Capítulo dois

91 19 231
                                    

Reação

Porto, 2008

Minha primeira reação foi, como todo ser humano normal, ficar nervosa.

Nervosa de verdade, ao ponto de suar e ficar com a respiração ofegante, com a visão turva, e eu tive que colocar a mão no peito como uma forma subconsciente de me acalmar. Tossi em choque por alguns segundos e evitei olhar o corpo pendurado na corda bem no meio do meu quarto.

Tentei controlar meu intestino — que borbulhava ameaçadoramente —, mas parecia impossível. Coloquei uma mão na boca e mesmo assim senti minha garganta se dilatando, repelindo um pouco de vômito que saiu involuntariamente do meu corpo. Sujei apenas a mão e um pedaço do meu casaco, e como estava com uma camisa por baixo não me importei em tirá-lo e aproveitar para usá-lo como pano.

Limpei a boca e depois a mão, admito que esfreguei um pouco a língua no tecido antes de jogá-lo no lixo. Depois eu colocaria para fora é claro, mas antes, precisava me concentrar na situação. Voltei o olhar para o corpo de Luna.

Teria sido suicídio? E se sim, por que?

Senti meus olhos lacrimejarem, o desespero tomava conta de mim, me sentia fraca e a tontura ameaçava me atacar. Minha amiga estava morta, e eu não fazia a menor ideia de como ela foi parar ali. Nenhuma memória, nenhuma recordação do que pudera ter acontecido, nada além do bizarro sonho que tive aquela noite.

Dei um pinote até a escrivaninha e peguei o telefone residencial, disquei os dois primeiros números e fiquei encarando o vazio, com a respiração ainda ofegante. Minha mente estava mergulhada em um turbilhão de pensamentos, e assim que o aparelho anunciou em uma voz feminina que o número não foi encontrado, eu o afastei de mim.

Parando para pensar, ligar para a polícia seria uma tolice desmedida, um corpo de uma pessoa morta presa em uma corda no meio do meu quarto. O que eles iriam pensar? Que a festa não acabou muito bem? É claro que não, pensariam que eu forjei seu suicídio e isso era óbvio.

Aliás, como ela foi parar ali? Será que o que eu sonhei foi verdade ou...?

Minhas unhas arranhavam a superfície da minha mão, estava tão nervosa que aquela mutilação inconsciente foi uma forma de me manter, no mínimo, pensativa.

Alguém a havia assassinado? Mas isso não fazia sentido...

Dúvidas. Dúvidas. Dúvidas.

Talvez o assassino ainda esteja dentro de casa, pensei.

Seja lá o motivo que alguém tivesse para matar Luna, colocar o corpo dela ali no meu quarto não era apenas um mero acaso do destino, muito pelo contrário, talvez estivesse ali explicitamente para me advertir de que eu seria a próxima! Ou pelo menos era isso que passava pela minha cabeça.

Meu estômago fez um barulho estranho, sabia que era uma reação ao medo, assim como o catarro que saía das minhas narinas, enquanto as lágrimas caíam lentamente em silêncio. Meu rosto provavelmente estava um liquidificador de emoções, mas era muita coisa para formular de uma só vez.

Pensei novamente em ligar para a polícia, mas caso eu estivesse surtando em relação à um assassino dentro da minha casa, estaria encrencada. Por isso, peguei um objeto firme debaixo da minha cama, era um bastão de madeira, bastante resistente por sinal. Não me pergunte o porquê de eu ter um bastão de madeira debaixo da cama, o que você faria se tivesse apenas vinte anos e vivesse sozinha num país estrangeiro?

Saí do quarto fazendo o máximo de silêncio possível, quando passei do lado do corpo de Luna evitei olhar, pois sabia que provavelmente iria fazer um estardalhaço, mas ainda assim, não pude evitar de soltar um pequeno suspiro agonizante de dor.

A Maldição de LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora