CAPÍTULO 41

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“Meu amor é um passo de fé no abismo em teu olhar.”

As semanas seguintes passaram voando. Eu me dividia mais com minha filha do que antes. Talvez por sentir no meu íntimo que algo em minha vida tinha realmente mudado depois que eu e Eduarda nos separamos. Havia uma necessidade quase vital de preencher todo tempo que eu tinha disponível com Nicole. Muitas vezes deixava o trabalho pendente pro dia seguinte só pra chegar mais cedo em casa e levá-la ao parque. Tomávamos sorvete e por vezes íamos à praia, só nós duas e passávamos tardes inteiras olhando o pôr do sol. Não podia me sentir infeliz porque Nicole me preenchia a alma quase que completamente, mas como sempre, nunca estamos satisfeitos com o que temos. Faltava algo no meu mundinho perfeito. E a cada mês que passava eu sentia mais a falta desse algo.

Numa tarde de abril recebi uma ligação de Adelaide. Estranhei, mas decidi atender. Desde a última vez que fui procurar Eduarda em Petrópolis, não havíamos nos falado mais. Ela foi muito direta ao dizer que precisava urgentemente falar comigo e que estava no Rio, em um pequeno hotel no centro. Fui falar com ela nessa mesma tarde.

- Entra, Dona Fernanda...

Entrei no pequeno quarto com cheiro de mofo e fiquei parada no meio do cômodo esperando que ela falasse.

- Muito bem, estou aqui. Do que se trata Adelaide?
- Descurpa não falá por telefone. É que o assunto é sério.
- Entendo.
- Senta.
- Estou bem de pé. Não posso me demorar.

Ela assentiu com a cabeça e mesmo estranhando meu jeito formal de tratá-la, continuou.

- É sobre minha menina, dona Fernanda, ela...
- Adelaide. Antes de você continuar eu quero deixar bem claro que eu não tenho mais nada a ver com o que acontece com Eduarda. Independente do que for. Você sabe muito bem que não estamos mais juntas e que cada uma está cuidando de sua própria vida.
- Sei, sim sinhôra. Mas, é que ela ficou assim, apática, de uns tempos pra cá, sabe!? Desde que vocês duas terminaram.
- Olha, sinceramente!? Não me importa isso. Cada um que aprenda lidar com sua dor.
- Ela tá se drogando de novo, Dona Fernanda.

Tentei fingir que aquilo não me comoveu, mas falhei miseravelmente.

- Desculpe, mas ainda não entendi porque me chamou aqui. Não vejo no que eu posso te ajudar.
- Fala com ela, dona Fernanda. Ela sempre ouviu a senhora.
- Ouvia. Ela não quer me ver nem pintada de ouro na sua frente.
- Isso é só da boca pra fora. A senhora sabe que ela ainda sente o mesmo que antes e que tá magoada, só isso. Vai passar.
- Não me interessa mais, Adelaide. Fiz o que tinha de ser feito por ela. A minha responsabilidade com ela acabou. Deixe-a andar com suas próprias pernas agora. Ela é forte. Se cair, se levanta.
- Ela tava se levantando de novo até a sinhôra dar uma rasteira nela.
- Peraí, você está me culpando pelos atos da Eduarda?
- Indiretamente, sim!
- Está errada! Ela é adulta e sabe muito bem o que faz.
- Não sabe não e nesse momento precisa demais da sinhôra.
- Essa conversa não tem sentido!
- Eu sei que ainda resta alguma coisa aí nesse coração. – Se aproximou e espalmou a mão em meu peito. - Não é possíver que aquilo tudo acabô assim, sem mais nem menos. Dá uma chance pra ela...

Ela me estendeu um papel com o endereço de um hospital.

- O que é isso?
- É onde ela tá estagiando. Num sei se é assim que fala. Ela tem acesso a todo tipo de remédio perigoso lá. Olha...

Retirou de uma sacola umas caixas de tarja preta e algumas ampolas com líquido incolor. Eu examinei o conteúdo e reconheci alguns antidepressivos e estimulantes para ficar acordado.

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