Sofia pôde sentir o cheiro do mar e ouvir o som das ondas antes que eles chegassem à praia. Depois que Eduardo estacionou o carro, ela saiu correndo na frente dele, descalça. Enfim sentiu a textura macia da areia sob seus pés, o cheiro de água salgada. À frente, o mar azul se estendia muito além do que a visão dela podia alcançar. Ela se aproximou da margem, encantada, até seus pés estarem totalmente cobertos pela água, afundando na areia. Admirou as ondas, viu um grupo de surfistas, ao longe.
Quando Edu finalmente conseguiu alcançá-la, pegou a mão de Sofia e ficou admirando toda aquela felicidade nos olhos dela.
— Eu não acredito que estamos aqui — ela murmurou. — Eu tô com muito medo de isso tudo ser um sonho.
— Acredite, é real, eu dirigi a noite inteira pra isso e estou morto de cansado, então trate de aproveitar.
— Eu já mencionei que você é o melhor namorado do mundo?
— Com certeza não o suficiente.
Ela o agarrou pela gola da camiseta e o beijou até ele ficar sem ar.
Um som de toque de celular interrompeu o momento.
Sofia segurou as mãos de Edu, para impedir que ele atendesse a ligação.
— Você ainda não desligou o seu celular? Desliga, por favor.
— A gente devia dar notícias pros seus pais, eles devem estar desesperados, Sofia.
Ela olhou para o mar e suspirou.
— A gente tem pouco tempo até eles chegarem aqui e encontrarem a gente. Não é muito difícil deduzir que eu viria pro Festival de Balonismo. E além disso, eu meio que usei o cartão da minha mãe pra comprar os ingressos do festival.
— Ora, ora, uma delinquente juvenil. Um péssimo exemplo para toda uma sociedade. E ainda diz que é crente.
Ela fez uma careta para Edu, segurando o riso, e avançou um pouco mais para dentro do mar. Quando uma onda molhou Sofia acima do joelho, Eduardo soube que era hora de intervir.
— Sofia, você já tá fez loucura o suficiente por hoje. Toma cuidado pra não molhar o seu cateter, sério mesmo.
— Eu não vou molhar esse negócio — ela disse, apontando para o tubo posicionado abaixo do pescoço. — Ele é novinho, e vai ter que durar, porque eu não quero ter que trocar de cateter de novo. Já fizemos amizade e tudo mais, eu já me apeguei a ele.
Eduardo sentia um incômodo imenso em pensar que aquele tubo dava acesso direto à corrente sanguínea dela. Ele nunca iria se acostumar com aquilo.
— Pois é, então melhor a gente voltar um pouco, sentar na areia, olhar as ondas de longe. E a gente também pode aproveitar o cenário romântico pra você me beijar daquele jeito de novo, eu gostei.
— Bem, eu não posso mergulhar no mar, mas você pode. Então vai nessa, vou ficar te admirando sem camisa.
Eduardo olhou para o mar revolto adiante dele.
— Você sabe, eu não sei nadar, então prefiro ficar olhando de longe, com você.
— Se você não for muito pro fundo, e eu sei que você não vai, não tem risco nenhum. É só um mergulho, Edu. Não precisa ter medo. Aproveita por mim, já que você pode.
Ele parou de olhar com ansiedade para toda a água que o cercava e encarou Sofia, aparentemente ofendido.
— Eu não estou com medo.
Ela levantou uma sobrancelha, em descrença.
— Tá, talvez eu esteja com um pouco de medo. Eu não lido muito bem com esse lance de água demais concentrada em um lugar só.
— Eu sei disso — ela disse, voltando o olhar para a linha horizonte onde céu e mar se encontravam. — É claro que você tem medo. Isso não é uma banheira, não é uma piscina. É o mar. É enorme, indomável, caótico. Não é algo que você possa controlar, e por isso você tem medo. A questão, Edu, é que às vezes tudo o que a gente precisa fazer é aceitar que a maior parte deste mundo não está sob o nosso controle. Não podemos abrir o mar, andar sob as águas, acalmar tempestades. Nós não somos Deus. Tudo o que podemos fazer é olhar pro mar, contemplar essa beleza imponente assustadora e, enquanto estivermos respirando, aproveitar o presente de poder mergulhar no mistério dessas águas.
Eduardo olhou para Sofia com desconfiança.
— Você decorou esse discurso com bastante antecedência, né?
Ela sorriu, orgulhosa.
— Fazer o quê, é um talento natural. E, se você não decidir aproveitar o momento, vou ficar aqui dizendo várias outras frases inspiradoras, até você tomar coragem.
Eduardo suspirou, desanimado. Sofia não perdeu tempo:
— "Quem não mergulha no mar de seus medos não encontra as pérolas da vida." Essa frase eu mesma adaptei para a situação, é metade de autoria do Spurgeon, metade de minha autoria. "Mergulhar nas águas profundas é a única forma de se livrar da âncora que te prende ao medo." Essa frase é de um poeta que eu...
— Pelo amor de Deus, Sofia, já deu, é melhor ir nadando até o Oceano Índico do que ouvir outra citação sua. Tá, eu vou aproveitar o mar, tudo o que você quiser, mas chega de frase motivadora.
Ela riu. Pela expressão em seu rosto, era fácil ver o quanto ela estava satisfeita.
— Ótima escolha, meu amor — ela o parabenizou, tocando no tecido de sua roupa.
Eduardo ficou sem reação enquanto Sofia tirava a camiseta dele — um ato, sem dúvida, inesperado, depois de todo aquele sermão reflexivo.
Com a camiseta do namorado na mão, Sofia beijou a bochecha de Edu antes de dizer:
— Vai fundo. O mar te espera.
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Sobre o fim
Teen FictionEduardo tem vários medos, mas nenhum se compara ao pânico de perder sua namorada, Sofia, que enfrenta uma doença em estágio terminal. Entre o medo e a coragem, a beleza e o caos, o fim e o início vão se entrelaçando ao longo da história de amor vivi...