Acordar numa casa repleta de melhores amigos no meio dos seus vinte anos, com o verão no pico e o mar do outro lado da janela é uma das melhores sensações possíveis. E é fácil. Sempre vai haver alguém fazendo bagunça às seis da manhã.
Aqui, é Gustavo.
Tenho a impressão de que ele pode ir dormir às quatro da manhã, mas às seis sempre está de pé, injetando uma dose de animação em qualquer pessoa que cruze seu caminho. Ou que não cruze, também. Ele vai até lá e força interação. Se estivéssemos no carnaval, ele arrastaria um bloco para acordar todo mundo da casa com batidas de panelas.
Estou de pé antes mesmo que a barulheira chegue na porta do meu quarto, mas ao abrir a porta me deparo com Clara, prestes a bater.
— Ai — desvio, quando vejo sua mão erguida em punho.
Ela ri e me deseja bom dia.
— Bom dia — digo, dentro de um bocejo. — De onde Gustavo tira tanta energia, me diz?
Ela apenas dá de ombros, já tendo sido interrogada sobre isso várias vezes. Clara vira-se para mim, parecendo lembrar só agora do que veio fazer.
— Você não vai fazer a trilha? Achei que já estaria pronta.
— Ahh — levo a mão à testa, de olhos fechados. Relaxo o peso do corpo na parede ao lado da porta semiaberta do quarto. — Eu esqueci — falo baixo, e olho para dentro do cômodo. Clara fecha a porta para mim. — Eu esqueci. Achei que era invenção de Marcus.
— E é, mas todo mundo decidiu ir. Nem é uma trilha de verdade, — ela me diz — só vamos andar por aí e conhecer mais o lugar.
— Legal, mas... esqueci de falar com Caio.
— Percebi.
Clara me olha, e eu juro que ela é a pessoa que mais me deixa desconfortável ao me encarar, pois parece desvendar qualquer mistério que eu tente esconder.
— O que foi agora, Liz?
— Não foi nada — abro a porta, desviando de seu olhar. — Em quinze minutos eu estarei lá fora. Ou melhor, nós estaremos lá fora.
Não ouço nenhum pio da minha amiga, e escolho não olhar para ela enquanto entro no quarto, pronta para acordar Caio — que foi totalmente alheio à bagunça de Guga — como se tivesse sido noticiada sobre a trilha agora mesmo.
§§§§§
Caio reagiu com entusiasmo à oferta de uma manhã dentro do mato, sem sequer uma noção básica do lugar, ou de como agir em "trilhas", ou de preparo físico — ele parece ter algum, mas eu, com minha vida corrida e o ânimo total de 5% ao final do dia, não piso numa academia há mais de um ano (mais de dois, se for totalmente sincera). Mas preciso confessar que me sinto animada ao ver todo mundo feliz e saltitante.
Clara estava passando protetor solar no rosto de Lavínia e quando John pediu que ela fizesse o mesmo com ele, criou-se uma convenção na sala. Entre colchão inflável, mochilas lotadas, pacotes de salgadinhos abertos e garrafas d'água, nos colocamos lado a lado enquanto Clara gentilmente pintou nossos rostos com protetor solar, e cantou uma musiquinha infantil para nos "ensinar" a espalhar o produto da forma correta. A música era só para Lavínia, mas todo mundo cantou, e a garota deu altas gargalhadas com o coro de adultos bobos lhe acompanhando.
Mimi assistiu a um vídeo sobre como se vestir para trilhas, e nós fizemos o máximo possível. Os sanduíches que sobraram do dia anterior estão na minha mochila, algumas garrafas de água estão cheias de bebida alcóolica, não consigo achar meus fones de ouvido, mas não me preocupo—acabo deixando de lado.
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Liz e a Lista do Nunca
Teen FictionTrês amigas, três listas e várias promessas quebradas. Assim começa a história de Liz, Mimi e Clarice, três amigas de infância que, numa noite de "festa do pijama" decidiram criar uma lista apontando coisas que NUNCA farão. Em suas cabeças de pré-a...