Deus, você e eu.

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Dezenove anos depois...

O tempo passou, para vocês podem parecer muito tempo, mas para mim foi como se passasse voando.

Um dia eu tinha meus dois filhos em meus braços dependendo inteiramente de mim, e agora eu tinha dois rapazes, cursando faculdade de Administração e prontos para assumir o lugar do pai na empresa. Malom e Quiliom eram muito unidos, aonde um estava o outro também estaria.

Eu e Eli tínhamos plena consciência de que havíamos criado nossos filhos perfeitamente bem. Nossos exemplos e atitudes eram visíveis e até o momento que tínhamos poder o levamos para a Igreja.

Mas as pessoas crescem e cada um tem seu poder de escolha. Como mãe eu via as atitudes dos dois rapazes, e por mais que eles frequentassem a igreja, fossem batizado nas águas, eu duvidava que tinham um real encontro com Deus.

Eu não estou julgando os meus filhos, mas suas atitudes e reações a problemas não eram simplesmente falta de sabedoria ou imaturidade. Era sua velha criatura e uma hora ou outra se eles não matassem, a velha criatura os mataria.

Foi assim comigo, foi assim com Eli, era assim com eles e talvez esteja sendo assim com você que está lendo. Por mais que tenham sido criado na igreja, se nós não nascermos de novo, não podemos entrar nos céus. Jesus foi bem claro quando explicou isso para Nicodemos para que não restasse nenhuma dúvida.

Para sermos filho dEle, devemos ser gerados do Espírito Santo.

E por mais que alguém tente mostrar o que não é, uma hora ou outra sempre mostramos o que tem dentro de verdade.

Sabe essa dificuldade que você está passando? Não é ela que importa, mas sim a sua reação.

Pois a boca fala do que está cheio o coração.

Era terça-feira, dia de folga de Eli quando percebi que algo estava errado. Havíamos acabado de voltar de algumas visitas que havíamos feito para alguns membros de nossa igreja. Estava frio e o rosto de Eli estava vermelho. Perguntei algumas vezes se ele estava bem, mas meu marido só balançava a cabeça afirmando, até que uma leve tontura passou por ele e Eli se encostou na parede para não perder o equilíbrio.

-Eli, o que está acontecendo? -Perguntei preocupada, a tarde inteira ele estava se sentindo assim.

-Nada, minha visão só escureceu... -Ele tentou sorrir, mas apenas metade do seu lábio se moveu para cima.

Quando eu vi, já era tarde Eli teve paralisia cerebral na minha frente e quando dei por mim já estava no hospital sentada esperando alguma notícia dos médicos.

Minhas mãos tremiam, mas tentava manter o melhor controle possível.

Fechei os olhos e comecei a orar silenciosamente.

-Mãe! -Malom e Quiliom entraram correndo e vieram me abraçar. -Cadê o papai?

-Ele ainda não pode receber visitas...

-Como não? Eu quero ver meu pai! -Malom gritou.

Ambos estavam desesperados e eu em vão os tentava acalmar. Até que a médica apareceu e nós três olhamos ansiosos para ela:

-O estado do seu marido é grave. -Ela falou sem delongas. -Ele teve um Derrame Cerebral do tipo hemorrágico, onde um dos vasos sanguíneos cerebrais é rompido. Esses casos são difíceis de acontecer, apenas quinze por cento da população é atingida, principalmente do sexo masculino.

-Mas como isso pode acontecer? -Quiliom perguntou. -Meu pai ainda era um homem jovem!

-Insuficiência cardíaca.

-Ele vai ficar bem? -Foi a minha vez de perguntar.

-O AVC foi muito forte e preciso que a senhora me acompanhe para vê-lo.

-Nós iremos poder vê-lo também? -Quiliom perguntou.

-Depois, seu pai deseja ver sua mãe.

Acompanhei deixando meus dois para trás, entrei na sala e Eli estava deitado com uma máscara de oxigênio em sua boca.

-Talvez seja difícil para a senhora entender o que ele está dizendo, Eli perdeu muitos movimentos, como eu disse para a senhora o caso dele é muito grave.

-Acha que ele vai ficar bem?

-Seria muita sorte se ele sobrevivesse.

Acenei com a cabeça e a moça se retirou dizendo que eu poderia chama-la para qualquer coisa que eu precisasse.

Me aproximei da cama e os olhos de Eli se abriram com dificuldade, mesmo não se mexendo eu sabia que ele estava sorrindo ao me ver.

-Oi. -Me sentei na cadeira ao lado. -Você me assustou... -Sussurrei, mas eu ainda estava assustada. Foi impossível ver Eli naquela situação e não chorar.

Um de seus dedos se mexeu e eu segurei sua mão. Senti um leve aperto e vi como sentiria falta daquilo. Na verdade, eu sentiria falta de todo o resto de Eli.

-A médica disse que talvez você não fique até amanhã... -Falei entre os soluços. -O que eu vou fazer sem você?

Ele deu mais um aperto como se dissesse, você é forte, vai saber se virar.

-Mas não posso ficar sem você.

-Sal... Ão. -Ele balbuciou com dificuldade.

-Salão? -Ele mexeu as sobrancelhas. -Salsão? -Ele parecia até desapontado comigo.

-Sal... A... Ão. -Ele falou e fez uma careta como se algo doesse.

-Salvação! -Falei e bati a mão na minha testa. -Por favor, querido. Não se esforce. -Engoli em seco. -Eu entendi o que você quis dizer... Eu posso viver sem você, mas não sem a minha salvação.

Ele apertou minha mão novamente. Eli não tinha medo de morrer, pois sabia exatamente para onde sua alma iria. Ela estaria com Jesus, ele estava salvo.

Eu podia chorar, reclamar e resmungar, mas quem tinha todo o direito de fazer aquilo que era Eli, não estava. Estava tranquilo.

-Prometo que irei cuidar de tudo, dos nossos filhos, da empresa e principalmente de mim. -Sorri para ele. -Por mais que nós não vamos nos lembrar um do outro lá no céu, espero que mesmo sem te reconhecer, que Deus permita eu ficar pertinho de você. -Ele apertou meu dedo e uma lágrima escorreu pela sua bochecha. -Eu te amo, Eli. E sempre vou te amar.

Eu não sabia cantar, mas em meio as lágrimas e meu nariz certamente não ajudando comecei a sussurrar a música que havíamos escutado pela primeira vez juntos:

Hoje agradeci a Deus
Por me apresentar você
Em um momento onde eu não acreditava mais
Em belas histórias
Fez eu ver que o amor existe
E crer que é um alto monte
Em frente ao por do sol
É um horizonte em meio as nuvens
E crer que Ele é poderoso
Fazendo um alguém que chora
Não mais chorar de tristeza
Mas de felicidade
...
Te amo
Não posso esconder algo verdadeiro
Que veio de Deus
Podemos escrever uma nova história
Então vamos viver Deus, você e eu
...
Juntos por este caminho
Deus, você e eu

-Eu te amo. -Daquela vez, foi eu quem o beijei na testa.

Meu nome é NoemiOnde histórias criam vida. Descubra agora