~Capítulo 03~

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Em Montemor

- Rodolfo, meu neto – chamo-o em voz firme.

- Minha vó. Algo lhe aflige? – pergunta ele preocupado. Tento esconder minhas aflições, mas não há disfarce para elas e logo se é acompanhada de uma agonia sentimental misturado com o amargo de saudades.

São poucos meses, não sei ao certo, em que meu neto Afonso abdica de sua nobreza para viver em meio a plebe. Um escandâlo majestoso, um vexame. Deuses! Isabel se estivesse viva, morreria em prantos ao desgosto da escolha do filho mais velho.

- A ausência absurda e vergonhosa de seu irmão – digo temendo as lágrimas que desceram.

- Minha vó, a senhora não pode ficar remoendo essa situação todos os dias – diz ele.

- Tem razão, meu neto. Preciso pensar em sua ascensão como Rei – digo-lhe e ele empalidece, aparentando estar passando mal – Está tudo bem, Rodolfo? Parece estar tendo um ataque.

- Vó, eu... eu não... – ele engole seco e gagueja.

- Desenrola, Rodolfo. Você o que? – me irrito, sendo até estúpida com meu neto.

Parecia temer me dizer a verdade. A dura verdade.

É evidente seu despreparo para subir ao trono e assumir o peso que traz a coroa de um Rei.

- Eu não posso. Esse lugar foi destinado a Afonso. Ele foi preparado para tudo isso, minha vó – diz ele e começa a expor o choro – Eu mal sabia escrever meu nome, enquanto Afonso já escrevia uma carta. Ele sempre foi o bom homem e cheio de qualidades. Eu sou só o Príncipe irresponsável e imaturo.

Ouvia cada palavra com aperto no coração. Rodolfo fora deixado para trás por tanto tempo, que não via o quão importante era pra ele tudo que ensinamos a Afonso. Via meu pequeno Rodolfo pedindo toda a atenção pra ele quando brincava de luta de espadas com o irmão, este último o deixando vencer para vê-lo feliz e correr pelos jardins. Que amarga é essa saudade da época feliz. Isabel era viva, mesmo andando triste com a morte prematura de seu marido, passava horas observando os filhos.

Acaricio o rosto do meu neto Rodolfo e aconchego seu semblante triste em um forte abraço. Meu pequeno príncipe e neto amado. Como ser tola em deixá-lo para trás?

- Perdoe-me, meu neto. Sou uma péssima tutora e avó por isso – digo e beijo sua bochecha – Estou velha e cansada. Eu já vivi muito. Perdi minha filha amada, a qual os dias passam e a saudade aperta. E seu irmão vai embora para Artena viver a vida como ferreiro e deixa tudo para trás. Espero que ele conheça alguém que o faça desconhecer a falta de juízo que teve.

- Minha vó, eu a amo muito. Não sabe como queria poder ter minha mãe conosco nesse momento – diz ele e sorrio fraco.

- Vamos, meu neto. Precisamos tratar das suas habilidades, para quando for a hora de assumir um cargo grande – digo e ele sorri.

Em Artena

Ainda estava confusa após acordar de um sono profundo e estranho. Parecia que faltava algo por ali e desconhecia o homem que dizia ser meu marido. Da onde o conhecia?

A sensação de mágoa batia forte em meu peito ao pensar tais situações, um sentimento de tristeza que me surpreendia ao olhar aquele rapaz jovem a minha frente e não conhecer.

- Filha – chama minha mãe.

- Oi mãe – respondo e ela se senta ao meu lado.

Tinha me afastado de casa para espairecer a mente dos ocorridos aos últimos minutos.

- Não há qualquer memória sobre Afonso, por menor que seja? – pergunta ela e vejo que se preocupa.

- Não. Mãe, como posso lembrar que alguém que não conheço? – falo, um pouco ríspida.

Minha mãe me repreende com o olhar de mágoa. Sentia que ela tinha uma admiração pelo... Afonso. Só desconhecia o motivo para tal sentimento.

- Amália, vocês se conheceram há um tempo e são casados. Porém, é inútil minhas palavras nesse momento – diz ela frustrada – Espero que essa... falta de consciência seja provisória. Fique bem, filha – beija minha testa e entra em casa.

Vejo Afonso se aproximar e parecia um tanto triste.

- Desejaria nesse momento ter o poder de trazer suas memórias de volta, mas isso não está ao meu alcance – diz ele engolindo seco – Só quero agradecer a hospitalidade que você e sua família me ofereceram. Você se esqueceu, mas me salvou de morrer no meio do desconhecido ferido por uma flecha. Portanto, serei sempre grato a você por isso.

Perdi as palavras no momento em que ele termina de falar comigo. A única reação que teve foi de apoiar as mãos em seu ombro e sorri educada. Não me lembrava de tê-lo salvo de nada.

- Não me lembro, mas fico feliz com sua gratidão. E minha família também – digo e ele sorri de canto.

- Vou para o castelo de Artena. Trabalharei lá como Conselheiro do Rei – diz ele e pega minha mão, beijando-a em seguida. Aquele toque me fez ficar surpresa e emocionada. Tão cavalheiro e simpático – Adeus, Amália.

Ele sai em direção ao seu cavalo e o vejo partir em direção ao seu destino. A sensação de dor se fez presente, me dando a estranha sensação de abandono e resolvi ignorar voltando aos meus afazeres.

Você Pertence a MimOnde histórias criam vida. Descubra agora