Capítulo 36

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Apesar de ainda mancar, Ian já sentia-se melhor ao fim da semana seguinte. Vez ou outra, a Doutora o visitava para checar se ele fazia os curativos corretamente, mas sempre estavam mal feitos e prontos para inflamar. Insistiu para que ele permanecesse no motel pelo menos mais uma semana, até seu pé melhorar e as feridas cicatrizarem, mas, teimoso do jeito que era, foi complicado convencê-lo. Alana já conhecia o ponto fraco do rapaz e não hesitou em mencionar Angelina para que ele sossegasse.

Até então, Ian já havia feito amizade com todos os funcionários do lugar. Sua comida vinha mais rápido e saborosa e a limpeza de seu quarto era bem caprichada.

Sua estadia parecia nunca chegar ao fim, diferente de seu terceiro maço de cigarros, que terminou no meio de uma quarta-feira.

— Me deixe ser livre, eu imploro. - Ele resmungava para Alana, exagerando em seu drama. - Se eles vierem atrás de mim, eu acabarei com a raça deles, assim como planejam fazer comigo. Não há com o que se preocupar.

— Você não vai acabar com a raça de ninguém. Conheço Rupert desde os meus 19 anos, você não vai matá-lo. Pare com esses pensamentos doentios.

— Você não viu o que ele fez comigo. É motivo o suficiente para o matar. Eu ainda nem estou querendo torturá-lo como fez comigo. Só quero cortar a garganta dele ou enfiar uma bala em seu crânio. O mundo será um lugar melhor.

— Eu sei que ele deve ser preso por isso, não estou dizendo que ele está certo. Mas seu modo de buscar por justiça é pra lá de errado, Ian.

Ian não dava ouvido às opiniões da Doutora. Acabaria com o ruivo assim que visse sua fuça novamente.

As dores em seu tronco diminuíram, as mãos, ainda um pouco insensíveis ao tato, já não doíam, com exceção de um pequeno corte que adquiriu no dedão da mão direita por não parar quieto no quarto do motel. Enquanto a semana caminhava, o tédio tomava conta de seus dias e alguns exercícios abdominais dentro do quarto com músicas tocando no rádio o dia inteiro ainda não era o suficiente para lhe entreter. Ainda sentia uma pontada de dor algumas vezes no pé, mas já conseguia andar sem mancar.

O rapaz não passava uma noite sequer sem ligar para a filha antes de dormir, ambos faziam questão. Ouvir a voz da menina lhe dava esperança de que um dia tudo isso seria uma mera lembrança ruim e de que seria feliz com ela em outro lugar, bem longe da confusão que é sua vida e seu pai.

Na noite de sexta, ciente de que voltaria para casa assim que sábado amanhecesse, pediu uma garrafa de vinho no quarto. Sentia-se sozinho. Aquele lugar era bem triste e solitário quando não se ia para passar apenas uma noite com alguém.

Alô?

— Tá ocupada?

Não, acabei de chegar do hospital. Por quê? Alguém lhe encontrou? Está tudo bem?

— Não, então, é que... como... é que... Assim, eu pensei "vou beber", então, já que da última vez fui quase morto por causa disso, por que você não vem aqui me fazer companhia?

Alguns minutos de silêncio e a voz de Angie ecoou do fundo em uma conversa com Jaque. A respiração de Alana soou forte, como se estivesse cansada. Ian estava prestes a desistir para que ela tivesse um tempo para descansar, mas ela falou antes que ele abrisse a boca.

Ok, já estou saindo.

— Quando você disse "fazer companhia" eu pensei em apenas companhia.

— Não gosta de vinho, Doutora? - Ian despejava o vinho de uma garrafa suando de gelada num par de taças borgonhas.

— Gosto. - Respondeu com desdém. Ele lhe entregou uma taça e brindou brevemente antes de dar o primeiro gole. - Vinho num motel a essa hora... Até parece que somos um casal.

O Fim Do InvernoOnde histórias criam vida. Descubra agora