Capítulo 13

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— Você é um desgraçado. — Eu disse, tentando respirar normalmente depois de tamanho susto — Achou que faria alguma diferença me contar que matou um cachorro?

Me sentei com as mãos na cabeça. Mal estava me aguentando em pé de tanta febre.

— Eu não sei do que está rindo. — Ele pareceu confuso quando se sentou ao meu lado — Esse cão de caça é do Juca Moreira.

Aquele homem outra vez. 

— Você se meteu com o fazendeiro.

— Pensa que me meti nisso de propósito, Rômulo? — Ele me disse, com seu jeito malandro.

— E então?

— Depois da confusão na praça, a Martinha foi embora com aquele casalzinho, lembra que te contei?

— Lembro.

— Bom, a história não termina aí, como eu havia dito.

— Você mentiu.

— Menti, fazer o quê? — Ele admitiu — Eu me adiantei e esperei os três chegarem na Rua Nova. Mesmo com a chuva que ia e vinha eu insisti em esperar. Queria falar com ela, não tiro a moleca da cabeça.

— Quando você encafifa com uma moça, nada faz você esquecer. Só que, depois que fica com ela, logo larga mão.

Mauro não me deu atenção de imediato e continuou olhando para o nada.

— Pode ser, mas agora não é o caso.

— Tá certo, mas você falou com a Martinha ou não?

— Não, os três não foram pra casa dela. Desviaram para a estrada que leva à Pedra Santa, uma montanha que o povo fala que é milagrosa.

— Existe montanha santa?

- Aqui existe, irmão. No topo dessa montanha tem um cruzeiro e um pouco pra baixo tem uma capelinha. É só uma casinha que mal cabe uma pessoa de pé, mas dentro dela brota uma água que dizem que nunca seca. Não é muito fácil de subir, mas as pessoas se juntam pra ir lá no dia 15 de agosto.

— É dia da Assunção da Virgem Maria.

— Ele te ensinou bem, não foi? — Mauro sorriu. Ele não prestava atenção ao catecismo ensinado pelo militar quando éramos crianças, mas eu sabia que aprender era a única forma de sobreviver.

— Tem coisas que a gente não esquece. — Falei, relembrando o som das botas do capitão.

— As pessoas tem muita fé naquela pedra. Em épocas de seca costumam subir lá com litros de água para despejar na fonte, pedindo chuva. Muitos carregam pedras até o cruzeiro como penitência, fazem orações e pedidos.

— Você seguiu os garotos até lá?

— Segui. — Disse ele — Começou a chover mais forte, então eles nem escutavam os cascos do cavalo atrás deles. Eu vi quando encontraram um rapaz perto de uma lavoura de café que termina no topo da Pedra Santa. Não consegui reconhecer a cara dele, mas a brasília que tava lá era do seu Juca Moreira. O garoto eu ainda não sei quem é, mas trazia esse cachorro aí amarrado numa corda.

— O que você tava querendo à essa altura? — Me irritou pensar que as atitudes de Mauro não faziam sentido.

— Nem eu sei, Rômulo. — Ele riu — Tinha bebido demais e a menina tinha me assanhado com aqueles tapas.

— Movido pelo pau então, não é?

— Não posso negar. — Mauro colocou um talo de flor entre os dentes. Sentia saudade do cigarro que, provavelmente havia esquecido na pressa de me procurar.

a Flor e o VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora