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- O que foi, Jason?
Enquanto dançava com Kazriel, viu Jason de relance, tenso e bravo, seu momento de paz e felicidade acabara naquele instante. Enquanto dançava, a sensação de estar flutuando entre abismos a acalmava, algo nele a deixava sem ar.
Talvez fosse o modo como ele parecia ser feito de escuridão e noite, ou como seus olhos que pareciam sangue fresco, ou como sua voz aveludada e forte lhe causasse arrepios, não sabia ao certo, mas algo nele, a tirava daquela existência dura.
- O que foi?
Ele rio com escárnio, se virando para ela pela primeira vez desde que havia começado a persegui-lo pelo corredor. Ele passou a mão pelos cabelos desgrenhados.- Você estava naquele inferno de baile, Guinevere.
- E o que isso tem haver com seu chilique?
Ela cruzou os braços no peito.- Tem haver, que você se esqueceu completamente do que estamos fazendo aqui. Você estava dançando e rindo como se todo o resto do mundo pudesse esperar pela sua boa vontade de ajuda-los. Você estava lá, feito uma maldita princesa enfeitada, aproveitando a bosta da celebração feita pelo nosso inimigo. Vere, você teve um encontro com o Ethan e nem sequer conseguiu reunir alguma informação relevante, a menos que beija-lo vá salvar Azarofh.
Ela não fez nada, a não ser encara-lo. Sua boca a tempos não passava de uma linha fina e dura.
- Você disse que faríamos isso juntos, mas eu tenho planejado o melhor jeito de nos infiltrar nesse lugar, de descobrir os planos desse homem, e você nem sequer vai lá ver como está o progresso. Você disse para eu confiar em você, disse ter um plano, ter aliados, mas quem são eles, talvez nunca tenham sequer saído do seu pensamento. Quem sabe se os seus exércitos, seus súditos, suas frotas, seus aliados, realmente existam.
Ele riu, gargalhou na sua cara. A raiva só aumentava, a cada som, a cada respiração, e a cada segundo. Fogo, quente, vivo e doloroso, parecia a corromper.
- Aliás, quem viria nos ajudar? Você é uma assassina, matou por dinheiro, quem seriam seus amigos? Quem viria nos ajudar, quando a princesa que jura poder trazer paz, destruiu famílias por moedas? Eu fui um tolo em acreditar que isso daria certo, em acreditar que nos pudéssemos dar um jeito nisso, nessa guerra.
Ele passava a mão descontroladamente pelos cabelos. Ela havia errado com ele, assim como errou com todos, mas não conseguia simplesmente abaixar a cabeça.
- Eu não disse que era uma pessoa confiável, Jason. Você pode me julgar o quanto quiser, mas eu não serei como você. Você pode ter esquecido quando se tornou um bêbado qualquer que vomitava a cada esquina e ninguém veio ajudar você, seus amigos não vieram, sua família não veio. Quem foi retirar você daquele beco asqueroso, Jason? Quem ficou ao seu lado quando Natalie se foi? Jogue as coisas que quiser na minha cara, se você julga ser certo, então faça, não vou levantar a mão para você. Mas não se esqueça de quem permaneceu ao seu lado, quando todos viraram as costas.
Ele recuou um passo, ela havia jogado baixo, sabia disso, mas não conseguia se arrepender, nao sentia o remorso que devia estar sentindo. Só conseguia sentir o vazio, que a acompanhava.
Virou-se sem dizer mais nada e o deixou naquele corredor, não virou para olha-lo, não deixou as lágrimas descerem, ignorou a queimação nos olhos. Andou sem rumo até que parou em uma sala isolada e aberta, o luar tornava o chão um show de luzes verdes, azuis e prateadas.
Andando por todos os pontos onde a luz da lua criava um caminho brilhante, se sentou encostada em uma das pilastras. Não percebeu quando começou a cantar a música que a tempos não se permitia lembrar, a melodia fluía como água por sua boca, as palavras em karzits, aqueciam seu peito.
No funeral da mãe havia cantado para si, encontrando conforto na língua antiga, e na história que contava o trajeto que a alma teria até o encontro com os deuses.
O vazio instalado em sua alma a lembrava dia após dia que não fora suficiente, que não passava de uma estúpida sonhadora.
Por um momento enquanto cantava deixou com que a parede de diamantes e chamas se abaixasse. Lágrimas caíram, quando o choro se aprofundou, seus ombros balançaram com a intensidade, a dor, o vazio e a raiva haviam a consumido.
Mas, algo ali a lembrou que se fraqueja-se, que se deixasse as paredes brilhantes abaixadas, poderia se quebrar para sempre.
Engolindo o choro, ela levantou a cabeça, olhando para os seres celestes que sempre a ouviram, ergueu uma mão, vendo a luz tocar sua pele, lembrou-se que a escuridão não havia se apossado dela, lembrou-se que sempre haveria luz, mesmo que um feixo. Ela não sucumbiria as trevas que lhe sussurravam na calada da noite, enquanto as estrelas brilhassem, ela lutaria.
- Obrigada por ouvir.
Sussurou, inspirando profundamente, quando se virou sentindo um arrepio. As palavras lhe faltaram quando se arrependeu de estar de pé, a sua frente e ao seu redor, noite ondulava. As estrelas brilhavam mais intensamente naquela noite em fumaça, milhares de pontos de todas as cores flutuavam, constelações estavam ao alcance de sua mão.
Um mesclado de felicidade, segurança, afeto, desejo e compreensão era misturado em meio a fumaça de galáxia que a rodeava, não quis saber da onde aquilo surgira, qual a intensão, só sorriu para qualquer que seja o ser, ou a força que direcionara aquela pequeno pedaço de céu para ela.
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Trono De Fogo - Fragmentos De Chamas E Agua
FantasiaA imortalidade pode ser bela, mas quando se cresce em meio à guerra e presencia mais destruição do que vida, ela se torna um fardo muito grande para se carregar, assim, a priny de Hylos Guinevere viveu durante boa parte da sua vida, vendo os que ama...