Era domingo de manhã, e antes de qualquer coisa eu estava presente na primeira reunião na igreja. Buscar o Espírito Santo era o meu alimento, era aonde eu me encontrava com o meu Criador, onde eu saia com todas as minhas forças renovadas para enfrentar tudo que viesse contra mim. Eu não trocava aquele momento por nada.
O Pastor pregava sobre a importância de permanecermos fiéis, quando meu celular começou a vibrar. Normalmente eu desligava, mas como eu havia esquecido, sua luz brilhava convidando a atender.
Sem ao menos olhar quem era, deslizei o botão vermelho rejeitando a ligação.
Fiz isso na primeira, na segunda, na terceira e quando estava prestes a fazer pela quarta vez, o número de Malom apareceu na tela. Discretamente me levantei e fui para fora da igreja, pronta para brigar com meu filho.
Quando sai de casa pela manhã, ele ainda não havia chegado, mas Malom sabia aonde eu estava naquela hora, sabia que se eu estivesse dentro da igreja, eu sequer atenderia o telefone.
-Malom! Você sabe que estou na igreja! Por que está me ligando?! -Falei exasperada assim que atendi.
Alguns soluços e uma voz feminina que eu não conhecia:
-Dona Noemi? -A voz estava fraca. -Meu nome é Rute... Eu sou... -Hesitação. -Eu sou amiga do seu filho, estou com o celular dele e achei melhor ligar para a senhora. Malom acabou de dar entrada na sala de emergência, é melhor a senhora vim para o hospital.
Senti meu peito afundar.
***
Cheguei no hospital depois de trinta minutos, caminhei até a bancada querendo saber mais informações sobre o meu filho. Pelo visto, Malom havia passado a noite toda bebendo, pegou o carro e acabou batendo em outro, causando um acidente grave e estava na UTI entre a vida e a morte.
Eu não podia vê-lo, não podia fazer nada. Ali estava um dos meus limites.
-Senhor, eu só posso chegar até aqui. Não aceito perder a alma do meu filho para o inferno! -Sussurrei, não precisava chorar, eu já tinha enfrentado muita coisa para chegar ali e tudo acabar daquela forma. Eu tinha certeza que meu filho ficaria bem.
Caminhei até a sala de espera e observei uma jovem que estava sentada com os olhos fechados e respirando profundamente.
Ela era muito bonita, mas eu via o quanto seu semblante estava para baixo. Seu rosto tinha alguns cortes, assim como suas pernas que estavam cobertas apenas por um pedaço de pano que chamavam de saia. Seus braços estavam cobertos por um lençol e em uma das mãos a garota segurava um celular.
-Rute? -Perguntei em dúvida.
A garota abriu os olhos e franziu as sobrancelhas.
-Sou a Noemi.
A garota se levantou e veio timidamente me cumprimentar, de perto pude ver olheiras profundas embaixo de seus olhos. O cheiro de álcool e cigarro também pareciam estar impregnados em seus cabelos, e logo vi aquela jovem com amor. Rute não parecia destruída apenas por fora, mas principalmente por dentro.
-Se eu pudesse voltar no começo dessa noite... -Ela suspirou. -Eu jamais teria deixado Malom pegar o carro naquele estado. -A observei em silêncio e percebi que algo a incomodava. Rute a todo instante tentava se cobrir com o pequeno lençol, como se estivesse com vergonha.
Vergonha de mim.
Nesse momento vi como nós cristãos temos um poder enorme sobre outras pessoas que às vezes não nos damos conta disso. Um olhar, um gesto ou uma palavra mal colocada ao invés de ajudar uma pessoa, pode afasta-la ainda mais de Jesus.