Capítulo 20

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O vento tremulava acima fazendo as copas das árvores tremularem como um pendão, o barulho interrupto da água que gotejava na lagoa esverdeada ao lado, o som dos galhos sendo esmagado pelos passos de algum animal silvestre, o cheiro da terra, os raios de sol que se dispersavam por entre as folhas espeças da mata silenciosa. Era belo, acalentador. Era paz.

Ana fechou os olhos quando moveu a cabeça por um raio de sol e voltou a abri-los escutando o canto incansável dos colibris. Voltou a repousar a cabeça sobre o peito de Estevão.

_Estou feliz de estar aqui, com você._ Estevão abriu os olhos e encarou as folhas acima por um momento enquanto continuava a acariciar os cabelos dela, agora já de quase todo secos. Palavras. O silencio era tão melhor, conseguia dizer muito quando estava calado, mas quase nada quando abria a boca. Ana afastou-se dele, ainda permanecendo abraçada a ele e o fitou, Estevão a fitou de volta._ tudo bem._ ela disse depois colando a testa ao rosto de dele.

_Já fui muito bom com palavras._ Estêvão disse depois de um tempo, Ana guardou silencio._ Mas com o tempo aprendi que quanto menos falamos menos nos machucamos. Ana retraiu os lábios e se aninhou ainda mais junto dele. Não queria que nada estragasse aquela tarde mágica, nem mesmo a mais dura das verdades, se fosse preciso construir um mundo de mentira para sustentar pelo menos aquela tarde, ela estaria disposta a tentar. As mãos de Estevão acariciavam as costas de Ana com delicadeza e ela se determinou a apenas escutar o que ele tinha a dizer naquele silencio, mas descobriu que não era capaz de se resignar, não para sempre, e então o encarou.

_O que nós temos Estevão? É importante para mim._ Estevão a encarou por um segundo e então depois soergueu seu corpo junto ao dela deixando ambos sentados, ela de frente para ele.

_Está bem._ ele disse, Ana pensou em sorrir, mas vacilou._ Você é especial para mim, Ana. Mais do que especial, mais do que eu imaginei que seria_ Ana continuou a fita-lo._ Você é de alguma forma, o que achei que nunca teria. Eu achei que nunca poderia te amar, mas eu estava errado. Eu te amo agora, aqui. E talvez nós não tenhamos nada além de uma chance_ ele disse baixando os olhos para depois encara-la de volta_, mas se disser que me aceita dessa forma, nós podemos construir algo... Algo muito maior, sem os percalços de agora._ Ana abriu a boca para responder, mas ele a interrompeu._ Não!_ ele exclamou deixando-a atônita._ Na verdade, estou implorando essa chance. Quero uma vida de verdade Ana, e só você pode me dar isso._ Ana engoliu em seco, se as palavras sempre lhe eram fartas, se escassearam naquele momento, não existiam palavras que pudessem traduzir o que ela tinha a dizer.

_Eu te amo Estevão!_ ela exclamou se jogando nos braços dele, Estevão a aperto contra o peito, estava ficando acostumado com aquilo, será que Ana percebia que sempre o abraçava? Sempre, depois de um beijo, depois de meias palavras, depois de fazerem amor. O abraço era as palavras que ela não conseguia encontrar. E ele esperava que ela jamais fosse encontrar palavras se aquilo significasse que ela deixaria de abraça-lo.

No dia seguinte a carruagem se preparava para sair, Elenita, a empregada do Coronel Januário e Salete, aproveitariam a carona de volta, Salete havia ficado mais tempo do que o planejado, duas longas semanas haviam se passado dês de a chegada de Estevão a Corumbá, e ela já não aguentava mais os temores que quase sempre sobrevém a uma mãe longe da cria. Ana engolia o ciúmes, de inicio esteve quase sempre irascível, mas depois se controlara, não tinha por que estar com ciúmes, Salete fazia parte do passado de Estevão e não havia nada que ela pudesse fazer para mudar isso, se ela não se dispusesse a tolera-la por perto, estaria fazendo um desfavor a si mesma. Precisava cultivar nem que fosse um pouco de confiança, ou nada cresceria daquele solo. Escolheu ignorar os ciúmes e domar a própria insegurança.

A carruagem deixou a imagem de Ana no portão cada vez menor conforme se afastava. Estevão suspirou. Salete se entregara a leitura de um espesso volume de poesia e dona Elenita se atinha ao crochet, apenas as rodas da carruagem rugiam por sobre a estrada e os solavancos na medida em que saiam da cidade e adentravam os descampados longínquos rodeado de pastagens e plantações de soja a se perder de vista.

Os Estevãos (Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora