Dois Lados de Mim

Blecaute: Reinicialização

A Escuridão 

Tudo se apagou, fazem dias que não existe nada além do breu e do vácuo no espaço que habito, mas também não reclamo, não posso me dar ao luxo de falar um "A", já que tudo isso foi o que procurei desde o início. Sabe o que é? A ESCURIDÃO sem fim. Isso! Eu procurei e achei. Foi um blecaute, eu apaguei e agora não há mais nada, nem se eu pudesse me dar ao prazer e a dignidade de sentir esperança conseguiria, porque não são tempos para isso. O escuro me tomou, e nunca imaginei como seria doloroso sentir a dor sem doer, sentir os olhos abrirem e não ver, me matando mesmo eu já tendo consciência que estou morto. É estranho. 

Sei que se foram dias, até meses, meus pensamentos já estão desconexos, eu tento me manter morto, mas nem a morte me deseja, ou talvez meu castigo não me permita morrer, assim vivo o tormento de cada dia ansiando por algo que eu jamais queria, morrer. 

Passo infinitas contagens de tempo imprecisas pensando na vida que eu tinha, nos momentos que eu passei como meu EU, no momento que passei a viver a vida dele, mas o pior de todos e que hoje eu me arrependo, e da morte que lhe causei, fui covarde por matá-lo de forma tão traiçoeira, tudo porque eu queria viver uma vida a qual eu achava que ele não vivia. Hoje consigo dizer as palavrinhas. 

EU ME ARREPENDO 

Vagueio dizendo isto, não para convencimento, mas para tentar dizer ao meu EU de alguma forma - isto se ele ainda viver comigo - que eu não agi certo, e principalmente que me arrependo. Não sei como ele está, não sei para onde ele foi, não consigo senti-lo, aliás não consigo sentir nada além do ar pesado da escuridão que me ronda e me suga as energias, porém não me importo, passa dia, passa mês, ou passa qualquer quantidade de infinito, tenho orgulho de dizer EU ME ARREPENDO, mesmo sabendo que palavras são indiferentes e que não causam mudanças no que já foi destruído. 

No final, quando canso de repetir meu mantra, deixo meu corpo se afogar no mar negro, no ar pesado, no vácuo sem fim da minha existência, parte dela me faz lembrar o funeral que armei para meu EU, o que me traz conforto, saber que o mesmo cenário da sua morte é o da minha exília existência com direito a todos os aspectos. Tenho o conforto nesse meu destino sem direção, só por saber que meu sofrimento é penitência e um bumerangue das minhas ações.  

A Luz 

"Acorde!"

"Acorde!"

"Acorde!"

Repito três vezes a palavra de sua salvação, e mesmo não o vendo eu sei que a mensagem chegou aos seus ouvidos. 

"Acorde!"

"Acorde!"

"Acorde!"

Repito de novo e sei que meu alter-ego já está ouvindo.