Capítulo 15

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Estevão olhou para o relógio na parede, faltavam pouco para as 10:00 h, Ana ainda não descera.

Estava claro que ela o evitava.

Estevão respirou fundo buscando conter o próprio descontentamento e depois distendeu os ombros, um ritual a se repetir sempre que tinha vontade de explodir o mundo, esse era um daqueles dias. Não havia dormido a noite, estava furioso com si mesmo, havia perdido o controle de suas próprias emoções, um homem, e uma mulher, podem sentir desejo por qualquer outrem, mas se permitir estava bem longe de ter alguma coisa haver com isso, por isso é que os homens são racionais. Se saíssemos por ai trocando favores sexuais com toda paixonite que encontramos nas esquinas, o mundo seria uma orgia global.

Desejo. Sentia isso por Ana, desejo. Sentia-se miserável por isso, mas a verdade é que ela despertava coisas nele que tinham pouco haver com amor. Amor era uma coisa difícil, difícil demais para ser sentido duas vezes em uma única vida, e isso também era difícil. Um casamento sem conjunção carnal propora isso a Ana, não era uma proposta, era uma condição. Uma condição doentia, quando em um arranjo social onde duas pessoas convivem uma ao lado da outra por anos a fio daria certo sem um toque? Ou melhor, como poderiam evitar uma hora ou outra que esse desejo nascesse? Não podiam. Uma proposta fadada ao fracasso, não a proposta para ele, mas o arranjo em si.

Enquanto houvesse razão, ou loucura, não sabia ao certo, dentro de si, não tocaria em Ana. Não porque seria uma farsa. O que Ana sentia por ele não era apenas desejo, desejo também, mas não só desejo; sabia disso sem precisar ouvir dela, uma pessoa que já amou reconhece quando a outra ama, mas com o que pagaria a ela? Com a satisfação de seus próprios desejos? Tê-la em sua cama era uma coisa que povoava sempre os seus pensamentos a algum tempo, mas conhecia bem a si mesmo para ignorar o fato de que depois disso a sua cama seria para sempre o repouso dela até o ultimo dia da sua vida, e com direito, Ana não era uma prostituta a quem podia dispensar no outro dia, era a sua esposa, ela tinha esse direito agora, renegado é claro, por comum acordo, e essa vida ele não saberia fingir, nem desejava fingir então calava o desejo ante a razão.

_Com cuidado_ Estevão ouviu Ana dizer, daí a instantes ela surgiu trazendo Meanda pela mão, Estevão havia esquecido completamente a existência da menina, estava estampado no rosto de Ana a surpresa que era vê-lo ainda por ali, havia postergado descer com o exato intuito de não encontra-lo, Miguel Estevão era a última pessoa que gostaria de ver naquela manhã; em silencio Ana se sentou e acomodou a criança em seu colo.

_Dalva!_ Estevão chamou em voz alta, Ana franziu a testa ao olhar para ele, Dalva não tardou a aparecer, esbaforida como de costume, sempre pensando que falhara em algo._ Leve a criança daqui. ¬_ Ele ordenou, Ana arregalou os olhos de surpresa e insegurança, mas não relutou em entregar a menina à empregada que se retirou sem questionar, um pesado silencio caiu entre os dois, Estevão parecia considerar alguma coisa em silencio, Ana por sua vez procurava não encara-lo, já tinha tido sua cota de decepções por aqueles dias, precisava de paz.

_Não poderemos ficar com ela._ as palavras de Estevão saíram calmas e claras contrastando com o seu interior, Meanda era um laço que eles não precisavam criar, Ana ouviu em silencio e em silencio as sentiu se propagando pelo seu corpo, Estevão empertigou o seu corpo, o silencio de Ana era mais cortante do que mil laminas, ela devia ter dito alguma coisa, um sim ou um não, o silencio era pior, e então se voltando para ela dessa vez, Estevão criou coragem e estendendo os braços, tocou as mãos dela com as suas; Ana olhava para ele agora¬_ Ana... _ E a encarou procurando as palavras certas enquanto emoldurava as mãos dela entre as suas_ sobre... Sobre o que aconteceu ontem, não foi em uma boa hora...

¬_ Eu entendo_ Ana disse fazendo suas mãos deslizar se livrando das deles sem conseguir disfarçar o incomodo que a presença dele lhe causava, Estevão a observou em silencio com o rosto contraído, de repente tudo que planejara dizer havia se evaporado como se fosse impossível encontrar as palavras certas.

Os Estevãos (Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora