Capítulo 16

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Assim que Ana e Estevão pisaram na sala, muitas cabeças se voltaram para eles, alguns dos rostos Ana não via dês de há muito

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Assim que Ana e Estevão pisaram na sala, muitas cabeças se voltaram para eles, alguns dos rostos Ana não via dês de há muito. Era bom estar de volta.
Era Ano novo, 1892.
Os Amarais não haviam poupado esforços como sempre, a decoração estava impecável, Ana suspirou sentindo o aroma das rosas que desciam como cataratas em filetes pelas paredes, haviam trazido uma orquestra naquele ano, as mesas espalhadas de espaço a espaço pelos salões da grandiosa mansão ostentavam os mais caros e apreciados vinhos importados da França, os doces do buffet  também não eram receitas simples, os canapés eram uma imagem dos paraíso de encher os olhos, as toalhas brancas com as quais as mesas eram forradas dava um charme aristocrático a todo o resto da combinação.
_Isso parece um paraíso._ Ana disse aos ouvidos de Estevão.
_Para mim é um incrível desperdício de dinheiro. Acha que a metade dos que estão aqui se importam com eles?
_ Seu eu tivesse dinheiro faria o mesmo, para mostrar que posso._ Ana retrucou fazendo Estevão sorrir achando graça.
_Ana, querida!_ exclamou Beatriz indo até a amiga, Estevão a cumprimentou e se esquivou indo ao encontro de seus amigos._ A tenho visto tão pouco, se permita sair um pouco mais daquela casa.
_Tenho estado ocupada em muitos serviços_ ela respondeu enquanto Beatriz a guiava até o sofá.
_Já desisti de entender os Estevãos._ disse  sorrindo, Joana e Catarina vieram se juntar a elas, eram amigas de Beatriz de longa data, pelo visto aquele devia ser seu novo grupo de colegas, pensou Ana enquanto erguia as sobrancelhas.
_Mas então querida? Quando pretende dar um herdeiro ao sobrenome dos Estevãos?_ Indagou Catarina depois de alguns assuntos triviais, Ana se erubesceu, Beatriz a mirou também curiosa.
_ Não tão cedo_ ela disse sem conseguir esconder o nervosismo na voz.
_ E pelo que pude ver Ana já é mãe, de coração._ socorreu Beatriz, Ana sorriu sentindo-se agradecida, nunca havia pensado daquela forma, mas sim, era como se Meanda fosse sua.
_Não conta._ Disse Catarina com desdém_ não é a mesma coisa que gerar uma criança no ventre, ter o sangue do pai correndo nas veias. A maior glória de uma mulher consiste em dar um filho ao seu marido_ Ana franziu a testa sentindo asco do que fora obrigada a acabar de ouvir, não era possível que as pessoas só conseguissem enxergar apenas uma coisa como certa.
_Me desculpa, mas creio que há pessoas que pensam diferente. _ ela rebateu com cuidado, não queria ser a causa de novas desavenças, estava cultivando a pouca paz que aqueles dias lhe dera.
_Ha sim! Como por exemplo, essa necessidade boba de instruir os filhos dos camponeses?_ Indagou Catarina levando a taça que tinha em mãos até a boca, Ana engoliu em seco, então era aquele o problema.

Estevão se juntou a Jacó e Flávio, Norberto estava ocupado demais fazendo a corte uma das gêmeas de Ângelo Gama, Jacó parecia fatigado, estava um tanto quanto calado naquela noite.
_Tem andado mais sumido que o normal Estevão._ Disse ele depois de escutar em silencio o irmão e o amigo conversarem longamente acerca de Meanda._ o casamento tem consumido suas energias?
_Meu casamento vai de vento em poupa_ ele respondeu achando graça de sua própria mentira enquanto suplicava em silencio para que ninguém passasse por algo parecido._ e você quando casa com sua misteriosa Queila?
_Se depender dela, talvez no dia 30 de fevereiro, mas acho mais provável que seja dia 0 de março, talvez ela queira marcar para dia de são nunca, quem sabe?_ ele disse com um sorriso irônico no rosto. Estevão franziu o cenho, aquilo parecia demasiadamente estranho, se conseguisse falar sobre as coisas do coração poderia, talvez, ajuda-lo, mas como o ajudaria quando o seu próprio coração estava esmagado entre a confusão que morava em seu peito? Calou-se.
_ Estevão!_ exclamou Gregário se aproximando, vinha junto dele Ulisses e Francisco, Estevão revirou os olhos antes de cumprimentar o dono da casa.
_Eu não sabia que tinha coragem suficiente para aparecer em público  com o seu recente histórico, Senhor Estevão._ Alfinetou Ulisses que parecia se divertir à custa de qualquer intriga.
_Se o senhor sai normalmente, não vejo por que eu ficaria em casa._ Estevão devolveu com sarcasmo, Ulisses sorriu com dissimulação.
_Eu só espero que tenha tido o bom senso de ter vindo, pelo menos, sozinho_ ele disse olhando em volta, Estevão sabia o que ele queria dizer, uma mulher sempre será o demônio de toda e quaisquer situação, Ana agora era sua esposa e ele não excitaria em ataca-lo usando qualquer meio para conseguir, e ele estava usando Ana outra vez.
_Ela esta ali._ ele disse erguendo a taça para indicar o sofá onde Ana estava com Beatriz._ Linda e radiante como sempre._ Ulisses o fuzilou com o olhar, mas antes que pudesse começar novamente os seus ataques, Francisco foi mais rápido.
_Ouvi dizer que sua esposa irá dar aulas aos filhos dos camponeses, o que ela vai ensinar? Bons costumes?_ Estevão fechou as mãos em punho para conter a raiva que invadia os seus poros, Francisco Freisbener o irritava pelo simples fato de ainda estar respirando.
_Bem_ interrompe-os Jacó tomando a voz._ aproveitando que estamos entre amigos, gostaria de propor um brinde_ ele disse erguendo a taça que tinha em mãos._ Que nesse ano que se inicia, cada um de nós possamos cuidar das nossas próprias vidas e deixar as dos outros em paz, brindemos caros cavalheiros.
_Pelo fim da hipocrisia._ Emendou Estevão. Ulisses Valverde fuzilou Jacó com o olhar, estava claro que ele não esperava por aquele "brinde". Estevão e o amigo trocaram olhares cúmplices, depois disso se permitiu olhar em volta, e então percebeu Ana sozinha no sofá, ela tinha olhos marejados e olhava fixamente para um ponto da sala, Estevão gelou; e pensar que alguém fizera algum mal a ela foi a única coisa que conseguia pensar, mas seguindo os olhos de Ana, Estevão reconheceu D. Marlene a certa distância, ela caminhava em direção à filha, Ulisses percebera a atenção de Estevão e antes que a mulher pudesse chegar perto o suficiente ele se encaminhou diretamente até ela e a puxou dali com ódio, Estevão voltou o olhar para Ana, era o basta para que ela deixasse as lágrimas escaparem e as deixar fluir pelo rosto, com rapidez ela se levantou, e com a mão sobre a boca para abafar os soluços abriu caminho entre a multidão fugindo do burburinho da festa,  Estevão não excitou em ir atrás dela, mesmo que isso significasse deixar Gregário a falar com as nuvens.
Ana era ágil e esguia, se movia com rapidez por entre os presentes e em poucos segundos estava fora da casa, ainda arfando ela se recostou contra a parede e se encaminhou  para a penumbra dos pinheiros atrás dos quais se escondeu e finalmente deixou-se chorar o quanto queria, era libertador poder chorar, chorou por ela, chorou pela mãe, chorou por Marina, por Amália, chorou por tudo que havia acontecido até então. Havia visto a sua mãe, ela estava bem, pelo menos aparentemente, Ana puxou o ar com força e inspirou profundamente enquanto as lágrimas rolavam quentes pelo seu rosto. Estevão finalmente conseguiu se desvencilhar do turbilhão de gente e alcançou a porta, havia algumas pessoas no jardim da frente, a festa se espalhava pelo pátio, era quase impossível encontar alguém específico por ali, Estevão olhou em volta procurando-a, quando não a encontrou virou-se para retornar ao salão e pedir ajuda a alguém para encontra-la, mas então a notou, Ana havia se refugiado detrás dos arbustos e se recostava a parede como se precisasse de proteção, com cautela Estevão se aproximou e a  tocou de leva na sua cintura, Ana se retraiu assustada.
_Sou eu._ ele disse para acalma-la, Ana se atirou em seu pescoço e o abraçou com força deixando as lágrimas fluírem novamente, Estevão deixou que ela permanecesse ali até se acalmar outra vez.
_ Eu a vi Estevão!_ ela exclamou sem conseguir deixar de rir agora, um riso de alegria em meio à dor. Estevão a afastou de si segurando-a com firmeza, Ana estremeceu sob seu toque e de novo a mesma sensação de choque percorreu a sua espinha de auto a baixo e aquilo era demais para ela naquela noite, já estava demasiadamente perturbada.
_Ana, esta tudo bem?_ Ana limpou o rosto com a mão e fungou na tentativa de varrer qualquer vestígio do que lhe passava pela mente.
_Só me tira daqui._ ela disse depois de acenar positivamente.
_Claro, só tenho que falar com o Jacó sobre a carruagem..._ A carruagem de Redoma de Ouro estava outra vez quebrada e como só tinham uma e nenhum dinheiro para o concerto, dependiam inteiramente da amizade dos Bonifacio para sobreviverem ante a pequena elite do Vale do Pampa, era um favor precioso aquele de emprestar uma carruagem, entretanto Ana não fazia questão de tanto, era penoso para ela estar se quer um momento a mais sob o mesmo teto que Ulisses Valverde.
_Podemos ir a pé._ ela sugeriu o segurando pelo braço em uma prece, Estevão considerou por um momento.
_Se não se importa._ e estendeu o braço para ela. O caminho até Redoma de Ouro não era muito longo, os Amarais moravam relativamente perto, a noite era regida pelo frio e pelo chilrear dos grilos, a luz do luar iluminava a estrada sinuosa e estreita e estava garoando. Estevão estava calado, se perguntava quantas agruras lhe guardava aquele ano, quantas agruras a vida ainda lhe guardava, era um pensamento cinza para um dia de ano novo, mas o que pode pensar um homem que não tem nem ao menos sua própria carruagem?
Estevão suspirou, momentos de autopiedade eram odiáveis, mas eram necessários, não podia suportar o peso do atlas sobre as costas e acenar para o resto do universo a todo o momento como se nada estivesse acontecendo. Estava acontecendo, ainda que talvez jamais fosse admitir em voz alta, mas estava ruindo. Se sentia perdido no meio do caminho. Um pio de coruja ecoou ao longe na mata, Ana se sobressaltou e agarrou-se ao seu braço fazendo-o só então voltara prestar atenção nela que ainda chorava, Estevão se maldisse  internamente, nem sempre fora egoísta.
_Ana_ ele disse parando e fazendo-a parar_ esta tudo bem, esta tudo bem, nós daremos um jeito nisso, em pouco tempo, Ulisses Valverde não tem um monopólio sobre a vida da sua mãe, poderá vê-la em breve_ Ana suspirou de desatino se desvencilhando dele.
_Não tem um monopólio?_ ela indagou fingindo descrença_ Não me prometa o que não pode cumprir Estevão._  pediu, Estevão baixou as vistas, sabia que em parte era verdade_ por que isso_ ela continuou_ não esta ao seu alcance.
_Me perdoe_ Estevão repuxou os lábios_ Se digo é pelo muito que lhe quero... Bem, lhe quero bem._ A queria de muitas formas, bem era uma delas, das muitas umas até insanas. Estevão cerrou os punhos, a cada dia que passava as coisas dentro de si havia se amontoado ainda mais, havia alguma parte primitiva de seu ser que a queria desesperadamente, como um troféu ou consolação, mas ele era mais do que um homem insano e a sua parte racional ainda funcionava melhor que a selvagem, dava graças aos céus por isso. Ana se aproximou e ele deixou que ela o beijasse, deixou por que essa mesma parte irracional lhe dizia que precisava provar dos lábios dela outra vez e a sua parte racional concordava com a maciez dos lábios dela sobre os seus, Ana era uma fonte da qual ele queria beber até se saciar por completo, mas se contentava com o pouco que podia tomar dela, se contentava ansiosamente em provar do sabor de sua boca, ainda que sentisse por ela um emaranhado de coisas que lhe fazia ter vontade de tê-la sobre os seus joelhos por uma noite inteira, estava se tornando febril naquele exato momento, enquanto beijava Ana e seus pensamentos escapavam para longe, para uma realidade onde outra pessoa a amaria em sua primeira noite de amor. Estevão a segurou com força pela cintura e a trouxe para mais junto de si, Ana sentia os seus lábios quase dormentes, efeito da barba nascente de Estevão, sabia em seu íntimo que ele a desejava e sabia também que ele resistia. Por Salete. Por ele, por todos eles. Estavam vivendo em um círculo. Por mais que não quisesse pensar, essa sempre seria a verdade, Ana se afastou pouco a pouco enquanto ainda sentia os lábios dele sobre os seus. Afastar-se dele lhe era difícil, mas seria mais fácil do que alimentar falsas esperanças por mais algum tempo, Estevão a fitou confuso e nesse instante um relâmpago reluzente cortou o céu fazendo a atenção de ambos se voltarem para lá, só então ela notou que a garoa parecia mais forte agora, uma possível chuva se aproximava.
_Devemos ir._ ela disse tentando esquivar-se da difícil conversa que teriam se ela não agarrasse aquela oportunidade, Estevão comprimiu os lábios em uma linha fina e assentiu, Ana se pôs a frente disposta a andar depressa e deixa-lo para trás, mas antes que ela conseguisse ter sucesso em seu intento, Estevão a segurou firme pela mão e a manteve junto a si, só não conseguiu perceber o quão vermelha ela estava por causa da escuridão da noite.

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