Capítulo 2

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A partir dos 17 anos do menino, Vincent tomou seus treinos. Ele chegava da escola e era levado para um galpão onde seu pai dizia treiná-lo para os mais impossíveis casos, quando, na verdade, não queria admitir que aquilo era tortura. Um profissional diferente o treinava todos os dias. Facas, tchacos, tiro ao alvo, fogo... Vez ou outra Ian chegava na escola com uma cicatriz ou queimadura diferente. Não chegou a ter uma infância, foi arrastado à força pelo tempo, obrigatoriamente se tornando homem ainda garoto e involuntariamente deixando de aproveitar sua vida.

— Quer ir para minha casa hoje? Posso cuidar dos seus machucados se você quiser. - Disse Keira com um sorriso de canto, a colega de sala por quem Ian tinha uma queda.

Era óbvio que ele queria, mais do que voltar para casa e ser torturado pelo pai o resto do dia. Mas, se isso acontecesse, Vincent o proibiria de ver a menina, como fizera outras vezes.

— Não posso. - Respondeu, em seu tom mais pesaroso possível. - Tenho treino à tarde. Mas domingo não faço nada e... eu adoraria sair com você.

Keira levou sua mochila ao ombro e sorriu, se Ian não prestasse tanta atenção na menina, não teria reparado que ela assentira.

Ian cresceu um menino peculiar, por não ser tailandês possuía uma beleza estrangeira que fazia as garotas suspirarem. Mas era tímido demais para puxar assunto, ou para ter amigos. Além da timidez, tinha medo que seu pai os afastasse, acabou se tornando solitário. Isso não era problema para ele, não era diferente do que estava acostumado.

Ele esperou ansioso por aquele dia. O tempo parecia passar mais rápido e mais lento ao mesmo tempo. Quando despertou no domingo, quase caiu da cama.

— Aonde vai com tanta pressa? - Perguntou Vincent quando o viu usando roupas que nunca usava aos domingos e de cabelos penteados.

— Ahn... Vou à livraria. Preciso de alguns livros para a escola.

— Hoje é domingo. Está fechado. Me dê os nomes que eu compro amanhã.

— Não, pai. Tem uma livraria aberta no centro, preciso deles para amanhã.

Não contente, Vincent permitiu. Nada de mal aconteceria e ele não queria prender o menino ou excluí-lo da humanidade.

— Como você consegue tantos ferimentos? - Keira perguntou a caminho de uma feira no centro, onde realmente havia uma livraria aberta entre as bancas, e o show de uma banda local tocava ao fundo no palco principal.

— Meu treino é bem pesado.

— Talvez não devesse pegar tão pesado. - Ela passou a mão pela cicatriz em seu ombro com uma expressão de dor, que imaginou ele ter sentido quando aquilo foi feito. - Você se dedica bastante pelo que vejo. Para quê?

— Meu pai diz que tenho uma missão. Ele me obrigava quando eu era menor, mas hoje eu até gosto de treinar. Claro, eu gostaria que ele pegasse um pouco leve. - Levantou os ombros querendo deixar esse assunto de lado.

— O que você luta?

— Uma mistura de Krav Maga com Muay Thai e resistência à tortura chinesa. - Respondeu, rindo como se fosse engraçado.

— Isso é horrível, Ian. Não ria.

— Mas eu gosto.

Eles assistiram ao show sentados na grama. Keira acendeu um cigarro, o oferecendo um em seguida. Ian negou, sempre ouvira de seu pai que aquilo prejudicaria seu desenvolvimento.

— Isso vai lhe ajudar a relaxar. - Ela colocou seu cigarro aceso entre os lábios dele.

Se, saber o que fazer, Ian deu uma forte tragada, tossindo algumas vezes pelo engasgar e a arrancando uma risada.

O Fim Do InvernoOnde histórias criam vida. Descubra agora