhas serão bem-educados e gentis e não vão derrubar refrigerante nas pessoas.

Ele gostava de pensar naquilo, de imaginar um futuro que envolvia ele, Sofia e uma casa cheia de crianças parecidas com ela, como em um comercial de tevê.

Quando Edu olhou para Sofia, ela já estava com aquela expressão reflexiva e meio triste que aparecia de vez em quando.

— "Conhecerás o futuro quando ele chegar. Antes disso, esquece-o." — ela pronunciou cuidadosamente cada palavra.

— Ah, que ótimo — reclamou Eduardo. — Já começou o episódio diário do "Momento de Sabedoria com a Sofia". Linda frase de efeito, por que você não coloca na traseira de um caminhão?

— Seria interessante ver uma citação de Ésquilo na traseira de um caminhão — ela respondeu. — Mas é sério, Edu. Você precisa parar de ter tantas expectativas pro nosso futuro. Ou, pelo menos, ser um pouco mais realista. Você fica o tempo todo repetindo esse lance de casamento e filhos... Isso não vai acontecer. Quer dizer, eu sei que você vai se casar e ter filhos e coisa e tal. Mas não comigo. Entende? Você tem que começar a pensar nisso, senão depois vai doer pra caramba.

Sofia devia ter uma espécie de necessidade de ficar constantemente jogando um monte de coisas desagradáveis na cara dele. E aquilo devia ser uma tradição de família, porque uma das pestes gêmeas passou correndo pela sala e "acidentalmente" arremessou refrigerante de uva bem no rosto de Eduardo.

Sobre o fimOnde histórias criam vida. Descubra agora