Capítulo 12

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À tarde percorro a Broadway, procurando o estúdio de tatua­gem dela. Quando eu o encontro, estaciono na primeira vaga disponível. Estou ansioso para falar com ela. Entro na loja. O ambiente é muito limpo. Paredes forradas com desenhos um tanto assustadores. Um som de rock instrumental é a trilha sonora de fundo, bem baixa, sem incomodar. Aproximo-me do pequeno balcão. Um homem forte tatuado nos braços e com alargador nas orelhas me atende. Apesar da aparência rude, sua expressão é amigável.

-Boa tarde. Em que posso ajudar?-ele me pergunta.

-Eh... Eu gostaria de falar com a Heidi. Ela está?

-No momento ela está ocupada.

-Eu posso espera-la então.

Aguardo por meia hora folheando revistas sem muito inte­resse. Clientes chegam. Clientes saem. Finalmente ela apa­rece.

-Senhor Whitman. - ela se aproxima.

-Heidi. - me levanto

-O que o senhor quer aqui?

-Preciso falar com você. Podemos ir a outro lugar?

-Já estou indo para casa. Podemos conversar lá.

-Perfeito! Eu posso te levar- me entusiasmo.

-Tá. Mas antes preciso passar no mercado.

-Tudo bem.

***

Ela apanha alguns pacotes de biscoitos na prateleira. Mas a maior parte da compra são bebidas alcoólicas.

-Acho que é o suficiente- ela conta a quantidade de bebidas que está levando.

- Vai dar uma festa?

-Não. São para mim mesmo. Preciso reabastecer minha geladeira.

Chegamos à casa dela. Ela leva as bebidas para a geladeira. Pega duas garrafas de cerveja que já estavam lá e me oferece uma.

-E então. Sobre o quê o senhor quer falar?-ela encostada à pia

-É sobre aquela última noite em que estivemos juntos. Não queria que fosse daquela maneira. Me desculpe.

-Tudo bem. - ela me responde antes de levar a garrafa à boca.

-Tudo bem?- Fico surpreso

-Uhum.- ela responde terminando de beber a cerveja.

-Você não ficou chateada? Decepcionada?

-Na hora sim. Mas já passou. Não fiquei chateada de verdade.

-Então esse tempo todo você não...

-Não. Não. Acho que foi mais uma frustração momentânea.

Ela vai para a sala e eu a sigo.

-Fiquei aliviado. Cheguei a pensar que não nos veríamos mais.

-E isso seria ruim?

-Claro que sim. Seria péssimo. –eu suspiro -Sabe, na mesma noite eu tive um sonho com você.

-Eu sei. - olho fixamente para ela, pego de surpresa pela sua res­posta. Como assim ela sabe?

-Você sabe?

-É brincadeira senhor Whitman! O senhor leva tudo sempre tão a sério! Mas e o sonho? Foi bom?

-Na verdade foi assustador.

-Quer me contar?

-Foi um pouco confuso. Acho que você não entenderia.

-Tudo bem. De qualquer forma é bom saber que estou nos seus sonhos. - ela sorri de um jeito provocador, como se realmente soubesse com o que eu sonhei.

-Bem, acho que devo ir. – preparo para me levantar

-Não! Fique senhor Whitman

-Tem certeza? De repente seu namorado aparece e pode pen­sar que nós...

-Não. Ele não vem hoje. Está enrolado com os negócios do pai dele.

Me acomodo novamente na poltrona.

-Vocês não tem se visto muito ultimamente, não é?

-É. Tem sido um pouco difícil, já que o pai está integrando ele aos negócios.

-Tem sentido a falta dele?

-É. Sim.

-Como vocês se conheceram?

-Internet.

-Você deve gostar muito dele não é?

-É... Sim... Gosto- ela não demonstra firmeza na resposta.

-O que seus pais acham de vocês juntos?

-Minha mãe não sabe muito sobre ele. Mas quer conhecê-lo. Insiste que eu o leve quando eu for visitá-la.

-E o seu pai? O que ele acha?

-Meu pai nem liga. - é visível a decepção em seu rosto- ele não liga para nada- ele vira a garrafa.

-Por que você diz isso?

-Eu não estou exagerando. Ele nunca se preocupou comigo. Nem com a minha mãe. O trabalho sempre foi a prioridade e nós ficamos em segundo plano.

-Você pode não estar sendo justa. Talvez ele tenha se sacrifi­cado pelo bem-estar vocês.

-É isso o que ele diz. Queria poder acreditar. Mas não foi as­sim. Ele nem percebeu que eu tinha crescido. Até pouco tempo atrás ele ainda achava que eu era uma menininha. E quer saber mais? Desde que eu vim para a América, ele nunca me ligou.

-Então você acha que seu pai não te ama?

-Acho que ele é um egoísta. Só se importa com os seus interes­ses. Quem ama se importa com outro. Quer saber se está bem. Não estou falando de dinheiro, mas sim de se interes­sar por mim. Saber com quem me relaciono.

Ouvindo-a falar me questiono se Cat pensa o mesmo de mim. Será que Lorraine também pensava assim? Meu Deus, o que foi que eu fiz? O melhor, o que foi que eu não fiz?

Ela se levanta encerrando o assunto:

-Vamos misturar as bebidas. - ela diz, empolgada indo para a cozinha.

Coloca frutas sobre o balcão e pega todas as bebidas que têm guardadas e vai fazendo algumas misturas no liquidificador. Como limão ao leite com vodca, cereja ao leite com vodca en­tre outras misturas e bate.

Ao vê-la misturar leite condensado com vinho questiono:

-O que é isso? O que você vai fazer?

-Você vai ver.

A EstrangeiraOnde histórias criam vida. Descubra agora