Um mês antes
Rayner
O dia amanheceu ameno, com pouca brisa e algumas nuvens. A neve terminara de derreter durante a noite, colorindo de verde as montanhas e campos que costumavam ser brancos. Alces selvagens pastavam na beira da água e muitas aves chegavam de migração para pescar e se reproduzir. Durante o verão Mowapiskat nem parecia ser o mesmo vilarejo.
Eu aproveitei o clima menos tortuoso e acordei bem cedo para caçar. Mesmo no verão a água da Baía de Hudson era escura e parada, mas o aumento da quantidade de peixes tornava a caçada por alimento bastante fácil. O problema eram as anêmonas-maniçoba. Horas já haviam se passado e eu só havia encontrado quatro.
Frustrado, eu me afastei do vilarejo até a parte mais afastada da baía, a ponto de sentir o tentador cheiro do oceano aberto. A Baía de Hudson era salina o bastante para preservar minha saúde, mas meus instintos imploravam por um mergulho de verdade no Oceano Ártico.
Não, eu não podia. Na verdade já havia me demorado demais, precisava voltar logo para a pousada. Duas anêmonas não serviriam pra nada, mas eu ainda precisava caçar um bom peixe.
Pelo menos a parte da caçada foi simples. Abanando rápido minha cauda de couro vermelho eu disparei em direção a um espadarte e o abati com uma dentada rápida na cabeça. Espadartes eram deliciosos e nutritivos, talvez um bom almoço compensasse pelas anêmonas a menos.
Eu voltei para a terra firme, vesti meu casaco de peles, as botas e voltei para a pousada, que deixara de ser uma choupana de madeira isolada no meio da neve para se tornar um popular restaurante no meio de um campo verde, onde ciscavam galinhas e gansos. Como ainda estava cedo não parecia haver clientes para o almoço.
"Bom dia, senhor Wolfgang." Eu cumprimentei o dono da pousada, um humano barbudo e grande como um alfa, que vestia camisa xadrez com o peito peludo à mostra, não importava a temperatura.
"Ah, Rayner, meu rapaz, que espadarte enorme! Vocês selkies tem talento pra achar esses bichos, hein." O senhor Wolfgang contornou o balcão para me ajudar com o bicho, embora o peso não fosse um problema pra mim.
"Como está o Rickett?" Eu perguntei, lhe entregando o peixe nos braços.
"Eu verifiquei o mocinho duas vezes, ele tá bem. Pediu uma lâmina de barbear, mais cedo." O senhor Wolfgang olhou satisfeito para o peixe fresco e o levou para a cozinha. "Nossa, os filés desta belezinha vão atrair clientes do Canadá inteiro. Qual pedaço devo preparar para vocês? Vão querer espetinhos, que nem ontem?"
"Como lhe der menos trabalho, senhor Wolfgang. Agradeço imensamente pela sua ajuda." Eu prestei uma breve reverência.
"Relaxe, rapaz, quem está em Mowapiskat está em casa. E eu também estou preocupado com o garoto, espero que melhore logo."
Eu sorri com amargor e fui para o quarto.
Quando abri a porta me surpreendi ao ver que Rickett não estava deitado, e sim sentado na beirada da cama, se olhando no espelho da porta do armário enquanto raspava as laterais da cabeça. Ele estava tão concentrado que demorou alguns segundos para me perceber ali. Quando enfim me viu ele abriu um largo sorriso.
"E aí, Rayner? Como foi de caçada?" Ele farejou o ar e lambeu os lábios. "Cheiro de espadarte. O almoço vai ser bom."
"Você deveria estar deitado, príncipe Rickett." Eu disse.
![](https://img.wattpad.com/cover/200912164-288-k904559.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Arauto da Destruição [AMOSTRA]
Roman d'amourAMOSTRA: 30% da história disponível. Leia completo na loja Kindle da Amazon! Dividido entre a normalidade de sua vida estudantil e a intensa, porém perigosa, jornada como Oráculo dos Tritões, Leviathan precisa tomar decisões que mudarão para sempre...