William abriu os olhos preguiçosamente ao ouvir o despertador tocar ao seu lado. Apertou os cobertores contra seu corpo e ficou ali por uns minutos. Não queria levantar, não queria ir trabalhar, não queria aceitar o fato de que já era segunda-feira e ele teria que se matar de tanto trabalho, não queria ter que olhar na cara da mulher que ele não suporta, mas acha atraente, não queria ouvir Charlie lhe dando ordens, não queria ter que encarar os caras que acabaram com seu carro e quase o mataram... Resumindo, queria fugir de suas responsabilidades por pelo menos um dia.
Deu uma risada fraca ao lembrar que na época de ensino médio e faculdade, acordava cedo, junto com o pai, e quando ele dava essas crises de "não quero levantar", seu pai vinha puxar suas cobertas e começava a gritar em seu ouvido até ele se irritar e levantar. Era sempre assim. Até cinco anos atrás.
William encarou o teto e mordeu o lábio. Seu pai fazia falta. E ele ainda pegaria o desgraçado que o matou daquela forma brutal... E à sua frente, praticamente. William se sentia inútil, desde então. Tudo bem que ele sabia que era muito bom no que fazia, mas ele se sentia inútil quando falhava... Pelo simples fato de ter visto seu pai morrer e não ter feito nada. Ele já tinha 23 anos completos na época. Ele poderia, sim, ter feito alguma coisa. Mas não fora rápido o suficiente. O pai de William era tão bom quanto ele — talvez isso seja de família — e tão cobiçado quanto ele também. E esse fora o motivo de sua morte: ser bom. William às vezes sentia medo de morrer da mesma forma.Flashback.
— Ei, Char! — William disse sorrindo. — Cadê meu pai?
Charlie engoliu seco e não encarou o rapaz.
— William! — Emma disse tentando disfarçar a tensão em sua voz.
Havia algo errado. E ele sabia muito bem. Crescera no meio daquilo tudo e sabia muito bem quando algo estava errado.
— Cadê o meu pai? — Ele perguntou novamente, desta vez, pausadamente e tirando o sorriso dos lábios.
Novamente, silêncio.
— Se você prometer ficar calmo e...
— CADÊ. O. MEU. PAI? — Ele gritou, interrompendo Emma.
— Pegaram ele. — Charlie disse de uma vez só, fazendo o rapaz de apenas 23 anos, prestes a se formar em Direito e pronto para virar um ótimo policial ao lado do pai, arregalar os olhos.
— Como? — William perguntou.
— Estamos tentando localizar o cara. Nós vamos achá-lo, certo? — Emma disse tocando o ombro de William.
— Charlie, Charlie! — Um homem corria pelos grandes corredores do prédio.
— O quê? — Charlie se virou ainda tenso.
— Conseguimos o endereço. — o homem respirou fundo tentando recuperar o fôlego. — Eu já mandei todos se prepararem e vim correndo te avisar.
— Certo, vamos. — Charlie disse e William se preparou para andar com eles. — Você não.
— Mas...
— Não, William. É perigoso — Emma disse, segurando seu braço. — Fique aqui. Mandaremos notícias e...
— DROGA, NÃO! — William gritou e começou a andar atrás de Charlie. — Eu vou com vocês. É o meu pai, Charlie. MEU PAI!
— Você. Não. Vai. — Charlie disse pausadamente ao chegar ao estacionamento.
— Eu vou sim. — William rebateu. Sempre teimoso. Sempre.
— A gente já disse que não! — Emma disse, encarando-o séria.
— Ah, não? Então certo, quem vai me impedir de ir? Eu tenho um carro parado bem ali. — ele disse, nervoso, apontando para onde seu Impala estava estacionado.
— Entra nessa porra e se ajeita, William — Charlie disse entrando no carro com Emma e indo para o banco da frente ao seu lado. William deu um sorriso amarelo e entrou no carro, pegando uma arma e um colete que estavam debaixo do banco.
Seria sua primeira atuação ao lado de Charlie, Emma e sua equipe em uma coisa séria.
Demoraram menos de dez minutos para chegar ao local indicado e todos desceram do carro.
— Só atire se for necessário. — Charlie disse para William. — E não, você não vai invadir com a gente.
— Charlie, é o meu pai. — ele murmurou ignorando o bolo que se formava em sua garganta. Ele não podia perder seu pai. Seu pai era tudo o que tinha, oras! Ele... Simplesmente não podia perder o seu grande herói. Não podia perder aquele que lutou por ele desde sempre.
— Eu sei, mas... — Charlie tentou falar, mas logo ouviu alguém gritar seu nome. — Vai pelos fundos. — Charlie sussurrou antes de sair de perto do rapaz e ir em direção à porta da frente.
William respirou fundo e saiu sem dar explicação a ninguém. Ele sabia muito bem o que fazer. Aprendera com o pai e colocaria em prática — e muito bem — para salvá-lo. Ou pelo menos tentar.
