Julgamento

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Tribunal, 2009

— Além do documento entregue anteriormente, a senhorita gostaria de declarar algo mais para sua própria defesa?

— Não, creio que seja o suficiente, meritíssimo.

Um baque intrínseco do martelo sob a plataforma circular de madeira chamou a atenção de todos presentes na audiência.

— Conforme requisitado na última visita, acredito que todos tenham lido o material entregue — o homem gorducho de oculozinhos redondos vagou seu olhar ao redor, buscando alguma manifestação —, nele vocês encontraram o detalhado testemunho da senhorita Amélie acerca do caso.

Seu nariz balançou para os lados, como se estivesse tentando ajustar os pelos do grande bigode. Sua afirmação causou excitação entre os que estavam lá, incitando pequenas fofocas sussurradas.

— Bem, com base no material, gostaria de passar a palavra para o advogado da senhorita Antonella, para que assim expresse a opinião de sua cliente.

A estrutura do tribunal era colossal em termos de altura e espaçamento, o tamanho era tanto que chegava a caber três grandes pinturas barrocas emolduradas na parede atrás do juiz, que se sentava numa cadeira semelhante à um trono, em uma mesa que ficava mais elevada que todas as outras no tribunal. Havia também uma escolha excessiva por tons diferentes de marrom, mas é claro que possuía um significado por trás dessas escolhas, entre elas estavam a seriedade e a calma que as cores traziam consigo. Fazendo assim, um clima respeitoso e diminuindo exponencialmente os possíveis nervos nas discussões.

— Veja bem, meritíssimo, não querendo descredibilizar os motivos alegados pela senhorita Amélie em seu documento, mas nada diminui os fatos de que ela tirou a vida de Luna Castagno em meados do ano precedente.

Houve uma agitação imediata nas grandes mesas laterais, pessoas ficando exaltadas, provavelmente cochichando sobre suas opiniões e concordando com a afirmação do advogado.

Uma das quatro lamparinas que ficavam ao redor do local iluminava diagonalmente o rosto do homem engravatado. O juiz percebeu a agitação e repetiu o movimento de martelar a plataforma de madeira mais uma vez, afim de recobrar a atenção de todos.

— Sim, entendo, e o senhor tem razão, mas a questão é que ninguém, nem mesmo a senhorita Amélie, negou o fato de suas ações. O que deve ser discutido aqui é realmente o fundamento de suas intenções.

Uma jovem mulher branca e bem vestida que estava sentada ao lado de uma senhora claramente adoecida se levantou como trovão de uma das duas mesas que ficavam de frente para o juiz, entre as outras duas mesas laterais, onde mesclavam-se as testemunhas e a audiência.

— Isso é um ultraje! Suas intenções estão claras, ela matou porque quis! Em seu próprio documento ela assume que estava consciente e que minha prima não estava demonstrando resistência.

Três toques.

Dessa vez o eco do martelo se intensificou e alcançou o ouvido de todos na sala, até mesmo os anjos barrocos no teto pareceram se mover assustados.

— Silêncio no tribunal!

Apenas pequenos ruídos de limpar de gargantas e espirros tímidos permaneceram.

— Senhorita Amélie, terá mais uma chance de declarar algo para sua própria defesa.

O advogado voltou a sentar-se, já conhecendo as regras de uma audiência judicial. Fez um gesto de mão indicando que Antonella fizesse o mesmo. Enquanto isso, Amélie, sozinha na mesa e com seu olhar vazio, fitou o juiz.

A Maldição de LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora