Jane adentra o seu quarto como um tornado, sentindo o corpo entorpecido novamente. Inicialmente, ela surpreendeu-se por Alec ainda não estar ali para vê-la, mas logo agradeceu por tal atraso, já que se sentia estranha e fora de si para conversar normalmente com o irmão.
Seu quarto não possuía muita mobília ou decoração, pois sempre considerou tais coisas uma grande perda de tempo para sua segunda vida, por isso, ela lançou sua capa em cima de sua solitária cadeira e aproximou-se de seu espelho, que era o único objeto pendurado em suas paredes.
Ela encara o próprio reflexo por alguns minutos, não conseguindo mais se reconhecer ali. O que era aquela testa franzida e aquele olhar confuso? Será que o seu rosto estava realmente daquele jeito? Será que mais alguém o via daquela forma, ou somente ela percebia a mudança?
Antes de Maximilian ser designado à liderança da guarda, ela lembrava-se de ter visto um rosto diferente naquele espelho, o rosto de uma vampira autoconfiante e soberba, que dava ordens e era prontamente obedecida, que fazia o que quisesse porque nenhum outro vampiro ousava desafiá-la sem pagar o preço de dor. Mas então o camaleão cruzou o seu caminho e tudo desandou.
Jane não reconhecia a vampira em seu espelho, pois nunca imaginou que pudesse esboçar outro semblante além de raiva e soberba. "Confusão" nomeou ela em pensamento, percebendo que o torpor em seu corpo também fazia parte desse pacote e que ela não fazia ideia do que fazer, agora que seu "mundo perfeito" estava ruindo ao seu redor.
Duas batidas na porta anunciam a chegada de Alec, o que repentinamente fez a vampira esfregar o rosto com força, tentando desfazer aquele semblante ridículo de sua face e assumir uma expressão mais neutra:
— Entre – permite ela, deixando que Alec entrasse em seu quarto com um enorme sorriso estampado nos lábios. – Que cara é essa? O que está aprontando? – questiona estreitando os olhos.
— Nada. – confessa, dando uma leve risada. – Ah, Jane, foi tão legal, você precisava ter me visto lá... Até mesmo Demetri ficou surpreso ao me ver lutar! – narra com evidente empolgação, referindo-se ao seu desempenho na missão com Maximilian e deixando claro que ele estava bastante feliz.
E enquanto Alec contava os detalhes de sua viagem, falando de como fora bem-sucedido em conciliar seus poderes e a luta corpo a corpo, Jane fechou o semblante em uma carranca, incomodada pelo irmão ter se saído tão bem sozinho, como se ele também não precisasse mais dela. Contudo, tudo o que saiu de sua boca foi:
— O que vejo em seu rosto é felicidade? – questiona, fazendo o sorriso do irmão murchar, porque ele sabia exatamente o que ela iria dizer. – O parabenizo pelas técnicas bem-sucedidas de combate, mas não fique feliz por algo tão tolo, isso o enfraquece!!!
— Desculpe – pede ele, ajeitando a coluna e desfazendo qualquer sinal de sua empolgação, como se ele estivesse realmente errado em senti-la.
— Tem algo mais a me contar sobre a missão?
— Somente que...
— Que o quê? – estimula ela, com uma pontada de impaciência.
— Eu senti a sua falta – admite, fazendo-a se sentir mal por imaginar que ele não precisasse dela. A vampira poderia pensar mal de qualquer vampiro sem sentir um pingo de culpa, mas ali, diante de Alec, ela sentia-se a maior das pecadoras por se atrever a pensar algo ruim dele.
— Alec, você é leal a mim? – questiona subitamente.
— É claro que sim, Jane, que tipo de pergunta é essa?
— Mesmo que o camaleão seja o líder da Guarda agora?
— É claro que sim, irmã! – responde irritado, incomodado que Jane pensasse o contrário dele. – Eu nunca a segui porque você era a líder... A segui porque você é minha irmã! Ninguém me entende como você, ninguém me conhece melhor do que você, você era sangue de meu sangue antes da transformação e continua sendo depois dela!
— Entendo – responde somente, subitamente se lembrando das palavras de Maximilian e se perguntando se aquilo queria dizer que Alec a amava.
— O que está acontecendo com você? – pergunta Alec, fazendo-a sair de seu devaneio e encarar o rosto surpreso do irmão.
Jane corre para a frente do espelho novamente, encontrando aquela expressão confusa em seu rosto outra vez, tendo a certeza de que não estava alucinando e que não era somente ela a vê-lo.
— Eu não sei. – responde somente, deixando que a incógnita de seu rosto se expressasse em palavras, mostrando que, pela primeira vez em sua segunda vida, ela não fazia ideia do que estava acontecendo.
Horas depois, quando toda a guarda já se reunia para o grande banquete, Jane fez uma nota mental de que ignoraria Maximilian naquela noite.
— Vamos jogar hoje? – pergunta Alec animado, encarando Jane momentaneamente enquanto a refeição adentrava o salão com animação, achando estar em uma excursão.
— Em outro momento – diz Jane, enxergando nos olhos escuros do irmão que ele estava sedento devido a viagem e a missão em que estivera, e que as pessoas eram escassas para aquele banquete. – Sacie sua sede por hora, depois pensamos no jogo.
Alec assente com a cabeça, concordando amistosamente com o plano e já escolhendo sua primeira vítima. Jane olha para os visitantes com igual objetivo, cheirando o ar e escolhendo a segunda melhor vítima dentre todos, para que o irmão ficasse com o que ambos considerariam o melhor, já que possuíam gostos parecidos.
Aro faz o seu discurso sobre o banquete assim que as portas do grande salão se fecham, e quando terminam, todos os vampiros saltam de seus lugares simultaneamente, fazendo um coral de gritos apavorados ecoar por todo o local.
Não haviam muitas pessoas naquele tour, e, em uma contagem rápida, Jane calculou que desse apenas uma presa para cada vampiro. Alec corre em direção a uma mulher negra com roupas chiques e perfume floral, afundando seus dentes em seu pescoço rapidamente, tamanha era a sua sede. Jane, por sua vez, pousou os olhos em cima de uma outra mulher, morena com uniforme escolar, provavelmente uma universitária que resolverá fazer um tour antes de sua aula, sem imaginar que aquele seria o último passeio de sua vida.
Porém, quando a vampira saltou em direção à humana e estava quase alcançando-a, Maximilian cruzou o seu caminho e apossou-se de sua presa. As mãos masculinas agarram a humana com possessividade, enquanto seus olhos encaravam Jane com ousadia e pirraça, como se, mais uma vez, ele dissesse a ela que era "o melhor".
— O que está fazendo? Ela é minha!
— Não mais – responde rapidamente, afundando os dentes no pescoço da universitária e sentindo o jorro de sangue quente percorrer sua garganta também sedenta.
Jane sente o corpo inteiro estremecer num misto de irritação e fascínio, pois, como sempre, havia um magnetismo na forma com que ele caçava, que sempre atraía o seu olhar. E quando a presa de Maximilian começou a perder os sentidos, obrigando-o a apertá-la contra o seu corpo para que não caísse, a vampira sentiu um calafrio subir por sua espinha, achando tudo aquilo bastante sensual.
Sacudindo levemente a cabeça, ela se desprendeu daquela visão e virou-se de costas, procurando uma vítima para si antes que elas se esgotassem. Porém, quando seus olhos pousaram sobre um adolescente de óculos grandes, Alec se adiantou e o atacou, tendo-o como a segunda presa da noite.
Uma aflição estranha se apoderou de seu corpo com o fato, aumentando consideravelmente ao olhar para o salão e perceber que não havia sobrado mais ninguém para si. Ela poderia facilmente expulsar Alec e reclamar o garoto como seu, porque, apesar dele ser alguns minutos mais velho, ela era a líder e o irmão nunca a desobedecia. Contudo, a vampira sabia que ele voltara de viagem com muita sede e ninguém, além dele, a faria ceder.
Jane Volturi nunca ficara sem uma vítima em toda a sua história dentro do clã. E quando ela se deu conta do que lhe acontecera, a confusão novamente recaiu sobre o seu semblante. Seus olhos cruzam com os de Maximilian inconscientemente, fazendo-o perceber no mesmo instante o que lhe acontecera, e afugentando a vampira, que correu da sala dos três tronos antes que mais alguém pudesse ver o seu rosto limpo e o fracasso em seu olhar.
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Coração Gelado
FanficFria, cruel e calculista, era assim que Jane Volturi sempre fora conhecida. Por onde passava sua fama a precedia, os vampiros a temiam, sua presença imponente inspirava medo e seus olhos emanavam a morte. Reconhecida por seu mestre como um símbolo d...