Entre todas as coisas que poderiam acontecer em seu caminho até a biblioteca no centro da cidade, Roger nem cogitou a possibilidade de uma delas realmente ocorrer.
A chuva.
Sentiu chuviscos molhando sua camisa, pequenos respingos tornando o tecido branco transparente. Então foi aumentando e aumentando, e o loirinho teve que lidar com a situação.Entrou no estabelecimento mais próximo, uma cafeteria.
Ótimo, havia se livrado da possibilidade de ficar ensopado, como a maioria das pessoas lá fora que esqueceram de trazer um guarda-chuva, assim como ele. Mas agora teria que lidar com um problema maior.Estava dentro de um café lotado de pessoas.
Pessoas que não conhecia. Parecia que todas o olhavam torto. Sentia algo dentro de sí que fazia com que em sua mente, todos parecessem reparar nele. Suas paranóias botavam palavras na boca das pessoas. A cada olhar que recebia, mesmo não intencional, criava um pensamento para aquela pessoa. Aquele senhor deve ter pensado no quanto eu sou estranho. Aquela garota deve estar rindo de mim internamente. Eles me acham feio. Me acham inútil e me acham desprezível. Sentiu vontade de chorar de novo, mas tinha muita vergonha de fazer na frente de tantas pessoas. Então apenas se sentou e pediu um café expresso, mesmo que não fosse o maior fã de bebidas amargas.
Estava inquieto. Parecia um inferno. Só desejava que a chuva passasse e pudesse encontrar John de uma vez por todas. Que ao menos lhe desse seu endereço. Se sentia burro por não ter trazido um guarda-chuva. Não tinha televisão e nem havia ligado o rádio aquela manhã, então não imaginou que choveria.
Ouviu um pequeno sino badalar, anunciado a chegada de mais um cliente. Na realidade, dois. Dois homens entraram pela porta, e como o bom curioso que ela, o jovem dos olhos azuis olhara imediatamente para a entrada assim que ouvira o barulho agudo. Um rapaz alto e outro nem tanto. O mais alto era definitivamente mais chamativo. Tinha um cabelo todo enrolado e era longo.
Roger o comparou mentalmente com um poodle. Mas um poodle fofo.
Se sentiu um pouco mal por isso. Sabia o quanto se sentia magoado com o que as outras pessoas pensavam dele, então falar da aparência do rapaz, mesmo que mentalmente e no caso, positivamente, não lhe agradou muito. Pediria perdão, mas muito provavelmente, ele não lia mentes para saber o que Roger havia pensado.
Era bonito. Tinha olhos claros e a boca rosada. Definitivamente, era bonito. O outro jovem também não ficava para trás. Tinha traços fortes e um nariz fino, com dentes avantajados. Eram como colírio para os olhos do loiro.
Roger sempre foi muito bobinho por garotos.
Não tinha um tipo ideal, na verdade. Não achava que estava em posição de escolher. O que viesse já estava de bom tamanho, já que não vinha muita coisa.
Não por não ser popular. Mas era muito tímido. Apesar da aparência charmosa que Taylor possuía, não tinha muita personalidade. Não que não tivesse, mas não conseguia se soltar perto dos outros. Amor nunca foi algo no que ele pensava muito, também. Mas gostava de todas essas coisas melosas e românticas. Sonhava em andar por aí segurando as mãos de um rapaz bonito. Ter um namorado para encher de beijinhos e carinho.
Gostaria de ser amado.
Continuou observando os dois garotos. Nem se dava mais conta de onde estava, e a ansiedade sumiu por um tempo, porque estava ocupado demais olhando os detalhes. O maxilar, o queixo, o nariz, e até mesmo a sobrancelhas eram bonitas. Definitivamente, Roger amava garotos.
Não que mulheres não fossem bonitas. Mas se sentir atraído e ter consciência de que algo é bonito são bem diferentes. Se fosse assim, se apaixonaria por todo mundo. Porque para ele, todo mundo tinha sua beleza, única e especialmente feita para aquela pessoa.
O homem o olhou de volta e ele nem percebeu. Estava olhando as mãos do garoto. Eram bonitas, assim como o resto. Voltou os olhinhos curiosos ao rosto, notando que o rapaz estava lhe observando também. Se sentiu surpreso e as bochechas foram esquentando. Desviou o olhar, como quem não quer nada, fingindo que não estava o secando desde que chegou ali. Fingiu folhear o cardápio, mesmo que já houvesse feito seu pedido.
Sentia as mãos suarem. Ficou tão nervoso... Realmente não era bom em ser social. Não conseguia nem dar umas encaradas, quem dera um possível flerte. Tão medroso.
Resolveu então ir até o banheiro. Levantou e andou rapidamente até lá, tirando a boina e os cabelos loiros do rosto, lavando o mesmo com água. Se observava no espelho e entristeceu-se. Não se sentia bonito. Não conseguia. A ansiedade voltou. Ficou imaginando sobre o que o homem havia pensando quando o pegou o olhando. Devia ter pensado que era esquisito e feio. Devia ter se sentido desconfortável.
Negou com a cabeça. Queria afastar esses pensamentos ruins de sí, porque de nada adiantaria. Apenas perderia a pouca coragem que lhe sobrava para ir até a biblioteca, e tinha chegado tão longe, não queria desistir agora. Veria John aquela tarde e paranóia nenhuma o impediria.Ou impediria?
Não queria que impedisse. Ficaria triste. Se trancaria de novo, se isolaria de novo. Decepcionaria John, decepcionaria a sí mesmo.
Decepcionaria Bri.Não desejava de jeito nenhum decepcionar Bri. Gostava tanto dele. Seria horrível a sensação de decepciona-lo. Não queria passar por isso. Então seria forte o bastante para terminar o que planejava fazer. Mesmo com chuva e pessoas e possíveis crises de choro. Guardaria suas lágrimas para depois, porque não poderiam ser derramadas agora. Não agora.
Saiu do banheiro, indo até a sua mesa. Uma expressão de pura confusão dominou seu rosto, e nem ao menos se sentou. Seu café estava ali, junto de um guarda chuva colorido e um papel toalha com algo escrito. Começou a ler.
"Você não pareceu ter um guarda-chuva consigo. Estou te dando este, porque acho que a chuva vai demorar pra passar. Eu paguei o seu café, também. Tenha um bom dia."
Olhou em volta, imaginando quem teria sido. Perguntou a uma garçonete enfrentando a timidez e o medo de conversar com os outros, mas ela disse que era um segredo. Ficou perdido.
Os dois rapazes já não estavam mais ali.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Letters for Roger Taylor
FanfictionBrian Harold May constantemente se perguntava por que seu vizinho chorava todos os dias na sacada de seu apartamento, então resolveu passar pequenas cartas anônimas por baixo da porta do rapaz tentando descobrir o motivo de tanta tristeza. Como reme...