Agora Estamos Quites

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Enquanto caminhava de volta para sua casa, Maximilian se perguntou dezenas de vezes se tinha mesmo visto o que viu. Ao olhar para os olhos de Jane naquele momento, ele não encontrou a mesma confusão que sempre enxergara no castelo, causada pelo cheiro humano contido em sua camuflagem. Ali, sem qualquer influência de seu dom, ele viu algo muito parecido com "reconhecimento", mas não tinha certeza se aquilo era real ou apenas uma alucinação causada por sua sede, que já arranhava a sua garganta e mexia com seus instintos de caça.

— Alec nunca me contou como se transformaram – diz ele quando chegaram à porta dos fundos e entraram na cozinha, tentando ser casual enquanto massageava o braço recém-curado somente para ter certeza de que estava bem.

— Ele não tem permissão para contar! – explica simplista, caminhando em direção à sala e sendo seguida pelo camaleão.

— E quem o proibiu? – questiona, mesmo que já soubesse da resposta. Jane se vira em sua direção, olhando rapidamente para a poltrona e dando três passos para a esquerda a fim de ajustar o seu ângulo com o móvel.

— Eu – responde finalmente, empurrando o peito de Maximilian com um movimento rápido e o fazendo cair desengonçadamente sobre o assento.

— O que está fazendo? – retruca com uma carranca, achando aquele comportamento bastante anormal.

— Você está com sede, gastou tudo o que tinha com a regeneração. Já pensei em tudo! Escolha quem quiser e eu trarei até você – propõe Jane de repente.

— Que bobagem, eu posso muito bem caçar sozinho – rebate, sentindo-se um tanto ofendido.

— Sei que pode, mas está sedento demais para caçar em um local com tantas pessoas. Quando seus instintos tomarem conta, não conseguirá ser discreto.

Maximilian estreita os olhos. Onde ele tinha ouvido aquelas palavras antes?

Jane levanta as sobrancelhas como se sugerisse alguma coisa e então um fragmento da festa de Notte Rossa lhe vem à mente. Aquelas tinham sido as suas palavras quando a vampira não estava em condições de caçar pela cidade, e agora ela as estava repetindo porque ele estava numa situação parecida.

— Escolha quem quiser – responde com um sorriso torto, participando do seu joguete e fazendo-a esboçar um sorriso igual. Tal feito o impressionou.

— Não saia daqui! – comanda Jane por fim, saindo pela porta da frente em direção à cidade, aproveitando-se da escuridão da noite para se esconder.

O camaleão se ajeita em sua poltrona, aguardando e tentando esmiuçar o que estava acontecendo. Jane estava diferente. Seu comportamento estava mais solto e ela até mesmo sorrira para ele, coisa que nunca havia feito enquanto estavam no castelo. Ele não sabia quando aquilo tinha começado, fora algo tão gradual e sutil, que ele não tinha percebido a mudança até aquele momento. Se não fosse pela emboscada e os eventos que o sucederam, talvez ele demorasse ainda mais tempo para reparar.

O que ele tinha visto em seu olhar, afinal? Será que ela o reconhecia? Tinha se lembrado dele? Não, aquilo era impossível, a pouco tempo Jane dissera com todas as letras que não havia se lembrado de nada.

— Talvez ela apenas esteja me aceitado como um companheiro de clã, tratando-me da mesma forma que seu irmão – pensa ele, passando os dedos pela barba rala enquanto ainda tentava compreender o que estava se passando ali. A resposta não era clara, mas algo certamente tinha mudado em sua forma de vê-lo e tratá-lo, porque a vampira estava fora de seu bloqueio desde a luta e não o tinha machucado como tantas vezes ameaçou fazer.

Pensando mais nisso, Maximilian se deu conta de que devia a Jane tanto quanto ela devia a ele. Ele a ajudou com sua sede e ela estava pagando esta dívida agora. Ela o salvou daquela estranha emboscada e agora ele sentia que também deveria quitar sua pendência...

Coração GeladoOnde histórias criam vida. Descubra agora