Capítulo 10

15.9K 1.4K 81
                                    

Eu fiz e refiz a minha trança no cabelo cinco vezes diante do espelho. Não conseguia parar de pensar no fato de Ray ter simplesmente me abandonado naquele quarto de hotel. Óbvio que ele não me devia nenhuma explicação, porém nesse caso eu acho que merecia um mínimo de consideração.

Talvez eu estivesse superestimando a minha importância, mas eu simplesmente não conseguia conceber o fato de Ray não ter dado a miníma para como eu me sentiria. Não me conformava dele ter me usado como uma roupa que quando não mais lhe convém pode ser descartada, esquecida em um cabide no fundo do armário.

Peguei meu material e desci para tomar café. Entrei desanimada na cozinha e flagrei meu pai cantarolando, remexendo os quadris de um lado para o outro, enquanto mexia na frigideira sobre o fogão.

Sorri e sentei silenciosamente na cadeira, cruzei os braços sobre a mesa o observando. Meu pai tinha o humor sempre destoante da minha mãe. Enquanto ela levantava apenas depois das dez da manhã, e ostentava uma feição mal humorada que só melhorava parcialmente depois do almoço, o meu pai fazia questão de levantar cedo para preparar nosso café da manhã após suas corridas matinais.

— Bom dia, querida! — Ele falou sorrindo ao me ver. Pegou a frigideira colocando os seus famosos ovos mexidos nos nossos pratos, e me deu um beijo na testa. — Dormiu bem?

— Sim. E o senhor?

— Incrivelmente bem. Advinha quem terá uma entrevista hoje exclusiva para a BBC News? Uma dica: começa com seu e termina com pai. — Contou animado e eu ri servindo os nossos copos com o galão de suco de laranja concentrado.

— Que notícia maravilhosa! Meus parabéns, pai!

— Pode me parabenizar mesmo. Até porque logo logo o seu encrenqueiro favorito terá que desembolsar uma boa grana para o meu cliente. — Comentou orgulhoso e eu suspirei pesadamente.

Minha garganta pareceu sufocar ao ouvir a simples menção sobre Ray. Bebi um bom gole do suco em silêncio. Papai continuou cantarolando animado e eu forcei um sorriso.

— Logo seremos uma grande dupla. Eu um advogado implacável conhecido pela mídia, e você será a melhor cirurgiã que esse país irá conhecer. — Fantasiou e eu voltei a tomar um bom gole de suco.

Eu até tinha esquecido momentaneamente que meu pai tinha planejado o meu futuro. Eu sabia que ele não fazia por mal, apenas queria um futuro brilhante para mim. Eu também queria ter um bom futuro, entretanto eu só não tinha ainda nenhuma aspiração profissional. Não conseguia me decidir por uma carreira para me dedicar, mas ao mesmo tempo sabia de antemão que medicina não era uma opção.

Quando terminamos de tomar o nosso café meu pai me deixou de carro no colégio, mesmo sendo próximo ele fazia questão.

— Me deseje sorte! — Pediu ansioso e eu beijei o rosto dele.

— Seja implacável, pai! — Incentivei e ele sorriu animado.

Desci do carro e segui com outros alunos que entravam no High Bowles tão animados quanto eu. Segui para o meu armário e peguei minha apostila de história, indo para a sala antes mesmo do sinal bater. Sentei no meu lugar de sempre e deitei a cabeça sobre a carteira, deixando a minha mente vagar sem direção. Aos poucos os outros alunos chegaram e sentaram em seus devidos lugares.

Senhorita Carvoliva chegou pontual na sala com uma grossa pasta abraçada ao peito, ostentando um sorriso divertidamente diabólico nos lábios. Um sorriso que só poderia significar uma coisa:

— Bom dia, meus queridos! Hoje é um lindo dia para uma prova surpresa! — Anunciou e um murmúrio coletivo de lamento preencheu a sala.

Eu permaneci quieta, por mais que não amasse testes surpresas, gostava muito de desafios. E nada melhor para esquecer Ray, pelo menos por um instante, do que forçando meu cérebro a focar na adrenalina de me sair bem para uma prova que sequer estudei.

Senhorita Carvoliva era um pouco sádica e gostava de corrigir as provas na nossa presença. E o melhor, ou pior dependendo da situação, ela fazia questão de dizer nossas notas em alto e bom som.

— April Denver, sempre dedicada, tirou dez. — Senhorita Carvoliva elogiou e eu sorri timidamente. — Barry Campbell, sempre na corda bamba, cinco e meio. Brianna Lancelot. — Ela citou e suspirou com ar de desapontamento. — Dois vírgula sete.

A professora continuou falando e a maioria dos alunos ficaram abatidos por conta das notas baixas.

— Claro que Denver é sempre dedicada aos estudos. — Ellen Renée ironizou e eu a olhei interrogativa. — Vivendo sempre às margens do anonimato, estudar é tudo que lhe resta. — Concluiu disseminado baixas risadas, que exterminaram no exato momento em que a professora ergueu o olhar de reprovação do montante de provas. Frank cutucou nada discreto a namorada. — Só estou dizendo a verdade, querido.

Ele não falou nada. Eu também não esperava que ele dissesse, aliás, eu não estava esperando mais nada de ninguém.

Guardei meu material e assim que o primeiro tempo acabou segui rapidamente para a aula de cálculo. Peguei o celular para olhar as minhas redes sociais e me amaldiçoei mentalmente por não ter excluído as centenas páginas de fã clubes dedicados à ele.

Foi quando me deparei com a notícia que fez meu coração trepidar:

"Ray James assume namoro com Linz Witte, atriz da série Overlock."

Depois Daquela NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora