XVII - Guinevere

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- Antes de provocar alguém, certifique-se que o mesmo não lhe causará dano.
Ela disse se levantando, e batendo a sujeira que se instalou em sua roupa. Os dedos formigavam com o fogo que saiu, assim como o local onde ele havia depositado o beijo, porém por motivos diferentes.

Seu oponente não se levantou, apenas se inclinou se apoiando nos braços e a olhou, seus olhos eram penetrantes e pareciam ser capazes de ver sua alma, enquanto a analisava.

- Você, minha querida Vere, é fascinante. Descobrir sobre você será um grande desafio.

- Você ainda nem viu nada.
Ela embainhou a espada, jogando a trança para trás, ela se endireitou, e estendeu uma mão para Kaz, que arregalou leve e brevemente os olhos. Ele aceitou a mão estendida, já de pé eles estavam muito próximos, isso, aquele formigamento em seu interior aumentou, como se pequenas gotas de lava tentassem pular para fora de seu corpo.

Ela recuou um passo.

- Foi uma boa luta.
Ela disse por fim, sorrindo de canto.

- Não esperaria menos de uma mulher dos desertos vermelhos.

- O que diabos você acha que sabe sobre isso?
Seu olhar semicerrado era fuzilante e hostil assim como a voz mortalmente calma.

- O jeito que você se mexe, a agilidade, a graça. – Ele a circula lentamente – a força, o modo como consegue prever os movimentos pelos mínimos detalhes, tudo. Já havia visto assassinos dos desertos, mas foi difícil perceber isso em você, por estar tão contida. – Ele parou a sua frente franzindo a testa – O que eu não entendo é como, como isso é possível?

- Isso o que?
Sua voz não passava de um fio entre seus dentes cerrados.

- Quando se é um assassino dos desertos não pode sair, pelo que eu saiba, então como está aqui, e... viva?

- Eu sou mais valiosa para eles, viva. Chame do que quiser, sorte ou acaso, mas isso, o fato deles não saberem essas coisas sobre mim é o que me da vantagem.

- Vantagem no que exatamente, querida Vere?

- Na vida. Os inteligentes são o topo da cadeia alimentar, meu caro. – suspirando ela endireitou os ombros e disse-lhe – Meu tempo, acabou.

- Na próxima vez que nos encontrarmos, cobrarei as respostas que me deve.

- Só se estiver disposto a dar as suas a mim.
Ela sorriu antes de vira-se de costas e sair. Encostado na porta, com os braços cruzados estava o guerreiro de antes, o cabelo preso para trás em um rabo de cavalo, ele sorria, como se tomasse sua vitória como dele, ela apenas passou pelo guerreiro, sem proferir uma palavra.

Seus passos se tornavam pesados a medida que ia até seu quarto, o cansaço que se instalava em seus ossos, corroía a vida e drenava sua energia, como um lobo faminto devorava seu espírito. O esgotamento físico era um mero grão de poeira comparado a seu desgaste emocional, o vazio que ela tentava preencher a enchia como uma banheira que transborda.

Não podia falar disso, ela deveria ser forte, deveria jamais se curvar, não podia ter imperfeições. Mas isso, ela, era cheia de imperfeições, era somente cacos juntos, remendados com o desejo de ser melhor, de ser alguém que seria lembrada, de alguém que pudesse ser amada, mesmo que isso só ocorresse se sua alma fosse para o além mundo.

Trono De Fogo - Fragmentos De Chamas E AguaOnde histórias criam vida. Descubra agora