Capítulo 50

8.4K 912 880
                                    

T h o m á z

As duas palavras que martelavam na minha cabeça como um eco eram ''sinto muito''.

Sinto muito.

Ela ecoava, mas eu nem mesmo sabia como eu poderia ter tido forças ou como fui parar ali. Foi tudo muito rápido. Em um momento eu estava abraçado em Giennah, vivendo um sonho, e então, estava com ela desacordada nos meus braços, e depois em uma sala em que eu só via branco. Sinto muito. Ela estava aqui, agora não está mais. Era mentira. Isso não poderia estar acontecendo. Tínhamos começado novamente, estávamos mais fortes e felizes do que nunca. Finalmente estávamos tendo o nosso final feliz, o nosso recomeço. Eu gritava por dentro, mas não tinha certeza se saía algum som. Mas eu sentia que berrava, tanto que minha garganta ardia, arranhava, seca. Eu tinha perdido tudo. Ela era, ela é, tudo. Ninguém olhava para mim, rostos sem forma passavam entre paredes brancas, e ninguém via o meu desespero, que eu estava despedaçando. Ninguém se importava. Será que eles não sabiam o que é sentir que arrancaram sua pele e você sentia cada centímetro sendo puxado? O vazio que tinha sido aberto à força dentro do seu peito? Eu continuava gritando, minha garganta não suportava tanta força, mas eu gritava.

Eu morria aos poucos. Não sentia nada, até sentir algo. Uma pressão no rosto, nos braços, no peito. Gritos que não eram mais os meus. Ou eram? A música que tocava antes tinha sido substituída por outra. Uma melodia tão triste quanto a anterior. Só poderia ser uma encenação, algo programado para aumentar mais ainda o vazio dentro de mim. A pressão não sumiu, passando por todo o meu corpo, e eu não conseguia olhar para baixo e ver o que era. Aquilo estava me matando aos poucos. Eu poderia morrer, se Giennah não vivesse mais. Eu poderia sumir. Sinto muito. Ninguém sente tanto quanto a pessoa que perde uma parte dela. Giennah Jones tinha morrido. Não estava mais aqui. Eu não a veria mais. Nunca mais. Não sorriria mais. Não embarcaria mais nas nossas aventuras. Não andaríamos mais de moto juntos. Não conheceríamos o mundo juntos. Não nos beijaríamos mais. Se perder Giennah significasse não ter mais a melhor parte de mim, a que me mantêm vivo com a luz que eu paguei dela para mim, eu não teria razão para mais nada. Ou era tudo ou era nada.

Além da pressão, agora eu ouvia gritos. Altos, ensurdecedores, que ultrapassavam a música melancólica do fundo. Era o meu nome que era berrado de algum lugar na palidez do lugar. Não tinha mais ninguém, apenas o branco. E então um borrão na minha frente e um tapa forte no rosto. Eu não fazia ideia do que acontecia, apenas que eu estava acabado. Meu corpo estava cansado, pesado, um peso morto. A voz estava mais clara, mais alta, desesperada. Apurei meus ouvidos, sentindo a voz, tentando identificar de onde vinha e de quem vinha. Mais um tapa, e então tudo se tornou claro novamente. Arregalei os olhos e ergui meu corpo de onde quer que eu estivesse. Esperei ver uma sala branca, a mesma que eu via há segundos atrás. Nenhum rosto distorcido, e nem a cadeira dura que eu sentia, mas não via. Foquei minha visão ao meu redor.

Meu quarto. Com a vista para a piscina. E então meu rosto foi virado para a frente. Por duas mãos delicadas. Mãos quentes. Mãos pequenas. Mãos fortes, desesperadas. Olhei para frente. A luz da manhã iluminava a borda da figura, deixando o rosto em uma sombra clara. Meu queixo tremeu, minhas sobrancelhas desceram, e eu senti um grunhido de choro sair da minha garganta seca. Eu sentia suas palmas no meu rosto, mas não sabia se era verdade ou sonho. Ergui os dedos com alguma força que ainda me restava, trêmulos. Eu queria muito acreditar, muito. Apenas alguns centímetros. Então eu toquei. Toquei de verdade. Eu poderia estar sob efeito de algum remédio que tinham me dado. Mas eu sentia, sentia a pele do seu rosto.

O rosto de Giennah. Era ela. Todo aquele vazio revitalizou dentro de mim, como se pudesse ser um fio de esperança, uma última chance de tocar nela de novo. Ou de saber o que era realidade ou não. Eu não pensei em nada quando simplesmente avancei nela, abraçando a sua cintura. Ela estava na beirada da cama, e quando pesei sobre ela, caímos os dois, rolando pelo tapete macio abaixo de nós. Não a soltei. Nem se eu quisesse. Ela estava embaixo de mim, e eu apenas segurei firme, talvez chorando, mas tentando me agarrar ao último fio de esperança que me escapava.

NEIGHBORSOnde histórias criam vida. Descubra agora