Escritório
Porto, 2008
O cheiro de roupa passada e café fresco me revigorou um pouco. Cheguei mais cedo do que o necessário no trabalho porque nunca antes eu sentira tanta vontade de trabalhar. Era um emprego simples e fora da minha área, mas bastante prestativo em relação à levante financeiro.
Apesar de sempre ter tido uma preferência singela de trabalhar em um local reservado, ali estava eu, em uma sala com um monte de interrupções telefônicas a todo momento e pessoas a todo vapor, perambulando incessantemente de um lado para o outro, como se estivessem sempre à procura de algo inalcançável.
Minha mesa na verdade não era minha, era nossa, eu fazia parte da equipe de atendimento e telemarketing — sim, fazíamos um pouco de cada pois a empresa não era lá essas coisas então nos pediam para ramificar nossas tarefas com a promessa de recebermos mais capital, só a promessa —, a mesa em questão era bem elegante, de uma madeira clara e lisa com cerca de quatro computadores e telefones ao lado por fileira. Apesar da empresa não ser consideravelmente conhecida, tinha uma estrutura muito boa. O chão era carpetado o que significava que éramos estritamente proibidos de tomar café em qualquer outro lugar senão no refeitório. Havia cerca de cinco mesas longas como a minha e cada uma delas era aproveitado ambos os lados, então não podíamos nos mexer muito para falar a verdade ou então atrapalharia o serviço de outro. As cadeiras eram intencionalmente confortáveis por isso, tinham o mesmo padrão de cor cinza escuro.
O espaço entre os computadores eram de no máximo cinco centímetros, o que ajudava mesmo era que suas "corcundas", como costumamos chamar, aumentavam essa margem de distância. Eu me sentava a duas cadeiras de distância da grande janela que clareava nossa sala. Seu tamanho era intencional para a iluminação do lugar aliás, os donos são bem cuidadosos nos detalhes, tudo que puderem economizar, assim o farão. E falando em donos, suas salas ficavam às escondidas por um grande portão que abria pela lateral feita de ferro com grandes maçanetas retas no meio que possibilitavam que ela se abrisse em vertical com o auxílio de um mecanismo que funcionava como trilhos.
— Amélie, está me ouvindo? — uma figura gordinha e careca enfiada num terno cinza me encarava.
— Opa, desculpa sr. Manoel! Pode falar... — respondi atordoada.
— Você já ligou para os números que eu coloquei na sua mesa?
— Faltam alguns, senhor — menti, não havia nem começado.
— Pois então termine, estamos precisando vender mais — ele retirou o olhar de mim e se dirigiu ao meio da sala, aumentando seu tom de voz —, e não quero ver ninguém parado hoje!
Suspirei fundo e abri minha agenda, é verdade que aquele trabalho me ajudava tremendamente a me manter naquele país estrangeiro e conseguir pagar uma parte da minha faculdade com auxílio dos meus pais, mas as vezes era um trabalho pesado, nada além de algo temporário.
Assim espero, pensei.
De qualquer forma, não poderia me dar ao luxo de pedir ainda mais do que recebo à minha família, além de todo suporte em relação ao meu estudo, eles me ajudaram também em conseguir aquela casa que apesar de antiga — e agora traumatizante —, era um belo gesto por parte deles. Tinha medo de perder o emprego, mas não deveria ter, não deveria me sentir assim, então passei a controlar minhas emoções.
Peguei o papel dobrado que estava debaixo da minha agenda e passei o dedo nos nomes que estavam ali e segui a ordem de prioridade. Disquei os números indicados no telefone ao meu lado enquanto me concentrava em ignorar a barulheira.
— Bom dia...
-✻-
Continuei a telefonar para os nomes da lista e fui marcando um pequeno risco com caneta vermelha ao lado para identificar os que já havia concluído. Isso sim era uma boa distração, só percebi quanto tempo havia passado quando a sala escureceu levemente, por conta do sol que estava perdendo a intensidade. Nem fiz questão de conferir as horas, estava em um estado tão depravado que estar ali trabalhando freneticamente na realidade me ajudava a superar a confusão que estava passando nos últimos dias.
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A Maldição de Luna
RomanceApós a recusa de ter um relacionamento amoroso com sua amiga insamente apaixonada por ela, Amélie LeBlanc recebe uma "maldição" que destrói sua vida aos poucos. Cada dia que passa ela tem uma visão que desmorona alguma parte de sua humanidade, torna...