Os cabelos loiros e despenteados caiam sobre os olhos azuis, como cristais. Encarava o chão em frente à porta, esperando por algo.
E nada.
Bri o passava bilhetinhos por ali naquele horário, mas dessa vez, nada veio.
Bufou emburrado. Ainda eram duas da tarde. Bri tinha a sua própria vida e talvez apenas estivesse atrasado.E se Bri tivesse esquecido de Roger?
Negou com a cabeça, assustado com a hipótese.
Bri era o único contato que tinha atrás daquela porta. Ninguém mais falava com ele. Era um rapaz tão solitário. Pobre garotinho...
Era uma pessoa carente. Obviamente era um adulto, mas agia como uma criança. Precisava de atenção. Porque já vivera tanto sem amor, que queria um pouquinho de carinho.Se fosse esquecido, choraria. Se fosse lembrado, choraria. Choraria por tudo.
Roger tentava entender. Ele queria entender. Queria parar. Queria que aquela tristeza imensa que crescia dentro de seu coração parasse. Doía muito. E como doía. Se sentia doente, incapaz. Dormia o dia todo, não se alimentava direito, nem saia de casa. Tudo o que tinha era os livros que não havia devolvido a biblioteca.
Ele sabia que o prazo acabaria. Uma hora teria que ir até a biblioteca.
Mas enrolaria o máximo possível. Não tinha coragem de ir lá. Olhar pra cara de John e explicar porque sumiu.
Nem ele sabia o motivo. Mas havia adquirido uma fobia tão grande de...
De tudo.
De sair de casa, de fazer amigos. De ver pessoas.A auto estima de Roger nunca foi das melhores, mas não era tão baixa. Se achava razoável. Mas palavras feias tornam as pessoas feias. E por todas as palavras feias que ouvira dos outros, Roger se sentia mais feio do que tudo.
Levantou. Começou a se despir, tirando o grande suéter que usava e a roupa íntima. Estava magro. Realmente, como Bri havia dito, parecia uma garota. O cabelo longo e o corpo magro davam uma impressão mais feminina. Não se sentiu bem. Queria ganhar uns quilinhos a mais, mas não era acostumado a comer muito. Queria voltar a parecer um menino saudável. Com aquelas bochechas rosadas e a mini barriguinha, a pele bronzeada, como de alguém que pegava muito sol. Mas se olhava no espelho e tudo o que via era um homem magro demais e triste demais.Um garotinho chorão.
Apontava defeitos aqui e ali. Entristeceu-se.
Queria ser bonito que nem os outros rapazes.Ser simpático e ter um sorriso de matar, daquele que deixa as moças encantadas. No caso, queria deixar os homens encantados, porque não se interessava muito em moças.
Olhou para a porta de novo. Nada. Nenhum sinal. Se envolveu com uma coberta, mantendo o corpo nu aquecido e agora escondido.
Deitou-se no chão, esperando a choradeira vir. Tinha muito medo de Bri não querer mais falar com ele.Mas Taylor sempre teve muito medo de muitas coisas.
•
Batucava os dedos na madeira, ansioso. As lágrimas começaram a descer.
Já estava anoitecendo e nada.
Nadinha de nada.
Não queria ser esquecido. Rezava, mesmo que não acreditasse em Deus, para que Bri aparecesse.
Estava sendo exagerado? Estava. Dramático? Com certeza. Mas Roger sempre sentiu tudo muito mais intensamente do que as outras pessoas. Um beliscão doeria dez vezes mais. Era sensível e sentimental demais. E paranóico demais. Era demais no geral, mas não o demais que almejava ser. Era o demais de "Não aguento mais" e não o demais de "Incrível". Queria ser o demais que Bri era. O demais bom. Mas era o demais ruim.Continuava esperando.
Talvez não viesse, mas esperaria até amanhã, se preciso.
Apenas para ler as palavras doces de um desconhecido gravadas em um papel.
Começou a rolar de um lado para o outro no chão, tentando se distrair. Pensar em algo que não fosse Bri. Lembrou do pão de mel na geladeira. Havia guardado o resto de ontem. Talvez devesse comer. Muitas pessoas ansiosas comem para diminuir a ansiedade, então, quem sabe, ficaria um pouquinho mais tranquilo saboreando um pão de mel.Se levantou e foi até a geladeira, abrindo-a e retirando de lá a pequena e fofa embalagem. Tirou o doce de dentro e mordeu, sentiu o gosto açucarado em sua boca. Deitou na cama, tomando cuidado para não sujar os lençóis com pão de mel.
Pão de mel lembrava Bri.
E apesar de não querer lembrar dele, lembrou. Queria ver como era. Não conseguia imaginar como seria o homem por trás da porta. Talvez o pedisse para ao menos lhe mostrar a sua voz. Se pedisse com jeitinho, possivelmente ouviria. Era o que esperava, ao menos.Pegou o caderninho de letras em cima da escrivaninha, a sua caneta predileta e passou a escrever. Quando estava nervoso, costumava compor músicas. E sempre estava, então haviam centenas de letras guardadas naquelas gavetas. Letras poéticas que seriam descartadas por medo da rejeição. Mas Roger já rejeitava a si mesmo.
•
Já era noite. Estava tristonho. Se sentiu definitivamente esquecido. Havia escrito duas músicas, duas! Apenas por tédio. Por ansiedade, nervosismo, talvez um desses. Só queria receber um maldito papelzinho.
E esse desejo foi realizado, porque ouviu duas batidinhas na porta, seguidas de um pequeno bilhete passando por baixo da madeira. Ficou tão eufórico que na hora de se levantar da cama tropeçou e caiu no chão, mas ignorou a dor, porque estava apressado para ler o conteúdo.
"Você já pensou em voar?"
Ficou confuso. Pessoas não voam. Como teria tal pensamento?
"Como assim?"
"Voar pra longe, e esquecer de tudo. Voar que nem um passarinho, sem rumo, só esperando o destino resolver tudo."
E de certa forma compreendeu.
Seria voar a liberdade?
A liberdade é algo alcançável?"Eu gostaria de voar. Gostaria de ser um passarinho, Bri."
"Sabe o que eu acho?"
"O que?"
"Acho que deveríamos voar juntos."
Sorriu. Verdadeiramente, sorriu. Era tão poético.
"Eu gostaria de voar com você."
"Desculpe pela demora, Rog. Acabei tendo alguns problemas hoje. Coisa pessoal, sabe?"
"Ah, tudo bem. Não é como se eu estivesse esperando."
A verdade é que estava. Sabia que estava. Chorou por isso. E choraria de novo e de novo.
"Amanhã vou te mandar mais. Entretanto, preciso ir me deitar agora."
"Boa noite..."
"Boa noite, Rog."
- Boa noite, Bri.
Brian ouviu atrás da porta. Era a voz de Roger. Sorriu. Era uma voz bonita. Pensou imediatamente como combinava. Era um contraste perfeito com seu rosto doce.
Dito isso, Brian se levantou e foi dormir. Dizendo outro boa noite mentalmente, já que não poderia falar em voz alta.Sempre ficavam mais aliviados, assim que trocavam as mensagens um com o outro.
Pelo menos era o que o cacheado sentia. Um alívio imenso. Porque pensava "Eu faço parte da vida de alguém" e mesmo que nem ao menos fossem amigos íntimos, faziam parte da rotina um do outro.E uma coisa da qual Brian nunca se arrependeria, era ter perguntando porque o vizinho chora todos os dias.
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Letters for Roger Taylor
FanfictionBrian Harold May constantemente se perguntava por que seu vizinho chorava todos os dias na sacada de seu apartamento, então resolveu passar pequenas cartas anônimas por baixo da porta do rapaz tentando descobrir o motivo de tanta tristeza. Como reme...