Cinnamon
As cadeiras do centro cirúrgico eram duras, mas eu controlei a ansiedade e me mantive quieto. Há tempos que eu só escutava os bipes dos aparelhos e o eventual tilintar de metais batendo. Meus tios estavam silenciosos demais dentro da sala de cirurgia.
Talvez eu já pudesse entrar? Quando eu cheguei e entrei direto na sala e a tia Babelyn quase me arremessou pra fora porque eu não estava vestindo trajes hospitalares. A memória do príncipe Rickett todo aberto e cheio de fios não deixaria a minha cabeça tão cedo.
Pensando bem, o príncipe Rickett foi mais um que nunca me interessou. Ele era apenas um ladrão que eu tive sucesso em capturar algumas vezes, mas o papai Cordelen sempre me mandava soltá-lo e então presenteava Rickett com caixas de biscoito ou algo que tivesse sobrado do nosso almoço. Só que diferente do Rayner o Rickett era um meliante revoltado e ingrato, no dia seguinte já estava roubando de novo, foi assim até o dia em que passou dos limites e papai Cordelen finalmente o aprisionou.
Será que meus pais previram que o batedor de carteiras viria a se tornar o herdeiro do trono? Impossível, mas ainda assim eles sempre sorriram para ele da mesma forma como sorriam para mim e para o Rayner. Era difícil entender.
Talvez os meus pais não tivessem perdido o senso de justiça, mas sim o seu senso de justiça fosse outro desde o começo.
Quanto mais eu pensava nisso mais eu me sentia humilhado, um fracasso, uma vergonhosa mancha no nobre clã Amalona. Que justiça poderia haver em ajudar órfãos miseráveis? Se os meus pais quisessem expandir o núcleo podiam simplesmente ter mais filhotes, nada os impedia.
A porta da sala cirúrgica abriu. Eu me levantei num salto.
"Como ele está?" Eu perguntei à tia Babelyn. Seu jaleco estava todo ensanguentado e ela parecia tão exausta.
"Conseguimos remover o ovo e controlar a hemorragia, mas as lesões internas são significativas, o paciente perdeu sangue demais. Ainda teremos horas de operação pela frente."
"O bebê vai ficar bem?"
Tia Babelyn não me ouviu, estava concentrada em vasculhar os bolsos do jaleco. Ela retirou um punhado de moedas e me entregou.
"Compre um lanche para a gente e para você também, ok? O Taimen não está acostumado com cirurgias tão extensas."
"Está bem."
Tia Babelyn voltou para a sala e fechou a porta. O aviso luminoso de em cirurgia permaneceu aceso.
Meu coração doeu. Minha tia estava desanimada demais, não era bom sinal.
Isto era mesmo tudo o que eu podia fazer? Comprar um lanche? Eu odiava ser apenas um filhote, eu odiava ser impotente, burro e inútil.
Eu deixei a sala de espera e fui até o saguão principal, me lembrava de ter visto uma lanchonete próxima e pelo cheiro eles deviam vender nuggets de peixe.
Quando cheguei ao saguão havia um conflito no balcão da recepcionista. Os seguranças haviam sido chamados e tentavam resolver a situação na base da conversa enquanto os pacientes em espera assistiam intrigados.
"A senhora não me escuta, preciso visitar um amigo." Disse o cara no centro do tumulto.
"Nós já entendemos, senhor, mas não pode entrar pelado nas dependências do hospital."
"Tenho uma canga, não está vendo? Aliás, por que preciso esconder o meu pênis se ele nem funciona ainda? É sério, deixa eu te mostrar."
"Steve, ligue para o setor psiquiátrico." A recepcionista disse a um segurança.
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O Arauto da Destruição [AMOSTRA]
RomanceAMOSTRA: 30% da história disponível. Leia completo na loja Kindle da Amazon! Dividido entre a normalidade de sua vida estudantil e a intensa, porém perigosa, jornada como Oráculo dos Tritões, Leviathan precisa tomar decisões que mudarão para sempre...