Capítulo 10

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Meu pai Yoshan era um tritão admirável. Desde o momento em que Rhomim surgiu ele o analisou silenciosamente buscando pistas sobre suas reais intenções. Para um bom Amalona a verdade se escondia longe do óbvio: normalmente quem ocultava um segredo ou mentia policiava a própria postura, buscava falar com firmeza e controlava a respiração para não levantar suspeitas, mas raramente cuidava da posição dos pés ou dos gestos das mãos, por exemplo.

Eu ouvi falar pouco sobre Rhomim Solveig, mas sabia que seu clã era um de baixa casta, o duque Theonor e seu núcleo eram os únicos deste clã com autorização para viver na superfície. Durante a primeira Grande Guerra a desobediência de um Solveig causou uma dramática derrota militar para os selkies, então era de se esperar que eles administrassem a menor e mais isolada região de Cratília.

"Hummm, nossa, este doce é uma benção ao meu paladar, Maron Trevally. É a minha primeira vez provando a culinária dos tritões e não estou decepcionado." Disse Rhomim, enquanto comia a minúsculas colheradas, realmente saboreando o momento.

"Ah, na verdade não é culinária de tritões, eu nem lembro muito bem se preparávamos comida em Tárnacos." Tio Maron recolheu as tacinhas, encabulado. "Por favor, fiquem à vontade, vou ajudar o Baltazar a colocar as crianças na cama."

"Gratidão pela sua hospitalidade." Disse Rhomim.

Maron voltou para dentro de casa. Ficamos na mesa do jardim apenas eu, meus pais e nosso enigmático visitante.

O filho do duque terminou seu doce e então desmanchou seu sorriso. O que podia ser observado a partir de seus gestos? Insegurança. Hesitação. Pressa. Desconforto. Tristeza. Preocupação. Após a análise era preciso interpretar os resultados.

Rhomim Solveig não deveria estar ali. Ele nos visitou em segredo, sabia estar cometendo uma transgressão. Mas quem o havia proibido, o seu predestinado? Não, um nobre requintado como ele jamais predestinaria com um alfa opressor.

Pelo olhar do papai Yoshan nós concluímos a verdade ao mesmo tempo: Rhomim Solveig estava ali desafiando as ordens do Duque de Byrr, seu próprio pai.

"Precisam que eu vá embora, também?" Eu perguntei, notando que todos permaneciam em silêncio.

"Não, de forma alguma, na verdade insisto que fique, Cinnamon Trevally." Rhomim cruzou a colher no pratinho limpo e percorreu o olhar por nós. "Quero saber de seu progresso quanto à busca pelo príncipe Rickett."

"O quê?" Papai Cordelen franziu a testa. "Certamente um nobre de sua estatura já foi informado da verdade. O príncipe Rickett foi executado por conspiração após invadir Faerynga."

"Conspiração?" Perguntou Rhomim.

"O Digníssimo Imperador Macalor, em sua infinita sabedoria, descobriu os planos de Rickett contra o império e o executou. Meu irm... quer dizer... o Tenente Zarkon também foi executado como parte da conspiração e o Príncipe Ronan encontra-se aprisionado pelo mesmo crime." Disse papa Cordelen.

Rhomim nos analisou por longos segundos e relaxou os ombros, soltando o ar com jeito de tédio.

"Aquele imperador psicótico assassinou o seu irmão e é esta a sua versão dos fatos, General? Para o audacioso tritão que coordenou a invasão de Egarikena eu esperava mais coragem."

Eu estremeci. Meus pais também nem respiravam, perplexos, certamente debatendo por telepatia as mil possíveis motivações para aquele ômega estar ali.

Era um espião do imperador? Do arquiduque? Por que estava nos encontrando em segredo, então? Seria uma conspiração contra nós? Um plano para incriminar os tritões renegados que viviam em Cratília? Também não, papai Cordelen ainda era essencial ao império. Mas o Imperador já provou não se importar com o bom senso.

O Arauto da Destruição [AMOSTRA]Onde histórias criam vida. Descubra agora