Capítulo 2

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Eu sentei na poltrona e me observei no grande espelho iluminado à minha frente. Na bancada havia uma camisa preta dos Misfits, uma banda de rock formada em Nova Jersey, estado onde Ray nasceu. Era óbvio que eu sabia tudo da vida dele. Eu acompanhava as notícias nos sites, assistia incansavelmente os vídeos de suas músicas no YouTube, e não pensei duas vezes quando soube que ele viria fazer um show em Chicago. Nada como ter um ex melhor amigo fera em informática. Quando Frank ainda não era "propriedade" de Ellen, ele falsificou uma identidade para eu ter acesso ao show. Eu sinceramente sentia falta do meu amigo, mas sabia que ele estava feliz com a nova vida. Não era mais um invisível como eu, agora ele fazia parte da turma dos populares do nosso colégio High Bowles. E eu verdadeiramente o entendia, afinal era o nosso último ano do ensino médio e todos queríamos a mesma coisa: que fosse um último ano memorável. E quão mais memorável poderia ser do que fazer parte do grupo dos populares?

Eu só lamentava por ele ter partido e eu... bom, eu continuava sendo a garota prodígio aos olhos do meu pai.

Mas não essa noite.
Essa noite eu seria finalmente vista.

Aproveitei toda a confusão pós show de seguranças, fãs alucinadas e dos assistentes da equipe para seguir sem ser vista pelo corredor, chegando ardilosamente ao camarim. E ali eu estava há mais de dez minutos. Tive medo dele não aparecer. Eu não fazia ideia de qual era a programação após o show. Não sabia se ele voltaria para o camarim ou iria embora direto. Porém eu tinha que tentar. Havia uma possibilidade mínima e eu me agarrei à ela.

Ainda observava algumas outras camisetas amontoadas quando a porta foi repentinamente aberta. Meu coração quase parou.

Ray James estava tirando a sua jaqueta de couro quando paralisou me olhando. Suas grossas sobrancelhas se uniram em um vinco na testa, e seus lábios ergueram sutilmente em um sorriso de canto de boca.

— Quem é você? — Sua pergunta me atingiu com a força devastadora de um tornado.

— Sua maior fã. — Respondi nervosa e o sorriso dele aumentou consideravelmente.

Ray terminou de tirar a jaqueta e empurrou a porta do camarim com o pé, a fechando atrás de si. Engoli em seco quando ele puxou a camisa que estava vestido estampada com o Ozzy Osbourne, a passando pela cabeça e bagunçando mais os cabelos, dando um aspecto ainda mais selvagem. Ele se aproximou de mim ficando à poucos centímetros e eu pude observar melhor o seu corpo, a pele clara levemente bronzeada pelo sol, com várias pintinhas marrons salpicadas no pescoço e nos ombros que formavam uma suave constelação. Seus braços eram fortes, mas não de forma exagerada. Notei também algumas tatuagens espalhadas aqui e ali.

Ray deu dois passos na minha direção exterminando com qualquer distância entre nós dois. Eu podia sentir o calor da pele dele emanar para a minha. Mergulhei em seus olhos azuis que mais pareciam com um oceano turbulento e profundo. Senti o perfume amadeirado dele me embriagar e notei que ele esquadrinhava meu rosto com certa curiosidade.

— Pode me dar a camiseta? — Pediu com sua voz rouca e eu sorri sem jeito.

Entreguei a camisa que estava segurando e ele rapidamente a vestiu. Quase reclamei por ele cobrir o mapa das estrelas que eu havia recém descoberto habitando em sua pele.

— Achei que você tentaria me expulsar. — Comentei e ele deu uma risada gostosa, passando a mão pelos cabelos, os jogando para trás. Eu adorava quando ele fazia isso.

— Você não é a primeira fã a invadir meu camarim.

— Provavelmente nem a última. — Repliquei e ele assentiu ainda com um ar de divertimento brincando em seus lábios rosados.

— Como você conseguiu passar pelos seguranças?

— Não posso te contar isso.

— Por que não?

— Porque pode estragar meus futuros esquemas. — Respondi e ele sorriu arqueando a sobrancelha.

— Pelo o que entendi você nem saiu daqui e já planeja invadir novamente? — Ironizou e eu dei de ombros.

— Você vai chamar a polícia para mim?

— Definitivamente não. Primeiro porque eu e a polícia não nos damos muito bem. Segundo porque jamais chamaria a polícia para tirar uma garota bonita do meu camarim.

Eu senti que iria me afogar nas ondas caóticas de seus olhos azuis. Precisava subir novamente à superfície e buscar urgentemente por ar. Desviei brevemente o olhar, sentindo um sorriso bobo se apossar da minha boca que ficara momentaneamente muda.

— Qual é o seu nome?

— April Denver.

— April. — Ele repetiu e eu senti cócegas acariciar o meu estômago. Jamais imaginei que gostaria tanto de ouvir meu nome quanto naquele momento. — Você é maior de idade, certo?

Eu segurei uma risada. Sabia da confusão que ele tinha se metido por ter sido pego beijando Samantha Benson.

— Sim. — Menti descaradamente e ele suspirou aliviado. Não era uma mentira tão grande se levasse em consideração que em quatro meses eu faria dezoito anos. Entretanto ainda assim era uma mentira.

— Perfeito.

— Por quê? — Questionei confusa e ele tirou uma mecha do meu cabelo louro, colocando atrás da minha orelha. As pontas de seus dedos deslizaram pela minha bochecha me causando um leve tremor.

— Porque podemos nos divertir um pouco essa noite. O que acha? — Propôs fazendo meu coração acelerar, me atirando sem colete salva vidas novamente ao seu mar particular.

— Eu acho uma ótima ideia. — Concordei determinada e ele me lançou um sorriso sugestivo.

Os dedos dele brincaram novamente com o meu cabelo, enquanto seu polegar tateava levemente o meu queixo. Ele olhou fixamente para os meus lábios e umedeceu os dele.

Eu podia sentir o meu interior arder em chamas. Nem nos meus melhores sonhos, nem nas minhas fantasias mais loucas acordada, meu ceticismo jamais me deixou imaginar que um dia beijaria o meu cantor favorito.

Ele segurou o meu rosto com as duas mãos e seus lábios roçaram levemente nos meus. Eu estava totalmente entregue à ele.

Depois Daquela NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora