Uma data especial: Parte III

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Menton, 2005

Reparei que minha mãe ainda não tinha notado nossa presença. Não queria desgrudar minha mão da de Luna, mas presumi que era o melhor a se fazer para não a assustar. Me aproximei da minha mãe enquanto Luna esperava um pouco mais atrás, cheguei sorridente obviamente para conquistar sua confiança e contei tudo — resumidamente é claro — de modo discreto em seu ouvido.

— Meu Deus, não acredito! — para minha feliz surpresa, minha mãe me encarou alegre. — Então dessa vez você não saiu correndo? Já é um avanço e tanto!

— É verdade — retribuí com um riso contente —, mas você não está brava com isso?

Ela me encarou incrédula com a minha pergunta.

— Brava? É claro que não, filha! — minha mãe falou enquanto pulava e dançava. — Eu amo você do mesmo jeito, e fico feliz que estejam finalmente juntas.

Corei.

Como assim?

Minha mãe visivelmente percebeu minha indignação, mas ficou realmente feliz de saber que eu e Luna estávamos ficando e ainda acrescentou satisfeita em meio à tanto barulho:

— Veja bem, Amélie, eu sempre desconfiei — e torci! —, para que vocês ficassem juntas.

— Você é demais, mãe! — lasquei-la um abraço forte mesmo em meio à toda aquela zorra, foi difícil de manter então me afastei por instinto, sem conseguir conter minha emoção e sorrindo até minhas bochechas doerem.

Chegava a ser estranho como tudo estava correndo tão bem, as peças estavam se encaixando perfeitamente e eu me sentia realmente feliz com tudo isso. Luna se aproximou de minha mãe e elas se cumprimentaram entusiasmadamente, já se conheciam, afinal. Não precisei falar nada para ela para que entendesse que minha mãe aprovava nosso relacionamento, apenas segurei sua mão e a encarei contente.

Com a chegada do trio elétrico a farra só aumentara, as pessoas — incluindo a gente — dançavam sem parar, pulavam freneticamente, não se preocupavam em jogar bebida para o alto, fora os gritos de comemoração e a agarração desenfreada.

Enfim, estávamos todos aproveitando uma grande festa, é como se fosse aniversário de todo mundo ao mesmo tempo, tínhamos um motivo mútuo para estarmos felizes e não deixamos escapar nenhuma brecha!

O trio elétrico continuaria seguindo a festança desmedida, mas ao se aproximar da orla optamos por desviar o caminho. Nos despedimos da minha mãe e fomos para a grande calçada ao lado dos quiosques coloridos perto do mar. O vento penteava os coqueiros e a movimentação de pessoas ali era menor, mas ainda assim era impressionante se comparado com os "dias normais" daquela região. Havia muitos carros estacionados na rua, do lado dos condomínios.

Recuperamos nosso fôlego e ficamos observando a calçada revestido de ladrilhos marrom desbotado ao lado, com grandes faixas brancas que indicavam a interseção entre a ciclovia e a área de pedestres. Andamos até um quiosque mais vazio, mais especificamente: o lilás.

De perto era possível ver melhor seu formato curioso, era um balcão tampado com um telhado branco em cima e uma cozinha ao fundo que visto de fora tem a silhueta semelhante à da ponta de um navio. Não era para menos, aquela orla sempre fora bastante conhecida pelo grande armazenamento de barcos de diversos portes. Na parte de trás havia cerca de três mesas redondas daquela de pedra com bancos ao redor, fora a borda que ficava com proximidade da água abaixo.

Sentamos nessa borda, havia um espaço proposital, fazendo parecer algum tipo de sofá medieval e descansamos um pouco. Havia colunas brancas com barras de pedra fazendo sombras listradas no ambiente, como um lounge a céu aberto. Assim que regulamos nossa respiração, ficamos nos encarando em silêncio. Luna tirou a peruca e deixou o cabelo solto, ficou bastante bagunçado por conta do abafamento. Fiquei fazendo carinho em sua mão enquanto ela acariciava meu cabelo a partir da nuca. Ficamos em um silêncio acalentador.

A Maldição de LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora