Alion olha ao seu redor, e tudo que vê é escuridão. Não sabe como chegou ali, em um segundo estava dançando com Isav, no outro, ouviu um estrondo e tudo apagou.
Uma fagulha de luz surge nas trevas, fraca e turva, prestes a desaparecer. É sua marca, flutuando a seus pés. Ele a toca. Toda uma imagem aparece. Seu corpo jaz imóvel no chão, a marca brilhando em seu peito, no rumo do coração, mas é outra coisa que chama sua atenção: Isav aos prantos, agarrando seu corpo morto, e Lara, a alguns metros de distância, debruçada no chão, chorando descontrolada.
Alion chama por eles, mas nenhum dos dois o escutam. Ele tenta tocá-lo, mas é como se fossem meras ilusões. Isto é, se ele próprio não for uma.
Ele toca seu símbolo de novo. A marca se expande e seu braço a atravessa. Por um breve momento, ele sente como se seu braço fosse feito de carne novamente. Passa mais o braço através da marca, que se ajusta, abrindo passagem, mas uma voz o detém.
-Espere - ele ouve.
Buscando a origem da voz, Alion dá de cara com as mesmas estátuas que encontrou durante a luta contra os tsitarë. Receoso e suando frio, ele recolhe seu braço. As grandes estátuas são extremamente semelhantes às gregas, e irradiam essência pura. Há 14 delas, todas o encarando como se ele fosse um intruso ali.
-O que vocês desejam ? - pergunta, calmo.
-Você sabe quem somos ? - questiona uma estátua feminina.
-As estátuas que estavam discutindo se o vestido era preto e azul ou branco e dourado.
-Já saímos dessa, a questão agora é se o melhor estrogonofe é o de frango ou vaca, mas isso é assunto para outro momento. Você acertou, somos as estátuas que discutiam a cor de um vestido, mas esperávamos outra resposta. Pense um pouco, quem nós somos ?
Alion analisa as possibilidades por alguns segundos e a resposta se mostra óbvia:
-Vocês são os profetas.
-Correto. Eu sou a profeta didática. Você está diante de 14 das 15 partes da entidade "O profeta": O feliz, o estressado, a analista, a fria, o sonso, a crente, o desconfiado, o invejoso, a didática, o fofoqueiro, o tímido, o narrador, a biscoiteira e o confuso.
-E qual é o que não veio ?
-A furona, mas não repare, ela nunca vai pra lugar nenhum.
-Qual é aquele que tá ali no canto ? - pergunta o garoto, olhando diretamente para mim. Ele está ligeiramente amedrontado pela minha presença, tem a sensação de que estou observando-o mais atentamente do que os outros profetas. Ele não está errado. "Coisa sinistra", ele pensa, fazendo com que eu me sinta ligeiramente ofendido.
-Aquele é o narrador - responde a estátua que Alion rapidamente identifica como sendo a analista - ele nunca fala nada, nem se envolve com a gente, só fica narrando as coisas.
-Pra quem ele narra, se nunca fala com vocês ?
-Ai, nem te conto, ele só narra pra ele mesmo, mas eu nem te conto, é confuso até pra gente, sabe ? Nem te conto - "Esse deve ser o fofoqueiro", supõe Alion.
-Ô, fofoqueiro, não adianta falar "nem te conto" e depois contar as coisas, para de querer biscoito - "Critica quem quer biscoito pra poder ganhar biscoito, essa certamente é a biscoiteira", deduz.
-Eu tô confuso - "esse é o confuso" - se nós somos o mesmo ser, por quê a gente não entende o que se passa na cabeça do narrador ?
-Eu ia amar que vocês imbecis não pudessem entender o que eu penso, não posso ter um minuto de privacidade nunca - fala o invejoso.
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I.L.A
AventuraUm dia antes de seu aniversário de 18 anos, Isav começa a notar coisas estranhas acontecendo ao seu redor. Enxerga coisas impossíveis, seres que não existem e que ninguém mais parece ver. Esteja ele vendo coisas irreais, ou presenciando verdadeiros...