Capítulo 33

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Minha franja está aparada, reta e preenchida. O tom do meu cabelo está o mais próximo do natural possível, e as pontas duplas foram embora. Estou me sentindo como num comercial de tintura, feliz, caminhando pelas ruas me imaginando numa passarela da São Paulo Fashion Week, só que toda atenção vai para o meu cabelo.

As pessoas subestimam o poder dos cabelos em afetar nossa autoestima. Se eu soubesse disso meses atrás, jamais teria comprado descolorante e usado até o cabelo parecer platinado.

Com minha autoconfiança renovada, atravesso o jardim da casa de Clara com o olhar brilhando, esperando os comentários. Balanço os cabelos e os jogo para frente, as pontas atravessando só um pouquinho dos ombros. Minhas expectativas descem para abaixo de zero quando não vejo ninguém na sala, e da cozinha ouço vozes alteradas.

— Gustavo, a gente não tem nada! Na-da! — Está dizendo Mimi, gesticulando exageradamente quando chego. Me mantenho calada, apenas observando do canto, encostada no arco da passagem.

— Eu não disse que a gente era casado nem nada, Miranda. Me desculpa se pensei que você esperaria pelo menos dez minutos antes de falar com seus contatinhos na cidade.

— Você não sabe o que tá falando — ela fala baixo, esfregando os dedos na testa. — Sei lá. E... — suspira, então olha para cima — a gente não tem nada, Gustavo. Eu não vou deixar de falar com meus amigos.

— Michel não é seu amigo.

— Ele é! — Ela levanta as mãos para o alto. — E você também é.

Gustavo engole em seco.

— Foi mal, então, Mimi.

— Você queria o quê, Guga? Eu nunca disse que ia levar isso pra lugar algum...

A voz deles não está mais elevada, e mesmo assim eles não percebem minha presença.

— Eu gosto de você, mas não tô no momento de ter nada sério com ninguém, Guga. Nem você — ela completa.

Gustavo apenas assente, de braços cruzados, ainda de costas para mim. Não vejo sua expressão, mas não parece estar sorrindo, ou próximo disso.

— Você sabe que meu foco está no meu trabalho e no futuro... não quero desviar minha atenção, como sempre faço quando me apaixono. E tem...

Ele não deixa ela terminar. Pergunta:

— E você 'tá apaixonada?

— Não sei. Nem quero descobrir.

Ele assente novamente. Dou um passo para trás, a fim de sair da cena sem chamar atenção e deixar que os dois se resolverem sozinhos. Mas, infelizmente, tropeço num banquinho de madeira logo atrás de mim e depois piso num patinho de borracha certamente de Lavínia, espalhado pelo chão, e o barulho agudo do bicho (claro) chama atenção de todo mundo. Ainda mais porque eu perco o equilíbrio e caio para trás, apoiando as mãos no chão e livrando minha bunda de danos maiores (e todo o corpo também).

Congelo um sorrisinho no rosto e finjo que acabei de chegar.

— Oi, Guga... Mimi, você tá aí. Ra-ra-rá! — aceno para ela. — E aí?

— Liz, o que foi... isso? — Gustavo estende a mão para me ajudar a levantar, e Miranda solta um gritinho, tão agudo quanto o apito do pato.

— Seu cabelo!

Toco na franja rapidamente. Tinha quase esquecido da mudança, tão imersa estava na conversa dos dois. Eu sei, não foi meu momento mais orgulhoso, mas... fiquei ali paralisada, simplesmente.

Liz e a Lista do NuncaOnde histórias criam vida. Descubra agora