Mais uma vez eu vou falar de confiança, porque se não fosse a minha em Deus, certamente a muito tempo eu teria naufragado.
Fora que eu sei como é difícil confiar em Alguém que você não está vendo, ainda mais quando o mundo está prestes a cair ao seu redor.
Mas se nós não confiarmos nEle, em quem iremos?
Ele era a minha saída, o meu milagre, o meu sustento e a minha salvação.
Eu acreditava que daria tudo certo no final.
Eu estava sentada na sala, já era tarde e a madrugada avançava rapidamente, por mais que eu tentasse dormir, algo naquela noite me mantinha acordada. Peguei um cobertor e fiquei lá embaixo.
Eu sabia o que era, Malom não havia chegado ainda e de alguma forma Deus me tocava que ele precisava de mim.
Fiquei ali um bom tempo lendo a Bíblia quando Rute desceu timidamente, seu cobertor estava enrolado em seu corpo, mas seu cabelo em perfeita ordem mostrava que sequer ela tinha deitado.
-Não está conseguindo dormir? -Perguntei.
-Estou preocupada com Malom, mesmo que eu me forçasse, não consegui pregar o olho em nenhum momento. -Ela respirou fundo, claramente aflita. -A senhora não está preocupada?
-A minha preocupação é diferente da sua. -Falei, Rute franziu as sobrancelhas e abri o cobertor sinalizando para que ela se encaixasse ali. -Vem, senta aqui.
Rute foi até mim e eu a abracei como se fosse minha filha. Ela repousou sua cabeça em meu peito, enquanto eu deslizava meus dedos pelos cabelos da jovem.
-Eu achei que ele iria mudar quando eu aceitasse me casar com ele. -Ela declarou. -Acreditei de verdade que Malom poderia ser um homem diferente, mas já faz quase seis meses e ele parece que piorou! Dona Noemi, não sei mais o que fazer! -O corpo de Rute começou a tremer e percebi que a garota tentava não chorar.
-Vai ficar tudo bem. -Sussurrei.
-Como a senhora consegue falar isso?
-Consigo porque confio em Deus, se não confiasse nEle, eu estaria igual ou talvez pior do que você.
-Confiar em Deus?
-Quiliom pode chegar no fundo do poço, mas o meu Deus está guardando a vida dele. -Rute me olhou, mas ainda era nítido a sua agitação. -Quer saber? Que tal a gente fazer uma oração por ele? -Sugeri.
A garota concordou, nos levantamos e fizemos uma curta oração, nos sentamos novamente e dessa vez não demorou muito para que ela caísse no sono.
Eu estava lutando bravamente, mas logo cochilei também, o que parecia ser apenas alguns minutos, foram duas horas quando meu celular tocou nos despertando.
-Alô? -Atendi sonolenta sem sequer ver o número.
-A senhora é a mãe do Malom? -Uma voz masculina bem jovem perguntou do outro lado da linha.
-Sou eu mesma. Aconteceu alguma coisa?
-Então, a senhora pode vim buscar ele? Ele bebeu de mais, não consegue nem ficar em pé!
-É claro.
O jovem me passou o endereço, me levantei do sofá e Rute olhou para mim como se fosse uma criança de seis anos que eu não poderia deixar sozinha:
-Você quer ir comigo?
-Sim!
***
O lugar era horrível, era uma casa enorme, mas toda suja. Não havia mais nenhum jovem por ali, mas era nítido que eles haviam estado ali.
Copos, garrafas, roupas e cigarros pelo chão, sem contar o cheiro forte das bebidas derramadas e as drogas usadas.
Eu estava ali, com o jovem me guiando por aquela bagunça até aonde Malom estava, mas meu pensamento estava longe, estava em cada jovem que tinha uma vida tão destruída quanto a do meu filho.
Não só aqueles jovens, mas pensei em quem estava na casa esperando por eles e torcendo para que nada de ruim acontecesse.
A aflição, a agonia e a ansiedade.
Ainda estávamos fazendo pouco para ajudar aquelas pessoas, e meu coração se apertou.
Eu poderia ter um filho na mesma situação, mas eu tinha a Quem recorrer.
Entramos no quarto e Malom estava jogado na cama sem a camiseta. Agradeci ao jovem que havia nos levado até ali e ele timidamente saiu.
Rute observava Malom jogado na cama e eu via a decepção em seu olhar.
Me aproximei do meu filho e peguei sua camiseta que estava no chão:
-Malom, acorda. -Comecei a sacudi-lo.
-Hum... -Ele abre os olhos, mas não me reconhece. -Não quero ir pra escola. -Ele balbucia.
Respiro fundo e mesmo contra a sua vontade começo a vesti-lo. O cheiro da bebida era forte e meu estômago se embrulhava. Rute com o rosto impassível veio me ajudar a leva-lo para o carro. Malom continuava balbuciando, tentava se esquivar de nós duas, mas seu corpo não correspondia.
Colocamos ele no banco de trás e comecei a dirigir, Rute começou a chorar silenciosamente.
-Não precisa chorar. -Tentei consolar.
-Eu achei que Deus ia o guardar! -Ela retrucou. -Como é que Deus guarda alguém assim? Como mesmo a gente entregando a vida dele nas mãos de Deus, Ele continua assim? Não faz sentido!
Respirei fundo, eu entendia totalmente sua raiva, eu já havia passado por aquilo, mas havia aprendido a confiar em Deus.
-Eu pedi para Deus guarda-lo. Às vezes, se Malom não tivesse bebido tanto que não conseguiu se mexer, sabe se lá Deus aonde ele estaria agora? Talvez em uma biqueira, assaltando alguma loja, se prostituindo? -Respirei fundo. -Confiar em Deus, Rute é enxerga-Lo nos pequenos detalhes.
Rute ficou em silêncio e eu esperava de verdade que ela havia entendido o que eu havia falado.