— Vai ficar tudo bem? — pergunta Caio, apertando a ponta do meu dedo. Como a mão está machucada, ele tem o cuidado de não tocá-la.
Depois do primeiro beijo, trocamos vários outros, e ainda arriscamos mais um passeio de bicicleta—dessa vez prestando 100% atenção em pedestres desatentos no meio da ciclovia. Eu não sabia, mas o meu tombo foi parte apenas do começo da noite.
— Da próxima vez, a gente leva todos os equipamentos de segurança — brinca, e eu lhe dou um empurrãozinho sem força, antes de nos despedirmos.
Atravesso o jardim da casa de Clara com um meio sorriso no rosto, de cabeça baixa, e ouço mensagens chegando no celular antes de abrir a porta. É... Caio.
"Eu ouvi um estrondo. Você caiu de novo?"
Olho para trás mas ele não está mais no meu campo de visão, e eu solto uma risada pelo nariz antes de responder "talvez".
A porta se abre antes que eu me vire de volta, e ao girar o corpo nos calcanhares, dou de cara com Marcus. Ele parece estar sempre prestes a abrir a porta para quem chega.
— Ah — diz, surpreso — pensei ter ouvido alguma coisa aqui.
— Oi. É... cheguei agora. Foi mal, não queria assustar.
— Tudo bem, foi só um reboliço. Se fosse um barulho maior eu teria trazido uma faca.
— O quê?
Ele me olha por cinco segundos, com a expressão indecifrável, nós dois sem sabermos o que dizer ou para onde ir, e balança a cabeça.
— Nada — desconversa. — Eu estava brincando. Entra.
Eu faço, e sinto o calor abafado dentro da sala. É como se a noite tivesse virado, o clima mudou totalmente. Não há mais vestígios da noite de um encontro com Caio.
— Vou subir... — digo, não sabendo realmente por que estou dando explicações para Marcus. — Boa noite.
— Está cedo ainda — ele diz. — Vai passar aquele filme que você adora, daqui a pouco na tevê.
— Que filme?
— Com a Britney Spears.
Eu sorrio, já com um pé no primeiro degrau da escada.
— Crossroads — lembro. O filme que deu a ideia para a lista; eu não podia esquecer.
— Isso. Desce pra ver, depois... eu nunca vi.
— Você vai me zoar o filme inteiro.
— Não vou...
Estreito o olhar para ele.
— Eu juro — insiste Marc.
— Vou pensar. Clara tá em casa? — desvio o assunto.
— Sim, tá aí em cima, eu acho. John saiu com Lavínia, e Mimi foi na casa dos pais.
— Certo. Até daqui a pouco... eu acho — digo, e começo a subir os degraus segurando firme o corrimão, sem olhar para trás.
Idealmente eu estaria indo falar com Mimi sobre meu encontro com Caio, pois ela me incentivou a seguir em frente, mas como ela não está aqui, Clara fará esse papel. Embora ela vá falar de Marcus ou insinuar algo sobre Marcus em algum ponto, eu simplesmente quero colocar para fora o que estou sentindo depois dessa noite, e até mesmo organizar esses tais sentimentos.
Abro a porta do quarto de Clara sem bater—um erro sempre, e eu lembro como odeio quando fazem isso comigo só quando já estou dentro. Clara está sentada na cama, as pernas cruzadas e uma almofada no colo. A tevê está ligada, mas o volume está mudo. Ela vira-se para trás e não me olha quando entro.
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Liz e a Lista do Nunca
Fiksi RemajaTrês amigas, três listas e várias promessas quebradas. Assim começa a história de Liz, Mimi e Clarice, três amigas de infância que, numa noite de "festa do pijama" decidiram criar uma lista apontando coisas que NUNCA farão. Em suas cabeças de pré-a...