Destemida temorosa

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Estou tentando levar as coisas de forma mais leve e ver os problemas por um outro ângulo, mas como é difícil. Uma tarefa dantesca, como, aparentemente, diria Augusto Cury.
Não é que eu goste de me vitimizar ou que ignore problemas muito maiores que as pessoas ao meu redor enfrentam (apesar de uma pessoa importante uma vez ter me dito para nunca compara a minha dor às dos outros).
O problema é que faço tempestades em pires de porcelana. Deixo tudo con elevado grau de entropia. Transformo qualquer coisinha em um motivo que justificaria a vida de jugunçagem de Diadorim.
Preciso me entender, eu acho. Fisicamente. Preciso saber porque sou como sou. Por que diabos luzes que piscam me fazem mal ou por que minhas mãos estão sempre machucadas.
E psicologicamente. Preciso entender porque meus pensamentos formam esse fluxo turbilhonar caótico, deixando ideias confusas aluvionais.
Sei que estou no caminho para ambas as coisas, mas é tudo tão lento! Em parte por minha culpa, que procrastino as coisas com medo do resultado. Em parte também por minha culpa, que gosto de respostas rápidas e exatas.
E a psicóloga sorri e diz que não posso me preocupar tanto. E eu concordo e continuo me preocupando por teimosia e por força do hábito.
E os exames dizem "normal". E eu continuo evitando luzes, álcool e festas por medo e por inabilidade social.
Não sei.
Sei, na verdade. Sei o que deveria fazer e as posturas mentais ativas que preciso tomar, mas é tão difícil!
Será que posso culpar a "educação bancária" pela minha dificuldade de ver criticamente minhas atitudes? Acho que não, eu me critico bastante, na verdade, mas deixo tudo no mundo sensível. Sou meu próprio Demiurgo, construindo um mundo de ilusões aterrorizante, mas seguro.
Tantos poemas sobre tanta coisa. Tanta vontade de fazer tanta coisa. Tão pouca coragem de pular.
Sinto falta da coragem.
Há uma árvore na esquina do estúdio de tatuagens. Sempre penso em subir nela. Sempre penso em furar o nariz. Nunca faço.
Há três homens que moram em frente ao banco. Sempre dou bom dia, mas nunca perguntei o nome.
Há dois andares que me assustam. Sempre penso em ir lá. Ainda não consigo sozinha e sempre olho para todos os lados.
Estranho ter tanto medo, não acha? O fim é inevitável e as coisas simplesmente acontecem. Não acho que o universo tem um plano para mim, não sou tão pretenciosa, mas acredito que as coisas levam seu tempo para acontecer.
E aqui estou em em um paradoxo irritante: as coisas levam tempo, mas eu tenho pressa, seja porque quero resolver tudo rápido, seja por não saber quanto tempo eu tenho.
A vida é mesmo coisa perigosa, mas não sou Riobaldo o bastante para enfrentar isso. Quiçá eu seja Liesel, cheia de livros. Não. Eu não teria coragem de rouba-los. Ultimamente tenho tentado ser Polyana, mas o jogo do contente é complexo.
Mas vai dar tudo certo, certo? E mesmo que não dê, não é como se fosse o fim. Sequer o fim é o fim. A vida continua. Sempre e sempre e sempre.
Ando dançando e cantando pelas ruas dessa cidade cinza. Por hora, é meu pequeno grande ato de bravura e rebeldia.

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