William foi para os fundos da casa e, ao observar bem, logo notou algumas sombras pela janela. Abaixou-se e caminhou devagar em direção a ela, tentando ouvir alguma coisa.
Ouviu apenas um urro de dor de longe, o qual deduziu ser de seu pai. Sentiu seu coração se apertar fortemente e fechou os olhos para tentar relaxar e não deixar as lágrimas caírem. A última coisa que ele deveria ficar ali, naquela hora, era nervoso ou ansioso.
Respirou fundo novamente e caminhou lentamente para o outro lado, notando ali uma pequena porta que, provavelmente, daria para onde seu pai estava. Caminhou até a tal porta e forçou-a um bocado para tentar abri-la. Trancada. Não tinha mais o que fazer. Tentou olhar para o outro lado, onde daria a frente da casa, mas provavelmente ninguém o notaria ali. Talvez por isso Charlie o tenha mandado para aquele lado. William estava sem opção, a não ser observar tudo por aquela pequena janela ou arrombar a porta. Arrombar a porta faria um enorme barulho e o entregaria, pular pela pequena janela o faria levar um tiro certeiro e ele seria dado como um belo de um idiota. A única coisa que ele tinha a fazer era observar até Charlie dar as ordens para invadirem pela frente, para assim tomarem a atenção dos bandidos e ele entrar por ali.
Um barulho ecoou por todo o local. Barulho de tiros. Sim, havia começado.
William levantou a cabeça para a janela novamente e pôde ver um homem na frente de seu pai. Notou os olhos de seu pai se arregalarem ao vê-lo ali e fez um sinal de silêncio para o mais velho, que engoliu seco e fez de tudo para distrair o bandido à sua frente, para assim, talvez, proteger seu filho e fazê-lo conseguir entrar na casa sem ser baleado. William fez um sinal para o pai, tentando segurar o nervosismo e as lágrimas, e caminhou até a porta que encontrara. Deu dois tiros na fechadura e entrou correndo. Tudo ficou em câmera lenta. Ele correra até o quarto onde seu pai estava, mas não fora rápido o suficiente. No corredor onde estava, pôde ouvir o barulho de dois tiros.
William cerrou os dentes com força e, finalmente, chegou ao quarto, dando de cara com o corpo de seu pai tremendo levemente no chão. O garoto sentiu seu coração parar. Ignorou as lágrimas que caíam pelo seu rosto e correu até o corpo de seu pai. Não havia nem sinal de quem havia feito aquela maldade com ele. William estava se sentindo um lixo, um completo inútil.
— DROGA! — William gritou. — AJUDA AQUI, PORRA! — ele gritou novamente. Pôde ouvir os passos de longe. Ele tinha que tirar seu pai dali! Tinha que levá-lo para o hospital às pressas!
— William... — seu pai sussurrou e ele virou o rosto em sua direção.
— Não fala, pai. Calma, eles vão vir te pegar. Não fala. — William murmurou largando a arma de qualquer jeito no chão e puxando o corpo de seu pai para si, já que ele estava sentado ao seu lado. — PORRA! CHARLIE! — gritava desesperado.
— Não... Tem... Jeito... — seu pai sussurrou mais fraco que antes. Ele estava ferido demais. Fora torturado antes dos tiros.
— Para com isso, pai. Para. — ele disse tentando parar o sangue no abdômen do pai com uma mão.
O mais velho gemeu de dor e fechou os olhos. Respirava com dificuldade.
William então correu os olhos pelo corpo do pai, procurando mais algum ferimento.
— Pegue... — o mais velho tentou falar, mas fora interrompido por uma tosse, a qual William notou ser sangue puro. Seu pai estava morrendo.
— Pai, droga, não tenta falar. — disse desesperado e se preparou para levantar, mas seu pai o segurou.
— Eu... Vou... Morrer — ele disse num fio de voz, fazendo as lágrimas de William rolarem com mais força. — Só... Pegue-o...
— Pai... Pai! — William gritou ao ver o homem fechar os olhos. — Pai? — chamou novamente e notou que sua respiração estava parando aos poucos. — Não. PAI! DROGA, PAI, RESPONDE! PAI! — gritou desesperado enquanto sacudia levemente o corpo do homem.
Sentiu alguém tocar seu ombro.
— Ouvi seus gritos. — a voz de Emma soava calma e triste ao mesmo tempo. William não tirou os olhos do corpo do pai em seus braços e deixou as lágrimas caírem mais. — Não deu para virmos... Ainda tinham uns caras aqui... Tivemos que pegá-los antes que fugissem.
— Fodam-se aqueles caras — William disse num fio de voz. — Meu pai tá morto, Emma. — ele encarou a mulher ao seu lado, finalmente. Emma desviou seu olhar para o corpo no colo do rapaz, depois se voltou para William, que chorava sem se importar com nada. Emma o envolveu em seus braços, puxando-o para um abraço acolhedor.