Capítulo oito

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Insônia

Porto, 2008

Não poderia ter sido melhor recebida por Natasha e sua família. Moravam não muito longe da Universidade do Porto – o que me fazia pensar porquê ela sempre se atrasava para as aulas —, e o conforto vinha não só das mobílias, mas também da simpatia dos moradores, ou seja, seus pais, e da boa ambientação e positividade que o lugar trazia.

O quarto de Natasha tinha um beliche marrom encostado na parede. O espaço era grande, o suficiente para comportar um grande tapete retangular preto e branco no centro e uma janela enorme na lateral, além de um armário que quase alcançava a altura do teto com dois grandes espelhos pendendo em cada porta. Havia também, do lado oposto do quarto em relação à cama, um carretel porta-livros e uma televisão média apoiada em cima. Aquilo só poderia significar duas coisas: ou sua família tinha uma situação financeira bastante favorável ou então a vida de filha única era realmente muito mais fácil.

— Seus pais são muito gentis. — falei enquanto despia minha roupa e colocava um pijama que pegara emprestado com ela.

— É, até que eles sabem tratar bem as pessoas, mas adoram aparecer um pouco quando tem visita aqui em casa, então não se espante se eles quiserem te impressionar com alguma coisa... — Natasha puxava para fora a grande madeira com o colchão, iria me oferecer para ajudar, mas vi que tinha rodinhas então ela finalizou rapidamente.

— Tem acontecido tanta coisa bizarra ultimamente que acho difícil me impressionar com alguma coisa... — retruquei num murmúrio, com pesar na voz.

Natasha me olhou preocupada, seu olhar revelava compaixão. Ela se aproximou de mim e apoiou suas mãos nos meus ombros.

— Olha, se... aquilo — ela falou meio sem jeito — acontecer de novo, pode me acordar se sentir necessidade. Você não precisa enfrentar tudo sozinha...

Apesar de querer ficar reclusa, sabia que ela tinha razão.

— Obrigada, Natasha, você também é muito gentil! — respondi lhe dando um sorriso sincero.

Seu dedo acariciou minha bochecha, Natasha estava fazendo o papel de irmã mais velha para mim e eu não poderia estar mais agradecida por isso.

— Acho melhor a gente dormir logo, já está tarde e amanhã temos que procurar... como você disse que se chama mesmo?

— Hipnoterapeuta! – respondi lembrando-me da instrução que tive. – Ou profissional em hipnose, se preferir. — acrescentei de um jeito inaudível. — Já que as coisas pioraram...

Nos deitamos nas camas e ficamos vendo televisão até o sono realmente nos alcançar. Natasha perguntou se tinha problema deixá-la ligada durante a noite, pois ela gostava de dormir assim, eu não via nenhum problema então não relutei em concordar. Senti que ela havia dormido depois de um pouco mais de vinte minutos de conteúdo televisivo. Abaixei o volume da televisão, mas deixei-a permanecer ligada, estava passando um desenho adulto com personagens coloridos. Mas o que realmente prendia a minha atenção era a claridade que vinha da fresta da janela atrás de mim, fiquei observando-a como à um quadro artístico. Não havia programação mais bonita que aquela, mesmo com o brilho da lua sendo apaziguada pelo vidro.

De baixo, da cama no chão, fiquei observando Natasha dormindo calmamente. Seu rosto revelava uma calma sublime e confortável. Para ser sincera, até eu me sentia assim, seu quarto em si trazia aquela sensação.

O cheiro de pétalas artificiais, o clima agradável que o aquecedor trazia, o som baixo de fundo vindo da televisão e até mesmo a doce luz da lua que vinha entrecortada pela janela. Tudo isso criava um ambiente acalentador, mas havia algo nela... algo que sentia que nunca teria novamente, era uma paz interna, como se ela estivesse totalmente de bem com a vida e disposta a continuar vivendo da sua própria maneira.

A Maldição de LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora