~Capítulo 31~

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Povoado de Artena

Amália estava sentada em sua humilde cama e repensava milhares de vezes tudo que ouviu antes. Já não chorava mais, pois já havia gastado sua cota de lágrimas. Nada ela falava, apenas fechava os olhos e tentar se desenganar de toda aquela confusão.

Ao menos, a "culpa" era sua companheira naquele momento. Talvez teria ela sido mais esperta em ver nas histórias mentirosas de Virgílio ou ter percebido a repentina falta de memória. E como ela poderia ter culpa? Como iria perceber?

O som da batida na madeira que compunha uma porta interrompe seus pensamentos. Era Constância, sua mãe.

- Filha, seu irmão e Diana estão preocupados com você. Vamos conversar – pede a boa senhora.

- Mamãe, eu não sei se quero ouvir tudo que tenham a me contar – diz ela.

- Amália, a verdade é dolorida e angustiante. Não é fácil de ouvir, porém rir com a mentira é pior – aconselha Constância e pega na mão da filha – Vamos. Você precisa saber de toda a verdade, por mais difícil que seja.

Amália balança a cabeça e segura na mão da mãe. Elas duas saem do quarto e se deparam com Diana, Tiago, Martinho e surpreendidos com a presença também de um convidado surpreendente.

- Papai, quem é este homem? – pergunta Amália.

- Amália, este é Constantino, Duque de Vicenza – Martinho responde também sem jeito com a presença do cavalheiro – Ele viveu um tempo no Castelo de Artena. E quando retornou, ouviu os mesmos burburinhos que você pelo povoado. Por este motivo, ele apareceu por aqui.

Amália balança a cabeça, já anestesiada de tudo que estava para ser jogado na mesa e indica um lugar para que Constantino se sente.

Diana e Tiago continuam calados, estando na mesma posição desde o momento que chegaram ali.

- Papai, mamãe e todos aqui presentes. Vamos logo ao início disso tudo – pede ela sem muito ânimo por aquilo.

- Minha filha, Tiago foi até o Castelo quando ouviu as notícias e conseguiu conversar um pouco com Afonso. Foi naquele dia em que você começava a ter lapsos de memória e pedimos que ele fosse até lá – diz Martinho – O príncipe confirmou os fatos e prometeu vir conversar pessoalmente contigo.

- Ele disse, minha irmã. Inclusive, vi verdades em seus olhos e palavras – diz Tiago – Afonso disse que jamais brincaria desse jeito com você. E então foi para Montemor, tentar organizar melhor seus pensamentos e retornaria com o intuito de conversar brandamente contigo

Amália ouvia e não esboçava nenhuma reação. Mas aí desviou o olhar a Constantino.

- E vossa alteza? – pergunta ela.

- Senhorita Amália, eu nem sei como explico toda a situação. Eu e Catarina tivemos uma paixão, mas passou e eu lembro quando Afonso chegou ao Castelo – diz o duque – Rei Augusto o trata como filho e aos poucos, a princesa foi se aproximando e aonde começaram a se envolver. O ponto disso tudo não sei ao certo, porque parti de volta as minhas origens e aí só voltei hoje. Aonde...

- Ouviu todo o povoado e veio confirmar que Afonso e Catarina são os nobres apaixonados – diz ela interrompendo o duque.

- Amália, estamos todos com você – consola Diana – Esse negócio de nobre com nobre, não é algo grave. O que mais nos preocupa é te manter dentro de toda a verdade. Nós sabemos de parte da história, porém existem lacunas que somente Afonso pode preencher. Ele é quem deve te contar tudo.

Amália deixa as lágrimas caírem e respira fundo.

- As verdades estão sendo colocadas por quem não se chama Afonso, Diana. Esse quebra cabeça está sendo montado por todos que viram e suspeitam de há algo entre os dois - desabafa ela – Afonso não deve ser julgado e nem exposto, pois ele não está errado em nada. Apenas seguiu em frente, porque a boa esposa apaixonada não lembrava dele e assim o seu lugar entre nós foi deixando de existir.

Constância sofre ao ver filha agoniada. Todos ficam compadecidos pela dor que Amália sente ao jogar tudo aquilo pra fora.

- Minha filha, quando Afonso vier, procure ouvi-lo. Se ele disse a Tiago que irá preencher esses espaços na história, cumprirá com certeza.

- E cumprirei mesmo – diz aquela voz estrondosa e arrepiante – Fiquei sabendo de tudo, Amália. Vim aqui para nos acertarmos.

Todos se levantam surpresos com Afonso ali, coberto pela sua capa escura como a noite e Amália lhe devolve um olhar sofrido.



Reino de Brúnis

Elizabeth, chorava copiosamente ao saber que o enteado-filho havia cometido o deslize de ir até Lastrilha com planos tão malignos quanto uma epidemia da peste. Ela não entendia como um moço tão belo e jovem teria talento para tanta amargura, maldade e arrogância.

Ricardo havia se reservado na biblioteca, achando uma leitura que pudesse distrai-lo de tudo que acontecia embaixo do teto do pai. Henrique, aquele irmão mais velho que vez ou outra o protegia dos pesadelos da noite de insônia e o levava para brincar nos jardins do castelo.

Já Miguel, do outro lado da cama ouvia os soluços da esposa.

- Henrique não merece essas lágrimas, Liz. Ele fez a escolha dele, sem pensar na tragédia que vai tumultuar o reino em que nasceu e renega – esbraveja o Rei, segurando suas lágrimas.

Liz fecha os olhos e respira fundo. Era a hora de dizer tudo que havia guardado durante anos.

- Miguel, você é muito hipócrita. Um rei que se esconde na vitimização dos próprios atos, acaba por acreditar que nunca errou – esbraveja a rainha.

- Liz, você... – ele tenta dizer.

- Calado, que não terminei – interrompe ela – Henrique tinha razão ao esbravejar naquela tarde do chá que você só pensava em casar ele com qualquer princesa que fosse, assim então se veria livre dos possíveis problemas que ele causaria. Nosso filho Ricardo foi criado com tanto amor, mimos e aprendeu boas ações. Mas e Henrique? O que ele aprendeu?

- Não admito que vocifere meus atos como pai, pois amo meus filhos por igual. Henrique viveu aqui igual a Ricardo – rebate Miguel.

- Não, Miguel. Já chega. E pare de mentir para si mesmo – responde a rainha – Eu via a maneira pouco cerimoniosa com que rejeitava um abraço a Henrique, que era só um garotinho que sofria pela perda da mãe e de quando ele tentava chamar sua atenção. Sabe o que via? Um homem frio, sem ser capaz de olhar para o filho e se juntar a ele no modo de amenizar a dor um do outro. Todos sofreram e sofrem. Há dias atrás, foste capaz de apontar uma espada ao pescoço de seu próprio filho. Miguel, você deveria ser um espelho a ele e não o fundo do poço.

- Liz...

- Não. Olha só no que seus erros como pai foram capazes de fazer a Henrique – ela abre o coração aos prantos – o menino que criei, meu menino. Ele só precisava de uma mãe para ama-lo, um pai pra se espelhar e uma família em pé. E a realidade foi outra, Miguel. Há algumas noites você se levantou da cama e chamou por Maya, sua falecida esposa e grande amor de sua vida. Nunca a esqueceste e nem haverá de esquecer. Mas agora repense no sofrimento que amargurou o coração de seu filho. Ele foi traído e debochado pela primeira noiva, no qual gostava, e trouxe toda essa raiva a tentativa de aliança com princesa Catarina, fazendo um ato perverso a ela. Olha só no que seu reinado está se transformando.

Miguel ouve calado nodesabafo de sua esposa, tentando digerir no que cada palavra dita golpearam asua mente. Errara tanto assim? 

Você Pertence a MimOnde histórias criam vida. Descubra agora